Tendo a espécie humana, origem africana, todas as pessoas de outros continentes têm em sua história familiar um imigrante. Nas Américas e, por tabela, no Ceará, esses primeiros desbravadores vinham do extremo nordeste asiático, atravessando o Estreito de Bering há cerca de 15 mil anos.
Há cerca de 500 anos foi a vez de portugueses e em menor escala, espanhóis, franceses e holandeses. Quase na mesma época, milhares de pessoas foram trazidas à força da África escravizadas por colonizadores europeus. No fim do século XIX e início do século XX, porém a imigração para o Brasil começou a ganhar contornos mais modernos.
Sobrenomes como Jereissati, Romcy, Ary, Otoch, Dias Branco, Gradvohl, Boris, Fujita e Dummar, entre outros, viraram sinônimo de verdadeiros impérios empresariais. Muitos deles vieram fugidos de crises econômicas ou mesmo perseguição política e religiosa e contrariaram um discurso que têm voltado à tona na atualidade de que imigrantes prejudicam a economia dos locais para os quais se deslocam.
Henrique Marinho, que lançou na última terça-feira, 21, o livro “A saga dos empresários imigrantes na economia cearense”, é um dos principais estudiosos do impacto que essas famílias trouxeram ao modo de fazer negócios no Estado. “Antes da chegada desses imigrantes, as atividades econômicas no Ceará se concentravam nos portos de Aracati e Camocim, e Fortaleza praticamente não tinha expressão. Foram esses imigrantes que deram esse impulso econômico à Capital”, pontuou.
Para além do comércio, outras vocações econômicas hoje estabelecidas no Ceará, de um modo particular, também vieram de iniciativas de imigrantes ou seus descendentes. “Os Otoch, por exemplo, criaram toda uma rede que incluiu os grandes hotéis da avenida Beira Mar. Já os Lazar criaram o São Pedro Hotel, que foi um dos melhores hotéis de Fortaleza”, citou.
“Os Dias Branco fundaram um grande império na área de alimentação, o maior em seu segmento na América Latina. Os Jereissati trouxeram o primeiro shopping center de Fortaleza e depois construíram uma das maiores redes de shoppings do País. Temos também os franceses, como os Gradvhol, que dominaram a indústria pesqueira por muito tempo”, exemplificou.
Para o historiador Ruben Maciel Franklin, um exemplo marcante de novas formas de fazer negócio trazido por imigrantes, especialmente libaneses, foi o dos popularmente chamados “galegos”. “Essa configuração organizava uma economia que levava produtos e utensílios básicos para as áreas mais remotas, onde a população não teria acesso de outra maneira”, ressaltou.
“Quando eles começaram a abrir suas primeiras lojas, tinham um centro em Fortaleza, mas distribuíam mercadorias para pequenas famílias que também tinham pequenas lojas em várias cidades como Quixadá, Quixeramobim e áreas litorâneas. Isso acontecia também com outras etnias, mas que focavam em áreas mais específicas”, explicou o historiador.
Por sua vez, o presidente da Câmara Brasil-Portugal no Ceará, Raul dos Santos, enfatiza a importância da imigração lusitana para o Estado. “Ela definiu muitos dos nossos costumes aqui. Um símbolo muito grande é a Praça Portugal, em um dos bairros mais nobres de Fortaleza. Muitas coisas que temos aqui hoje, a gente não percebe, como o modelo das casas”, citou.
“Além disso, outra coisa importante é que não só o português, mas geralmente quem vem de fora vem com uma sede muito grande de vencer. É como se não tivesse outra alternativa. A pessoa atravessa o Atlântico e precisa dar certo. Então, muitas vezes esse impulso é o que gera um empreendedorismo maior”, observou.
Já o presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Ricardo Cavalcante, exalta que “os imigrantes que vieram para cá foram todos pessoas extremamente trabalhadoras, corretas, sérias, e, em dado momento, tiveram de sair de seus países por motivos alheios à vontade deles ou por necessidade”.
“Ao chegar ao Ceará, quase todos tiveram muito sucesso pela abnegação, pela capacidade de se reinventar e, ao mesmo tempo, pela condição de, ao chegar em um novo País, ver as oportunidades que, às vezes, nós que moramos aqui não vemos”, concluiu o presidente da Fiec.
Nos últimos 15 anos, o perfil de imigração no Brasil, de um modo geral, tem sido marcado por um fluxo grande de imigrantes venezuelanos e haitianos. Muitos deles também estão empreendendo aqui, após deixar um cenário de dificuldade em suas respectivas terras natais.
Outros, como os franceses, os italianos e os chineses, por exemplo, têm escolhido o País de olho em oportunidades de negócio que vão do comércio de variedades, passando pelo turismo e pela indústria de energias renováveis.