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Taxonomia Sustentável Brasileira redefine regras do jogo para investimentos e sustentabilidade
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Reportagem Seriada

Taxonomia Sustentável Brasileira redefine regras do jogo para investimentos e sustentabilidade

A criação do instrumento marca um novo capítulo na agenda ambiental do país. Iniciativa estabelece critérios claros para definir o que é sustentável e reforça o combate ao greenwashing, alinhando economia, clima e inclusão social
Episódio 8

Taxonomia Sustentável Brasileira redefine regras do jogo para investimentos e sustentabilidade

A criação do instrumento marca um novo capítulo na agenda ambiental do país. Iniciativa estabelece critérios claros para definir o que é sustentável e reforça o combate ao greenwashing, alinhando economia, clima e inclusão social
Episódio 8
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Às vésperas da abertura da COP30, o Brasil publicou, no início de novembro, o Decreto nº 12.705, que instituiu a Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB) como instrumento do Plano de Transformação Ecológica.

O foco é em segmentos estratégicos, como agricultura, energia, construção, transporte, saneamento e indústria, criando uma linguagem comum entre setores públicos e privados.

Por aqui, a taxonomia funcionará como uma espécie de dicionário da sustentabilidade, que estabelece como uma atividade econômica, um ativo financeiro ou um projeto de investimento pode ser considerado sustentável, com base em critérios objetivos de contribuição substancial ou de não causar prejuízos significativos aos objetivos econômicos, sociais, ambientais e climáticos.

 

Na prática, ela vai orientar as empresas sobre como relatar, verificar e monitorar suas informações de sustentabilidade. Com isso, elas precisarão adotar rotas tecnológicas mais limpas e descarbonizantes além de promover equidade racial e de gênero em toda a cadeia produtiva.

Segundo o advogado, mestrando em Direito na Universidade Federal do Ceará (UFC) e pesquisador do tema, Lucas Saboya de Albuquerque, a taxonomia precisa ser compreendida como um critério de adicionalidade.

“Cumprir o código florestal ou realizar o licenciamento ambiental de um empreendimento não é suficiente para mudarmos a crise climática que estamos vivendo, e os setores precisam amadurecer para incorporar a sustentabilidade como valor em suas operações”, resslata.

Taxonomia como guia para evitar prejuízos a diferentes objetivos, como o climático. (Foto: JÚLIO CAESAR)
Foto: JÚLIO CAESAR Taxonomia como guia para evitar prejuízos a diferentes objetivos, como o climático.

Para ele, a instituição da Letra de Crédito de Desenvolvimento, por exemplo, serve como mecanismo de mercado para aumentar a adesão do mercado à economia sustentável. Quanto antes a taxonomia interferir nas relações de produção e consumo, mais rápido os benefícios serão percebidos por todos.

A taxonomia brasileira está sendo construída em diálogo com referenciais internacionais, mas buscando refletir as especificidades do país. Albuquerque avalia que a convergência entre as diferentes taxonomias, também chamada de interoperabilidade, se apresenta como um fator de facilitação ao fluxo internacional de investimentos.

“Vale pontuar que um dos principais aspectos da taxonomia sustentável é combater o greenwashing e uniformizar a apresentação de informações de sustentabilidade para o mercado. Na COP 30, o Brasil anunciou a ambição de desenvolver uma taxonomia global. Embora se trate de uma proposta interessante, o cenário atual do multilateralismo pode se tornar uma barreira relevante para a construção de um regulamento global”, detalha.

 

Apontada como o pilar do Plano de Transformação Ecológica, a TSB é, segundo a subsecretária de Desenvolvimento Econômico Sustentável do Ministério da Fazenda, Cristina Reis, um instrumento alinhado às prioridades do país.

Ela destaca que a iniciativa não reproduz modelos internacionais, mas se consolida como um marco ao priorizar a mitigação e a adaptação às mudanças climáticas e ao incorporar, de forma inédita, o enfrentamento das desigualdades sociais, incluindo recortes de gênero e raça.

