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Martha Nussbaun: a crise da democracia na atualidade e a desvalorização das humanidades
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É doutora em Educação pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Pesquisa agendas internacionais voltadas para as mulheres de países periféricos, representatividade feminina na política e história das mulheres. É autora do livro de contos "Alma Feminina"

Kalina Gondim comportamento

Martha Nussbaun: a crise da democracia na atualidade e a desvalorização das humanidades

Eventos como o 8 de janeiro e a invasão ao Capitólio evidenciam que muitos políticos não são afeitos a regras democráticas
Tiu França morreu após explodir bomba em frente ao STF em Brasília em 13 de novembro de 2024 (Foto: EVARISTO SÁ / AFP)
Foto: EVARISTO SÁ / AFP Tiu França morreu após explodir bomba em frente ao STF em Brasília em 13 de novembro de 2024

Os acontecimentos políticos dos últimos anos tornam irrefutável o diagnóstico que aponta para uma grave crise política a nível mundial.

A crise da democracia se revela bastante democrática, visto que atinge tanto países desenvolvidos, com elevado Produto Interno Bruto (PIB) e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) acima da média, quanto países periféricos, onde predominam uma fraca industrialização e uma histórica dívida social.

O aumento no número de obras que se debruçam sobre o tema é sintoma dos percalços e descaminhos pelos quais a democracia vem trilhando.

As consequências dessa crise podem ser evidenciadas pelo descaso com a política, pelo aumento do
número de votos nulos e, principalmente, pela ascensão de políticos autoritários que não demonstram disposição em defender os direitos fundamentais. A democracia é uma invenção humana fundamentada em regras formais e informais.

Uma das condutas esperadas no jogo democrático é que, após um processo eleitoral, o candidato derrotado aceite sua condição bem como a vitória do adversário. A previsão de uma passagem de governo com certo grau de previsibilidade e estabilidade sofreu rachaduras recentemente.

Eventos como a invasão do Capitólio, após a derrota de Donald Trump, o episódio de 8 de janeiro no Brasil e as últimas notícias que atestam a existência de um plano forjado para ceifar a vida do presidente da República são provas de que muitos políticos não são afeitos a regras democráticas.

Quanto às raízes que conduziram ao declínio do regime democrático no mundo, as conclusões são diversas e apontam para a crise econômica, o relativismo moral e a instrumentalização do direito, entre outros.

De fato, o desemprego estrutural, a piora nas condições de vida e o individualismo exacerbado, totalmente inepto para dialogar com a coletividade, incapaz de pensar o outro, o público, o nós, afetam a saúde da democracia. Digo mais, o indivíduo ensimesmado é incompatível com ela.

O discurso político alicerçado unicamente em torno do conceito de identidade também é apontado como causa da corrosão democrática.

Na Europa, muitos políticos de extrema direita utilizam a identidade nacional para angariar votos de uma população nativa temerosa, a consequência é a explosão da xenofobia.

Em minha caminhada para entender as causas e consequências da crise da democracia, fui apresentada à filósofa norte-americana Martha Nussbaun, uma voz feminina em meio à hegemonia de vozes masculinas.

A autora vai um pouco na contramão das teorias correntes, promovendo um deslocamento nas análises, propondo uma abertura para alimentar o debate atual acerca dos ataques à democracia.

A pergunta que subjaz do pensamento de Martha Nussbaun é: “Afinal, o currículo que enfatiza os chamados conhecimentos úteis e economicamente viáveis, forja indivíduos afeitos à uma cultura participativa e democrática?”.

A filósofa denuncia na obra Sem fins lucrativos: porque a democracia precisa das humanidades, o processo de desertificação das humanidades no currículo escolar e do ensino superior que tem como consequência indivíduos autocentrados, pragmáticos com total desconhecimento de filosofia, história
mundial, de outras culturas, sujeitos e linguagens.

Sem uma formação que fomente o debate e a pesquisa, o exercício da cidadania não floresce, e a democracia corre sérios perigos. A existência de uma cultura democrática é condição sine qua non para o
fortalecimento da democracia e deve ser resultado de uma formação humanística.

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