Sou jornalista de formação. Tenho o privilégio de ter uma vida marcada pela leitura e pela escrita. Foi a única coisa que eu fiz na vida até o momento. Claro, além de criar meus três filhos. Trabalhei como repórter, editora de algumas áreas do O POVO, editei livros de literatura, fiz um mestrado em Literatura na Universidade Federal do Ceará (UFC). Sigo aprendendo sempre. É o que importa pra mim
.Assistir ao filme do Walter Salles, "Ainda Estou Aqui", me causou profundo incômodo de sentir como a ditadura brasileira foi amenizada, abrandada e justificada. Podemos tomar outros caminhos como País
Foto: divulgação
Ricardo Darín e Peter Lanzani protagonizam o longa "Argentina 1985"
Quando Tom Jobim afirmou – presumivelmente – em meados de 1960 que o “Brasil não é para principiantes”, já tinha vivido muito coisa que lhe dava a condição de fazer uma síntese quase perfeita do País, do ponto de vista de alguém que se propõe a fazer uma leitura sob qualquer ângulo desta Nação. Sem saber ou querer, porém, Jobim talvez tenha profetizado. O Brasil continua bem exigente.
Acho que por coincidência, enquanto o filme “Ainda estou aqui”, de Walter Salles assume uma posição importante na filmografia brasileira e estamos todos torcendo pela Fernanda Torres e pelo trabalho no Oscar 2025, assisti ao “Argentina, 1985”, dirigido por Santiago Mitre, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro de 2023, tendo perdido para “Zona de Interesse”, de Jonathan Glazer.
Em “Argentina”, Ricardo Darín, encarna o promotor Julio Strassera, que junto a uma equipe de jovens advogados levam nove militares argentinos acusados de crimes contra a humanidade durante a ditadura argentina (1976-1983), ao banco dos réus, em um tribunal civil.
Baseado em fatos reais, em algum momento da película, o próprio Strassera parece ter duvidado que isso era possível. Em 1985, a democracia argentina ainda estava sarando feridas recentes da ditadura.
As tensões do episódio são marcadas também pelo assistente da promotoria, Luís Moreno Ocampo (Peter Lanzani), um jovem sem nenhuma experiência jurídica, filho e neto de militares. O manejo do diretor deixou claro que na Argentina houveram também aqueles, em todas as áreas, que silenciaram enquanto milhares eram mortos.
A anistia brasileira que contemplou militares e também participantes dos movimentos contra o golpe de 1964 no Brasil parece sempre ter sido visto como uma forma de pacificar o País. Será mesmo que isso aconteceu?
Agora, o País tem chance de cumprir o ritual de julgamento de todos aqueles que efetivamente estiveram envolvidos numa tentativa de golpe em 2022-23, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, que, como sempre, tenta escapar usando o uniforme da vítima.
É preciso clarear qualquer ponto nublado da participação dos acusados na conjura golpista. Todos precisam de um julgamento justo com ampla defesa. Mas, devem ser julgados e responsabilizados.
Será nossa primeira vez. O discurso do bolsonarismo de anistia para todos visa tão somente a própria pele de Bolsonaro, porque sempre foi ele o único que interessa.
A anistia brasileira do passado criou a figura de “herois torturadores”. Alguns deles são inspiração de muitos brasileiros.
Assistir ao filme do Walter Salles me causou profundo incômodo de sentir como a ditadura brasileira foi amenizada, abrandada e justificada. Podemos tomar outros caminhos como País. Outras escolhas estão à nossa frente. A Argentina julgou seus militares numa hora crítica.
O Brasil pode não ser para principiantes, como disse Jobim, mas a democracia brasileira demonstrou que suporta solavancos.
Nossa democracia sairá ainda mais resistente quando provar que militares podem ser julgados e condenados dentro das leis. Porque é disso que se trata: temos um regime imperfeito por natureza, mas é o único que nos acode.
Tentativa de Golpe: Por que plano para manter Bolsonaro no poder fracassou? l O POVO NEWS
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