Albuquerque analisa que, quando observamos o Plano de Transformação Ecológica como um todo, vê-se que a taxonomia é central na efetivação de todas as ações, mas pode-se destacar algumas iniciativas que buscam dar tração ao regulamento.

Como a aprovação da Lei 14.937/2024, em julho de 2024, que institui a Letra de Crédito de Desenvolvimento, análoga às já conhecidas Letra de Crédito Imobiliário (LCI) e a Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), que permite a captação de recursos para projetos alinhados à taxonomia sustentável.

“Além disso, a velocidade com que as mudanças serão percebidas depende do apetite do mercado e dos consumidores por produtos sustentáveis e da velocidade com que se consiga reduzir o custo de oportunidade para acessar esses produtos, que nem sempre são os mais baratos do mercado”, avalia.

A primeira versão do documento que orienta a TSB, organizada pelo Comitê Interinstitucional da Taxonomia Sustentável Brasileira (CITSB), contou com a participação de mais de 350 especialistas de 63 instituições, entre elas, algumas do setor de seguros e a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg).

Setor esse que será incluído em etapa futura, com critérios técnicos para definir a relação de suas operações com práticas sustentáveis.

De acordo com a diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Prates, a TSB estabelece uma base sólida para que empresas financeiras e não financeiras, incluindo seguradoras, alinhem suas estratégias às metas nacionais de mitigação e adaptação às mudanças climáticas, à redução das desigualdades socioeconômicas e à promoção da inovação sustentável.

Prates apongta que a TSB abre novas possibilidades para que instrumentos financeiros, incluindo seguros, sejam rotulados de forma consistente e transparente como sustentáveis.

“Com isso, o mercado poderá identificar com maior precisão o volume de recursos efetivamente direcionados a projetos e atividades alinhados aos objetivos socioambientais e econômicos do país, além de orientar esforços e fornecer subsídios para o aprimoramento de produtos, o desenvolvimento de novas soluções e a ampliação da escala de instrumentos capazes de apoiar a transição climática e o avanço de uma economia de baixo carbono”, finaliza.

 

 

A TSB e a transformação cultural

Em entrevista exclusiva ao O POVO, a diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Prates, analisa como a Taxonomia Sustentável Brasileira pode impulsionar uma transformação cultural no setor de seguros.

Segundo ela, ao estabelecer critérios claros sobre o que é sustentável, a taxonomia estimula inovação, orienta novos produtos e amplia o papel do seguro no financiamento da transição climática, ao mesmo tempo em que reforça transparência, governança e alinhamento às prioridades sociais e ambientais do país.

O POVO - Como a Taxonomia Sustentável pode funcionar como um instrumento de transformação cultural dentro das empresas, especialmente em setores tradicionais, como o de seguros?

Claudia Prates - A Taxonomia Sustentável Brasileira (TSB) é o sistema oficial do país que define, com critérios objetivos, quais atividades econômicas são consideradas sustentáveis.

Claudia Prates, diretora de Sustentabilidade da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg) (Foto: Kelly Maia/Divulgação)
Foto: Kelly Maia/Divulgação Claudia Prates, diretora de Sustentabilidade da Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg)

Seu propósito central é impulsionar fluxos de capital e esforços públicos para setores, projetos que contribuam para metas socioambientais e climáticas, incluindo crédito, investimento e seguros.

Ao identificar de forma clara quais atividades são sustentáveis e quais demandas específicas elas possuem, a TSB leva o setor de seguros a olhar para esses segmentos com mais atenção.

Isso estimula a criação de produtos, coberturas e serviços desenhados para apoiar setores sustentáveis, ampliando a capacidade do seguro de viabilizar investimentos essenciais para a transição da economia, reduzir riscos e gerar impacto positivo. Essa lógica torna a sustentabilidade um critério técnico e econômico.

O POVO - Quais os maiores desafios para harmonizar a Taxonomia Brasileira com referências internacionais, como a europeia, sem perder de vista as peculiaridades sociais, climáticas e econômicas do país?

