Hugo de Brito Machado Segundo é mestre e doutor em Direito. Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET) e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor da Faculdade de Direito da UFC e do Centro Universitário Christus. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.
Declarações minam a existência das instituições, algo que os presidentes anteriores, pelo menos os da era republicana posterior a 1988, por piores que pareçam ter sido, não fizeram
Algumas realidades existem de forma independente de alguém que as reconheça. É o caso das pedras, de uma lagoa, das estrelas no céu. Mesmo que a humanidade desaparecesse, ou nunca tivesse surgido na Terra, elas estariam lá.
Mas há realidades que dependem de alguém que as conceba enquanto tal. Sem sujeitos que combinem e aceitem a sua existência, elas simplesmente desaparecem. Pense você, leitora, nas regras de um jogo: sem jogadores que as conheçam, reconheçam, e respeitem, é o próprio jogo que perde o sentido.
Entre essa segunda espécie de realidades, que os filósofos chamam “realidades institucionais”, estão o dinheiro, as regras da gramática, e o Direito. É a partir delas que se criam, ou constituem, figuras como o Poder Judiciário e as regras que este aplica; o cargo de Presidente da República e a forma de concorrer a ele; as divisões de um campeonato de futebol e as condições para ser promovido ou rebaixado.
No caso das instituições jurídicas, pode-se dizer que passaram, e ainda passam, ao longo da História, por um lento e contínuo processo de evolução por tentativa e erro. As instituições do presente são fruto de erros e abusos havidos no passado, que se querem com elas evitar, ou minimizar: é o que está por trás de figuras como a separação de poderes, a exigência de lei para tratar certos assuntos, o direito de defesa, a realização de eleições periódicas para certos cargos públicos etc.
É grave, portanto, muito grave, quando uma autoridade desdenha dessas instituições, afirmando que apenas pretende respeitar as decisões com as quais concorde, ou que outro Poder, diverso daquele que chefia, deve seguir suas determinações, sob pena de ser “necessário fazer o que não se quer fazer”.
E, pior: dizer-se que, a menos que se usem votos impressos, algo que o Congresso já rejeitou, não haverá novas eleições, ou que delas o prolator das afirmações só sairá vitorioso, preso ou morto. Pior do que o criminoso que viola uma lei, mas se conforma e submete à aplicação das punições cabíveis quando é apanhado, neste caso é a própria existência da lei que é colocada em xeque.
Tais declarações, portanto, minam a existência das instituições, algo que os presidentes anteriores, pelo menos os da era republicana posterior a 1988, por piores que pareçam ter sido, não fizeram.
Trata-se algo equivalente à criança que, quando percebe que está em desvantagem em determinada brincadeira ou jogo, recolhe suas peças e diz que não vai mais brincar, ou que só aceita continuar se as regras forem alteradas para que ela sempre saia vitoriosa. É o próprio jogo que acaba.
E, no caso de nosso país, o nome deste jogo é Democracia, a melhor – e talvez única - forma que a humanidade encontrou, até agora, de garantir minimamente a liberdade que nos dignifica.
Esse conteúdo é de acesso exclusivo aos assinantes do OP+
Filmes, documentários, clube de descontos, reportagens, colunistas, jornal e muito mais
Conteúdo exclusivo para assinantes do OPOVO+. Já é assinante?
Entrar.
Estamos disponibilizando gratuitamente um conteúdo de acesso exclusivo de assinantes. Para mais colunas, vídeos e reportagens especiais como essas assine OPOVO +.