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IPM usou depoimento de indicados pela defesa para afirmar que Mizael era faccionado
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IPM usou depoimento de indicados pela defesa para afirmar que Mizael era faccionado

Versão contraria fala de familiares, vizinhos e profissionais da escola do garoto de 13 anos, assim como apuração de inquérito paralelo, da DAI.
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Chorozinho - Ceará, Brasil, 08 de julho de 2020: Lidiane Rodrigues da Silva, 33, mãe de Mizael Fernandes. Caso Mizael Fernades da Silva. Adolescente morto por policiais militares em 01/07/2020 em Chorozinho - Ceará. (Foto: Júlio Caesar/O Povo) (Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Chorozinho - Ceará, Brasil, 08 de julho de 2020: Lidiane Rodrigues da Silva, 33, mãe de Mizael Fernandes. Caso Mizael Fernades da Silva. Adolescente morto por policiais militares em 01/07/2020 em Chorozinho - Ceará. (Foto: Júlio Caesar/O Povo)

Baseado nos depoimentos dos investigados e de testemunhas indicadas por eles, o Inquérito Policial Militar (IPM), que viu legítima defesa na ação policial que matou Mizael Fernandes da Silva Lima, chegou a versão diferente dos fatos que resultaram na morte do garoto de 13 anos na comparação com a investigação da Delegacia de Assuntos Internos (DAI). Entre as divergências está uma suposta ligação de Mizael com o crime organizado, negada por familiares, vizinhos e funcionários da escola onde ele estudava, assim como apuração da DAI, que ainda havia indiciado o sargento Enemias Barros da Silva por homicídio qualificado.

No relatório final do IPM, ao qual O POVO teve acesso, são ouvidas quatro fontes a pedido da defesa, nenhuma testemunha ocular. O único civil diz ter "ouvido da boca de terceiros" que Mizael integraria quadrilha que invadiu a casa dele em fevereiro deste ano. Um soldado diz ter "ficado sabendo" que Mizael era homem de confiança de um criminoso conhecido por roubos e homicídios na cidade, e que tinha mandado de prisão em aberto. O apelido do homem é "Sequestro", mas o IPM não informa o nome completo do suspeito. O militar diz que, com ele, Mizael teria cometido homicídio no começo do ano, mas não é informado o nome da vítima nem é arrolado inquérito que investiga o caso. Ele não dá mais detalhes sobre como chegou à informação.

O mesmo militar ainda afirma que Mizael pertenceria à facção Guardiões do Estado (GDE) e, que no dia seguinte à morte, a população foi "obrigada" a realizar manifestação de repúdio. No dia seguinte, circulou "salve" em redes sociais "pedindo" que comerciantes fechassem as portas em referência à morte de Mizael — no texto, porém, constava assinatura da facção Comando Vermelho, rival da GDE. Familiar de Mizael havia registrado, em 2 de julho, boletim de ocorrência por abuso de autoridade, após policiais publicarem em redes sociais que o adolescente teria envolvimento com a criminalidade.

O depoimento de um sargento tem teor semelhante ao do soldado. Ele também afirmou que Mizael era faccionado, mas este não soube dizer qual seria a facção que o garoto pertencia. Já um oficial do Corpo de Bombeiros afirma "ter ficado sabendo por intermédio de alguns populares" que Mizael integraria grupo que invadiu a sua casa em 2014 — quando Mizael tinha 8 anos.

Para o tenente-coronel Paulo André Pinho Saraiva, responsável pela investigação, os depoimentos são suficientes para contrariar os demais testemunhos. "Outro fato importante é que, enquanto as testemunhas arroladas [...] aduzirem que Mizael não tinha qualquer envolvimento em condutas delituosas, as testemunhas (indicadas pela defesa) afirmaram o contrário, que Mizael era integrante da facção criminosa que atua na Região de Chorozinho". Mizael não tinha registro de ato infracional. Outros policiais ouvidos nas investigações dizem nunca ter recebido informação ligando-o a crimes.

Em outra divergência entre investigados e testemunhas, o IPM também deu crédito a versão dos PMs. Familiares afirmaram não ter havido voz de comando, como afirmado pelos PMs quando teriam visto Mizael com arma na mão. "Acontece que não se vislumbra nos autos qualquer elemento suficiente que dê sustação a versão apresentada por tais testemunhas. Já as versões apresentadas pelos investigados e demais policiais são corroboradas pela própria apreensão da arma, cujo laudo pericial de eficiência atestou positivo", diz o IPM. A família acredita que a arma foi plantada pelos policiais.

O IPM foi remetido à Justiça no último dia 29. Cabe agora ao Ministério Público do Estado (MPCE), por meio da Promotoria de Justiça Militar, emitir parecer sobre a investigação, acatando o entendimento do parecer e arquivando o caso ou pedindo mais diligências. Na quinta-feira, 8, a Justiça deu 15 dias para o MPCE se pronunciar. Com relação ao inquérito da DAI, o MPCE, através da Promotoria de Chorozinho, concedeu, em 30 de setembro, mais 45 dias para conclusão.

 

 

 

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