Claudia - O principal desafio é que cada país possui realidade socioeconômica, climática e ambiental própria. Por isso, critérios definidos na União Europeia, voltados a economias maduras, com outra matriz energética, outra estrutura produtiva e outras vulnerabilidades, não podem ser simplesmente copiados para a América Latina.

Um princípio orientador ao desenvolvimento das taxonomias sustentáveis soberanas é a “interoperabilidade”, a capacidade de comunicação entre os critérios de diferentes taxonomias, sem perder de vista as especificidades de cada economia.

A harmonização exige equilíbrio entre convergência internacional (para facilitar fluxos de investimentos e comparabilidade), e adequação local, respeitando desafios brasileiros como desigualdade, transição justa, vulnerabilidade climática, matriz energética limpa e importância de setores como agro, florestas e bioeconomia.

diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Prates, na Casa do Seguro, durante a COP30 em Belém(Foto: Matheus Assis/CNseg/Divulgação)
Foto: Matheus Assis/CNseg/Divulgação diretora de Sustentabilidade da CNseg, Claudia Prates, na Casa do Seguro, durante a COP30 em Belém

O POVO - De que forma a Taxonomia pode estimular inovação no setor segurador, especialmente no desenvolvimento de novos produtos que integrem risco climático, transição justa e impacto socioambiental?

Claudia - A TSB destaca setores, projetos e atividades considerados estratégicos para o desenvolvimento sustentável do país e orienta políticas públicas e investimentos em direção a eles. São áreas emergentes, com riscos específicos e necessidades próprias de financiamento.

Esse direcionamento revela novas demandas de proteção, incentiva a criação de produtos inovadores, estimula coberturas que integrem riscos climáticos, transição justa e impacto socioambiental, amplia oportunidades para seguros que viabilizam investimentos verdes (agro sustentável, restauração florestal, energia renovável, mobilidade, bioeconomia etc).

Assim, a Taxonomia funciona como um mapa para inovação e para novos modelos de negócio.

O POVO - A senhora acredita que a adoção da Taxonomia poderá redefinir como as seguradoras avaliam risco e precificam apólices em um cenário de eventos climáticos extremos mais frequentes? Por quê?

Claudia - A adoção da TSB, por si só, não deve redefinir de maneira direta a avaliação de risco ou a precificação das apólices, especialmente no contexto de eventos climáticos extremos mais frequentes.

A taxonomia é essencialmente um instrumento de classificação e transparência, e não um mecanismo regulatório que interfira nos modelos atuariais ou nas metodologias de subscrição.

No entanto, ela pode estimular indiretamente ajustes ao reforçar a necessidade de considerar critérios socioambientais, ampliar a disponibilidade de dados e incentivar práticas de governança mais robustas.

Esses elementos contribuem para um ambiente em que as seguradoras podem evoluir seus modelos de risco, mas a precificação continuará sendo orientada principalmente por dados climáticos, exposição e sinistralidade, e não pela taxonomia em si.

O POVO - Quais são os principais eixos ou critérios da Taxonomia Brasileira que impactam diretamente o setor de seguros?

Claudia - Os impactos diretos decorrem principalmente do caderno de Monitoramento, Relato e Verificação (MRV) da TSB, que determina que instituições financeiras, incluindo seguradoras e entidades de previdência, deverão monitorar, verificar e reportar o volume de instrumentos financeiros classificados como sustentáveis.

Isso significa que, no futuro, as seguradoras precisarão identificar e controlar quais produtos e coberturas contribuem para viabilizar, proteger ou mitigar riscos de atividades reconhecidas como sustentáveis pela TSB.

O POVO - Quais prazos regulatórios o setor precisa observar para adequação à Taxonomia no Brasil?

Claudia - A implementação da TSB será gradual. O processo começa com empresas abertas e instituições financeiras enquadradas nos segmentos S1 e S2 do Banco Central, que iniciarão o reporte de forma voluntária e, posteriormente, obrigatória.

As seguradoras e entidades de previdência participarão da fase seguinte, cuja regulamentação específica e cronograma detalhado ainda serão definidos, incluindo um período de testes e ajustes.

