Repórter especial e cronista do O POVO. Vencedor de mais de 40 prêmios de jornalismo, entre eles Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP), Embratel, Vladimir Herzog e seis prêmios Esso. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações.
Há uma foto nos arquivos do O POVO que é icônica para a política e as cobiças pelo poder disputado desde que a existência é notícia. Aliás, no baú de quase 97 anos do jornal há milhares de imagens (ou a ausência delas) que narram sobre um recorte da bruteza, da boniteza e das contrações da Cidade que parimos ou que nos pariu.
Vou ficar, hoje, com a "ruindade" simbólica de uma fotografia que me veio não por acaso. Daqui a pouco tentarei dizer por que ela chegou para se inscrever na coluna de um domingo decisivo para a vida e a civilidade em Fortaleza.
Sobre a imagem, há algo da manifestação do "perverso", esta necessidade de extinguir o opositor tratado como inimigo. A brutalidade, que se diga, é talvez um movimento de quase todos os corpos em algum momento do existir.
A imagem dá conta do primeiro registro fotográfico, no O POVO, de uma denúncia de violência policial
Pois bem, a fotografia de estúdio tem um lapso de tempo entre o fato consumado e a própria ocorrência factual. Porém, se transfigura em outra importância quando o jornalismo personaliza a bestialidade política.
A imagem dá conta do primeiro registro fotográfico, no O POVO, de uma denúncia de violência policial do Estado. O simbólico é pelo que não está na fotografia ou o que ela revela em subtextos sobre a truculência política e policialesca.
É uma fotografia posada por oito oficiais da "polícia do governador (do Ceará) Moreirinha". Os policiais - três sentados e cinco em pé - foram fotografados um dia depois de espancar o jornalista Demócrito Rocha, na Praça do Boticário Ferreira.
Havia, já naquela década de 20, o envolvimento da polícia do Estado num grupo de extermínio no sertão cearense
Espancaram o periodista, fundador do O POVO, e no dia seguinte foram para um "atelier photographico" e fizeram o retrato. A publicação é do dia 18/9/1928, mas a bordoeira de oito machos armados contra um civil tinha ocorrido em 1º de julho de 1927. Seis meses antes do O POVO ser fundado.
Demócrito ainda era redator do jornal O Ceará, tribuna de onde criticava os "desmandos, a corrupção e o autoritarismo" do governador Moreira da Rocha. Havia, já naquela década de 20, o envolvimento da polícia do Estado num grupo de extermínio no sertão cearense.
Os "heroes de Moreirinha", como foi estampado na primeira página do recém-nascido O POVO, o acuaram na Major Facundo. Quatro o seguraram e três, provavelmente, tiveram o gozo de fazer sangue num jornalista. Fetiche de autoritários, armamentistas e torturadores. Até hoje.
Não há problema em permanecer provinciana, Fortaleza ainda é
Acharam pouco e o levaram preso à delegacia. Mesmo libertado, porque pessoas se aglomeraram em frente à chefatura, a violência não cessou. A truculência policial abarcou quem estava a ouvir o discurso de Demócrito da sacada de um sobrado da mesma Major Facundo de uma Fortaleza paroquial e provinciana.
Não há problema em permanecer provinciana, Fortaleza ainda é. O repudiante, talvez, seja o empobrecimento do fazer política e o cristianismo católico e evangélico de gente falando em Deus, de melhorar a "vida" do eleitor e, ao mesmo tempo, ameaçar de morte violenta um opositor. Feito previsível do vereador bolsonarista inspetor Alberto (PL), parceiro de André Fernandes (PL).
Um policial, político de senso comum e oportunista, que incorpora o abjeto de um propósito insuspeito: o fetiche pela "ameaça de morte". E, talvez, até corriqueiro para se sustentar na performance do macho comezinho desde quando pôs uma arma nos quartos.
Alguns leitores reclamaram da falta do dizer "ameaça de morte" na manchete da matéria. Estava lá
A imagem de 1928 tem paridade simbólica com o vídeo do policial vereador desta semana. Alguns leitores reclamaram da falta do dizer "ameaça de morte" na manchete da matéria. Estava lá, bem claro e repetido pelo próprio ameaçador de Evandro Leitão (PT).
Durante a cobertura política do O POVO sobre as eleições municipais deste ano, as "ameaças e as propostas pela vida" para Fortaleza - simbólicas e factíveis - foram noticiadas, reportadas, debatidas e analisadas exaustivamente por jornalistas, articulistas, especialistas e candidatos.
E são alvissareiros o reconhecimento e a cobrança dos leitores sobre a influência do jornalismo do O POVO, desde 1928, nos rumos políticos e cotidianos de Fortaleza. Entre acertos, erros, dores e gozos.
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