O longo período de isolamento que se fez necessário neste mais de ano de pandemia afeta a saúde mental coletiva. Além dos impactos na saúde mental da população jovem, os idosos também sofrem de forma particular as consequências do longo período de isolamento. Entre os agravantes está o fato de serem o grupo de maior risco, no qual está grande parte das vítimas que morreram pela doença. Isso aumenta a necessidade de isolamento, o que chega a provocar o afastamento de filhos e netos.
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Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Covid-19), em 2020 16,2% da população era composta por pessoas acima de 60 anos. Entre elas, está Antonia Salvani Neves de Freitas. A aposentada está em isolamento rígido desde o começo da pandemia, em 2020. Aos 93 anos, ela lamenta a situação: "Faz um ano que eu estou em casa, de castigo, não posso sair nem pra igreja, nem pro shopping. Durante esse ano, saí duas vezes pra ir ao médico. Fora isso eu não saio nem na calçada", contou dona Salvani que, em uma dessas saídas, tomou a primeira dose do imunizante.
De acordo com Francisco Pontes, médico psiquiatra que atende no ambulatório geriátrico no Hospital de Saúde Mental Professor Frota Pinto, os pacientes têm várias queixas em relação ao isolamento e à pandemia. "O medo da morte, de se contaminar. Existem várias questões relacionadas à morte, confrontar com familiares e conhecidos que se infectaram ou faleceram", explica o médico. De março de 2020 até fevereiro de 2021, o ambulatório Geriátrico do HSM realizou 821 atendimentos.
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A solidão e o medo de pegar a doença é constante no cotidiano de dona Salvani, que convive em casa com dois dos seus seis filhos. "O momento mais difícil da pandemia foi a separação de meus filhos, distantes. Eles não podem vir aqui eu não posso ir na casa deles, não posso ver eles. Falo por telefone, mas não posso encontrá-los. Às vezes choro de saudade", falou com a voz embargada.
Dona Salvani também revela sentimento de impotência em relação à pandemia. Mesmo após a primeira dose do imunizante, ela confessa que teme contrair o vírus e não resistir. "Eu tenho muito medo do vírus, é muito contagioso e perigoso. Estou de pés e mãos atadas, eu tenho muito medo, pois, eu sei que se pegar eu não resisto."
Francisco Pontes diz que, em meio a pandemia, é natural que sintomas de ansiedade surjam, agravados pelas incertezas. "A gente tem de aprender a lidar com as restrições, certos de que existe um motivo real. A vacinação da população é fundamental. Enquanto isso não acontece, precisamos manter uma rotina para fazer com que a solidão do isolamento não seja tão forte", explica.
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Regularmente, dona Salvani realiza chamadas de vídeo com seus outros quatro filhos que moram na Capital. Antes da pandemia, ela costumava frequentar a paróquia de São Raimundo, no bairro Rodolfo Teófilo. Lá também era onde encontrava as amigas. Atualmente, ela mesma tem feito a sua rotina diária de oração, e é o que tem a ajudado a passar o tempo.
Dentre as atividades que podem ser desenvolvidas com idosos para diminuir o impacto do isolamento na saúde mental, o psiquiatra recomenda fazer chamadas de vídeos com os amigos e familiares. "No momento, estamos em restrição. Mas, caso haja um espaço onde o idoso possa praticar algum tipo de atividade física em segurança. Ou atividades que estimulem, como leituras, novelas, artesanato. Horários e hábitos sendo mantidos o mais próximo possível daqueles que já aconteciam antes da pandemia", pontuou o médico.
Quando questionada aonde quer ir depois da pandemia, dona Silvani já tem preparado o seu itinerário: "Eu primeiro queria ir à igreja. Depois da igreja, eu queria ir a um passeio, visitar meus filhos, ir ao shopping, conversar com meus amigos, minhas colegas. Minhas amigas estão todas isoladas também, pois não podemos nos encontrar. Mas eu nem faço planos pra depois da pandemia, o dia de amanhã só Deus sabe."
Episódio 3: Casa e renda
Série de reportagens que marca um ano da pandemia de Covid-19 no Brasil