Embora o setor segurador só ingresse formalmente na segunda etapa, é recomendável que antecipe sua preparação, considerando que o setor já possui normas de sustentabilidade, como a Circular Susep 666/2022, que temas ASG vêm sendo incorporados à supervisão prudencial e que já existe regulamentação específica para produtos sustentáveis, como a Resolução CNSP 473.

Agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura estão entre os setores que vão se orientar pela TSB(Foto: Adobe Stock )
Foto: Adobe Stock Agricultura, pecuária, produção florestal, pesca e aquicultura estão entre os setores que vão se orientar pela TSB

Dessa forma, o mercado deve acompanhar atentamente a publicação dos cadernos técnicos finais da TSB, o calendário de reporte e as futuras normas da Susep que integrarão a taxonomia às obrigações do setor.

O POVO - O setor de seguros terá indicadores próprios dentro da Taxonomia ou seguirá integralmente os critérios gerais estabelecidos pelo governo?

Claudia - A TSB não define indicadores específicos para o setor de seguros; portanto, assim como bancos e fundos, as seguradoras deverão monitorar, verificar e reportar os instrumentos financeiros associados a atividades sustentáveis.

No entanto, aplicar diretamente a lógica de crédito e investimento não é suficiente, porque o seguro possui particularidades fundamentais: ele não apenas financia atividades, mas as viabiliza, reduz riscos diretos e indiretos, inclusive ambientais, e aumenta a resiliência econômica de setores e cadeias produtivas.

Racismo ambiental: 62% das pessoas que enfrentam o déficit habitacional no Brasil são negras e moram em locais de risco(Foto: Martin Bernetti / AFP)
Foto: Martin Bernetti / AFP Racismo ambiental: 62% das pessoas que enfrentam o déficit habitacional no Brasil são negras e moram em locais de risco

Diante dessas especificidades, a CNseg desenvolveu a Taxonomia Sustentável do Setor de Seguros (TSS), que traduz e conecta a TSB, a Resolução CNSP 473/2023 e a estrutura própria da cadeia de valor do seguro.

A TSS tem como propósito estabelecer critérios claros e harmonizados para identificar seguros, planos de previdência e produtos de capitalização sustentáveis. Além de orientar a transformação de processos ao longo da cadeia de valor dos produtos, estimular inovação e servir de base técnica para futuras normas da Susep.

Sua implementação deve gerar benefícios amplos. Para o mercado, oferece padronização, redução de assimetrias de informação, alinhamento às agendas nacionais e internacionais de finanças sustentáveis e maior segurança na oferta de produtos sustentáveis.

Para o regulador, fornece base técnica para aprimoramentos normativos e maior clareza para supervisão ASG. Para a sociedade, amplia o acesso à proteção, incentiva soluções para setores críticos como agro, florestas e cidades, fortalece a adaptação climática e contribui para maior transparência e confiança no setor.

 

 


Na COP30: Seguradoras e a agenda climática

Durante a COP30, em Belém, a Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização (CNseg) criou o espaço Casa do Seguro, onde as empresas realizaram paineis sobre a temática da sustentabilidade, questões climáticas e gestão de riscos.

Em sua participação em uma das agendas, o presidente da Caixa Seguridade, Gustavo Portela, propôs que o setor de seguros assuma definitivamente seu papel estratégico diante da escalada dos eventos climáticos extremos.

Incêndios, ondas de calor, tempestades e enchentes, do Chile ao Hemisfério Norte, da África à Europa e, cada vez mais, no Brasil, deixaram de ser exceções, lembra o executivo que evidenciou o tornado que atingiu a cidade de Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná, em outubro.

Presidente da Caixa Seguridade, Gustavo Portela(Foto: Caixa Seguridade/Divulgação)
Foto: Caixa Seguridade/Divulgação Presidente da Caixa Seguridade, Gustavo Portela

Ele ainda recordou a importância do Brasil no contexto ambiental, já que foi no Rio 92 que nasceram a Agenda 21, a Convenção-Quadro da ONU sobre Mudanças Climáticas e a UNEP-FI.

