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10 anos - O motim de policiais que derrotou o governo repercute até hoje
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Plínio Bortolotti integra do Conselho Editorial do O POVO e participa de sua equipe de editorialistas. Mantém esta coluna, é comentarista e debatedor na rádio O POVO/CBN. Também coordenada curso Novos Talentos, de treinamento em Jornalismo. Foi ombudsman do jornal por três mandatos (2005/2007). Pós-graduado (especialização) em Teoria da Comunicação e da Imagem pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

10 anos - O motim de policiais que derrotou o governo repercute até hoje

O sucesso do movimento ilegal foi possível devido à pusilanimidade do então governador Cid Gomes (PDT) e ao erro brutal do Congesso Nacional, que anistiou os insurgentes, com aquiescência da então presidente Dilma Rousseff (PT)

A edição de hoje do O POVO (27/12/2021) traz reportagem sobre os dez anos do motim dos policiais militares, que “Derrotou o governo e reinventou a oposição no Ceará”. Segundo o texto de apresentação, “na virada de 2011 para 2012, o Ceará parou com medo da violência, enquanto policiais militares paralisaram suas atividades. O movimento afetou [negativamente] indicadores da segurança pública, projetou políticos, mexeu com governos e até hoje ecoa no Estado”.

Terceiro
O motim de 2011 foi o terceiro dos quatro ocorridos no Ceará: 1997, 2002, 2011 e 2020, os dois primeiros no governo Tasso Jereissati (PSDB). A diferença crucial é que os dois primeiros foram derrotados, assim como o de 2020, sendo portanto, o de 2011, o único em que os amotinados tiveram sucesso.

Líderes
Porém, em 1997 e 2002 não houve consequências graves para líderes e participantes do movimento, o que talvez tenha ajudado a fermentar o motim de 2011. Em 1997, por exemplo, o então comandante da Polícia Militar, coronel Mauro Benevides, foi baleado em frente ao Palácio da Abolição. Suspeita-se que o tiro tenha partido da arma de um dos grevistas, mas até hoje o crime continua impune.

Ilegal
Chega-se então ao motim de 2011, que terminou amplamente vitorioso, com os grevistas conquistando as principais reivindicações. Além disso, nenhum dos líderes ou participantes do movimento foi punido.

Erros
O sucesso desse movimento ilegal e anticonstitucional somente foi possível devido à pusilanimidade do então governador Cid Gomes (PDT), que capitulou às exigências dos grevistas, ao erro brutal do Congesso Nacional, aprovando uma anistia aos insurgentes, com aquiescência equivocada da então presidente da República, Dilma Rousseff (PT), que sancionou a benesse.

Carreira
O principal líder dos policiais em 2011 era um até então pouco conhecido oficial da PM, capitão Wagner. A partir desse movimento ilegal, ele catapultou sua carreira política, tornando-o centro aglutinador da oposição ao grupo Ferreira Gomes/PT, que hoje hegemoniza a política do estado do Ceará.

Reivindicações
A vitória estrondosa em 2011 criou um mito entre os policiais do Ceará que era possível arrancar reivindicações do governo por meio da sublevação. À época, o promotor de Justiça Militar, Joathan de Castro, já alertava que anistiar grevistas, que lançaram mão de “práticas criminosas”, abria precedente perigoso para outras sublevações.

Proposta
O promotor tinha razão, a conquista espetacular de 2011 levou os policiais a dobrarem a aposta em 2020, quando recusaram uma proposta bastante razoável do governo do Estado para iniciar mais um motim. Este, enfrentando com vigor pelo governador Camilo Santana (PT) que levou à derrota dos grevistas, resultando em rigorosas punições aos líderes, inclusive expulsão dos quadros da PM. Além disso, foi aberta uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Assembleia Legislativa — a CPI do Motim —para aprofundar as investigações.

Criminalidade
Os motins tiveram outro efeito colateral: o aumento da criminalidade no Estado. Em 2012, os homicídios aumentaram 32,9%; em 2020, os homicídios deram um salto de 78,9%, o maior da história.

Lição
A lição que se pode tirar desses episódios é que eles não podem ser tolerados, pois põem em risco a sociedade, afrontam a democracia e violam a Constituição. Se o governo do Estado não houvesse respondido com energia em 2020, é bem possível que o mau exemplo do Ceará tivesse contaminado forças de outros estados.

Direito
Não se contesta aqui o direito que os trabalhadores da segurança pública têm a um salário digno e condições adequadas para exercerem o seu trabalho. Porém, não se pode admitir um movimento de policiais armados, cuja tática de reivindicatória é aterrorizar a população.
*

1) Este texto foi escrito a partir da reportagem Há 10 anos - Motim de policiais derrotou o governo e reinventou a oposição no Ceará, assinada pelo jornalista Érico Firmo, com artigos dos repórteres que cobriram a greve: Cláudio Ribeiro, Henrique Araújo e Demitri Túlio. Por óbvio, as opiniões emitidas são de minha exclusiva responsabilidade.
2) Escrevi recentemente o artigo Moro amotina-se contra a verdade dos fatos, depois que o ex-juiz visitou o Ceará, sem assumir que deu mole para o motim, ou como se diz nas redes "passou o pano".

Foto do Plínio Bortolotti

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