Segundo ele, foi ali que o setor segurador começou a compreender seu papel na gestão dos riscos ambientais, consciência que hoje se torna central para a continuidade da vida econômica e social.

Assim, a empresa realizou a adesão da Caixa Seguridade aos Princípios para a Sustentabilidade em Seguros (PSI), da UNEP-FI, e confirmou a entrada da associação ao CEBDS. Para ele, enfrentar a crise climática exige um “pacto civilizatório”, no qual as seguradoras deixam de atuar apenas após os desastres e passam a influenciar na prevenção, resiliência e reconstrução.

Setor de seguros debate agenda verde na COP30(Foto: Caixa Seguridade/Divulgação)
Foto: Caixa Seguridade/Divulgação Setor de seguros debate agenda verde na COP30

Já Viviane Romeiro, diretora do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), destacou que o momento atual da agenda climática é de acelerar a implementação das ações, saindo do campo da negociação para a prática.

De ver os seguros não apenas como reparo, mas como prevenção, um papel fundamental para promover uma maior qualidade de vida e reduzir a vulnerabilidade a eventos extremos.

Viviane também ressaltou a relevância da justiça climática, que conecta os impactos ambientais às desigualdades sociais e à crise da biodiversidade, pois o setor de seguros tem papel estratégico nesse contexto, ao incorporar o olhar social na gestão de riscos climáticos.

Presidente da Caixa Seguridade, Gustavo Portela, e Butch Bacani, head de Seguros da UNEP FI, após adesão da Caixa ao PSI(Foto: Caixa Seguridade/Divulgação)
Foto: Caixa Seguridade/Divulgação Presidente da Caixa Seguridade, Gustavo Portela, e Butch Bacani, head de Seguros da UNEP FI, após adesão da Caixa ao PSI

Butch Bacani, head de Seguros da Unep FI, assinalou que o Principles for Sustainable Insurance (PSI) foi criado no Brasil durante a Rio+20, em 2012, e ressaltou o papel dos seguradores na sustentabilidade como gestores de risco, subscritores de risco (seguradores) e investidores.

“Sustentabilidade genuína é sobre equidade intergeracional. Ou seja, desenvolver as necessidades do presente sem comprometer as necessidades das gerações futuras”, diz.

Já a Mapfre acredita que a restauração florestal é fundamental para que o Brasil fortaleça seu papel na agenda climática global. Mas, para que esse movimento avance de verdade, os projetos ambientais precisam ser tratados como investimentos de longo prazo, capazes de resistir a mudanças econômicas, exigências regulatórias e aos eventos climáticos extremos que já fazem parte do nosso dia a dia.

Para a Mapfre, restauração florestal é fundamental para que o Brasil fortaleça seu papel na agenda climática global. Na foto, Aquasis faz a introdução de periquitos cara-suja na Serra da Aratanha(Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal Para a Mapfre, restauração florestal é fundamental para que o Brasil fortaleça seu papel na agenda climática global. Na foto, Aquasis faz a introdução de periquitos cara-suja na Serra da Aratanha

O novo seguro da empresa é classificado como produto sustentável, atendendo à Resolução CNSP nº 473/2024, contribuindo, assim para a preservação ambiental e mitigação das mudanças climáticas, capazes de gerar benefícios climáticos, por meio da proteção de áreas reflorestadas.

Os benefícios climáticos e ambientais decorrentes da manutenção das florestas seguradas são mensurados e monitorados, reforçando o compromisso com práticas responsáveis e alinhadas aos princípios de sustentabilidade.

Fátima Lima, diretora de sustentabilidade da Mapfre, informa que o Bioseguro surge justamente para dar essa segurança, pois ele transforma toda a estrutura de governança e gestão de risco em um instrumento que traz previsibilidade para quem está investindo na restauração.

Incêndios, ondas de calor, tempestades e enchentes, do Chile ao Hemisfério Norte, da África à Europa e, cada vez mais, no Brasil, deixaram de ser exceções(Foto: FABIO LIMA)
Foto: FABIO LIMA Incêndios, ondas de calor, tempestades e enchentes, do Chile ao Hemisfério Norte, da África à Europa e, cada vez mais, no Brasil, deixaram de ser exceções

“Além de proteger as áreas florestadas, garantimos que os projetos de carbono continuem válidos e gerando resultados ao longo do tempo, oferecendo mais tranquilidade para produtores, investidores e todos que acreditam no potencial do Brasil como potência ambiental”, observa a executiva.

Segundo ela, a visão proposta pela taxonomia está totalmente alinhada à estratégia de negócios da empresa.

“Queremos apoiar o desenvolvimento sustentável com soluções que reduzem incertezas e aumentam a confiança do mercado, permitindo que a bioeconomia brasileira cresça com solidez. Sem estabilidade, projetos desse porte não ganham escala e, sem escala, não entregam o impacto climático que todos esperamos”, finaliza.

 

 

Clima: novos olhares da previdência

Os riscos de transição e riscos físicos, critérios de alinhamento climático, desafios regulatórios e perspectivas de financiamento sustentável são temas presentes quando se fala de previdência privada.

A pesquisadora da Escola de Administração de Empresas de São Paulo (FGV EAESP), Annelise Vendramini, apresentou os resultados de um estudo desenvolvido em parceria com o conglomerado Caixa e o iCS, que combinou diagnóstico da alocação climática das carteiras, avaliação do ambiente regulatório e autorregulatório.

Os dados apontam que, atualmente, apenas entre 10% e 12% do patrimônio líquido dos fundos de previdência aberta está, em média, alinhado à agenda climática, o que revela um amplo potencial de crescimento dessa alocação.

A justiça climática incorpora o olhar social na gestão de riscos climáticos(Foto: Samuel Setubal/ O POVO)
Foto: Samuel Setubal/ O POVO A justiça climática incorpora o olhar social na gestão de riscos climáticos

Para Annelise, a articulação entre análise regulatória, avaliação das carteiras e escuta qualificada do mercado foi decisiva para compreender a complexidade do tema e identificar caminhos viáveis para ampliar os investimentos em sustentabilidade.

Em sua exposição, a pesquisadora ressaltou, ainda, que a disponibilidade de ativos sustentáveis permanece restrita, tanto em escala quanto em qualidade, e que a insuficiência de informações climáticas transparentes dificulta a adequada avaliação de riscos pelos investidores.

O estudo também apontou a existência de pressões de curto prazo sobre os gestores, inclusive em produtos concebidos para horizontes mais longos, e destacou que o marco regulatório brasileiro já permite a adoção de critérios ESG, desde que essa incorporação seja acompanhada por maior transparência e por mecanismos eficazes de prevenção ao greenwashing.

O marco regulatório brasileiro já permite a adoção de critérios ESG. Na foto, pátio de compostagem do Beach Park, no Porto das Dunas, um das principais iniciativas ESG da instituição (Foto: Samuel Setubal)
Foto: Samuel Setubal O marco regulatório brasileiro já permite a adoção de critérios ESG. Na foto, pátio de compostagem do Beach Park, no Porto das Dunas, um das principais iniciativas ESG da instituição

“Apesar de um ambiente regulatório em constante evolução, não identificamos obstáculos significativos que impeçam a alocação em questões ESG, sempre considerando o cumprimento do dever fiduciário e as devidas responsabilidades. Na verdade, há um crescente interesse e desejo de aumentar essa alocação. Embora existam barreiras estruturais, institucionais e de capacidade que, esses desafios são superáveis. Em suma, não encontramos impedimentos substanciais para a ampliação da alocação de recursos em prol da agenda de sustentabilidade”, destacou a pesquisadora.

Diante desse cenário, Jean-Christophe Hamery, diretor-presidente da Caixa Vida e Previdência, salientou que a empresa está fortalecendo sua estratégia de investimentos sustentáveis, com produtos como os títulos verdes, instrumentos que direcionam recursos para projetos de impacto ambiental positivo e reforçam a responsabilidade na gestão dos ativos previdenciários.

Para ele, a indústria precisa estar próxima da cosntrução da taxonomia sustentável brasileira, pois essa padronização será essencial para orientar investimentos, evitar ambiguidades e dar transparência ao mercado.

Assim como avançar na rotulagem de fundos, permitindo que participantes de previdência compreendam de forma simples e objetiva o nível de aderência socioambiental de cada produto. Pois os rótulos claros aumentam a confiança, facilitam comparações e fortalecem práticas responsáveis no setor.

Para ele, para a agenda sustentável avançar é preciso de educação financeira, especialmente no segmento previdenciário, onde decisões têm horizonte de décadas. Capacitar participantes para entender risco, retorno, sustentabilidade e impacto se faz tão importante quanto aperfeiçoar produtos e regulações.

 

 

 


É preciso aguardar próximos passos

Atualmente, no mundo, existem várias taxonomias que estão sendo elaboradas por diferentes países e/ou blocos econômicos, como a China, Singapura e a União Europeia, aponta Tarin Frota Mont`Alverne, professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenadora do Grupo de Estudos em Direito e Assuntos Internacionais (Gedai).

O desafio atual, para ela, é harmonizar essas diferentes taxonomias. “Na COP 30, tive a oportunidade de participar e acompanhar a reunião liderada por Cristina Reis, do Ministério da Fazenda, que teve como pauta a discussão do Plano para Acelerar Soluções para a Iniciativa "Super Taxonomia”", relata.

Ela lembra, que, na verdade, desde a COP 29, o Brasil faz parte de duas iniciativas para promover a interoperabilidade e a comparabilidade de taxonomias de finanças sustentáveis, o Roteiro da Taxonomia (Taxonomy Roadmap) e a Taxonomia Comum Multijurisdicional.

Durante a COP 30, várias reuniões aconteceram com a finalidade de avançar nessas pautas, sobretudo acerca dos princípios para a interoperabilidade da Taxonomia. Isso trará mais segurança jurídica e transparência ao processo de ações voltadas aos investimentos sustentáveis.

“A COP30 evidenciou de forma inequívoca o papel estratégico dos oceanos no enfrentamento das mudanças climáticas. O debate reforçou a necessidade de uma abordagem integrada, capaz de conectar florestas, zonas costeiras e ambiente marinho, como condição essencial para o alcance de metas climáticas concretas e efetivas”, diz.

Nesse contexto, a Conferência marcou avanços relevantes na incorporação da chamada agenda azul às Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). Um dos destaques foi a adesão de 17 países ao Desafio Azul das NDCs (Blue NDC Challenge), iniciativa voltada à inclusão de soluções que articulem o oceano e o clima nos planos nacionais.

PLANO de Ação de Nice para o Oceano trará metas concretas para a conservação marinha(Foto: FCO FONTENELE)
Foto: FCO FONTENELE PLANO de Ação de Nice para o Oceano trará metas concretas para a conservação marinha

Outro marco, segundo ela, foi o lançamento do Plano Conjunto para Acelerar Soluções, que propõe alinhar conservação marinha, energias renováveis oceânicas, produção de alimentos aquáticos, transporte marítimo e turismo.

No âmbito da Parceria Um Oceano (One Ocean Partnership), os signatários assumiram o compromisso de mobilizar US$ 20 bilhões até 2030, com o objetivo de promover paisagens marinhas regenerativas e gerar 20 milhões de empregos azuis, integrando equidade oceânica, resiliência climática e prosperidade econômica.

“Diante desse cenário, e considerando que a taxonomia se propõe a ser um sistema unificado de classificação para orientar investimentos em atividades econômicas sustentáveis, torna-se indispensável avançar também na inclusão das atividades econômicas azuis”, ressalta.

Contudo, ela afirma que ainda é cedo para fazer uma avaliação da implementação deste instrumento, pois estamos na fase inicial. Por isso, precisamos aguardar os próximos passos para sua efetivação.

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