Alguns de vocês já devem conhecer o Bilbo. Nós falamos sobre ele e seus “ossos de passarinho” no começo do ano, brincando um pouco com a altura do titanossauro, gênero dos saurópodes, os dinossauros pescoçudos. Isso porque de “titã” o Bilbo não tem nada. Na verdade, a espécie dele é uma das menores do mundo entre os saurópodes. Na época da apresentação, ainda não conhecíamos essa nova espécie e o que a tornava tão pequena.
Mas tudo se esclarece hoje, 15 de setembro, com a publicação da pesquisa descrevendo a espécie na revista científica Ameghiniana.
Bilbo e outros dois dinossauros foram escavados na
Paleontólogo no Museu Zoologia da Universidade de São Paulo (USP) e autor principal da pesquisa, Bruno Navarro explica que os titanossauros da
Oito e 12 metros podem até parecer uma boa altura, mas basta comparar esses tamanhos com a de um dos maiores dinossauros do mundo: o titanossauro argentino Patagotitan mayorum, que alcançava 36 metros de comprimento. É uma baita diferença, radicalizada pela introdução do Ibirania parva na jogada, com os indivíduos adultos chegando aos cinco a seis metros de comprimento.
Bruno destaca que esse é o primeiro saurópode anão da América do Sul a ser estudado usando a histologia. Significa que os paleontólogos cortaram os ossos do espécime em lâminas e analisaram o crescimento das células ósseas no microscópio. A técnica permite que eles observem as fases de vida do animal, marcadas no tecido ósseo, e concluam qual era a idade dele. Assim, os autores afirmam com certeza: Bilbo era um adulto totalmente crescido, não um infante que poderia esticar mais.
Será, então, que o Bilbo foi o menor titanossauro do mundo? Não é bem assim. Na Romênia, a espécie Magyarosaurus dacus também parava aos seis metros, ficando pescoço a pescoço com o dino brasileiro. Por outro lado, a razão para ambos serem pequenos é diferente, e tem tudo a ver com clima e geografia.
Para entender porque uma espécie é maior ou menor que outras do mesmo gênero, é importante analisar duas coisas: se há um fator genético que propicia essa variação e como era o ambiente em que eles viviam.
No caso do titanossauro nem-tão-titã-assim romeno, todo seu mundo era uma ilha. Por isso, ele acaba entrando no escopo do “nanismo insular”, quando animais grandes evoluem com corpos menores ao serem limitados em um ambiente pequeno. É provável que isso tenha ocorrido com alguns saurópodes da Argentina, também.
Mas o Bilbo e companhia não viviam em um território insular. Na verdade, eles estavam bem dentro do continente, longe demais para serem ilhados por uma possível invasão da água marinha.
Por isso, a equipe liderada por Bruno Navarro analisou a geologia da formação na qual os fósseis foram escavados. Eles identificaram que, naquela época, a região era de várzea com clima predominantemente árido e com períodos de estiagem. A hipótese dos autores, portanto, é que o nanismo da espécie Ibirania parva é uma evolução forçada pelas “condições ambientais estressantes”.
Nós podemos observar adaptações parecidas mesmo em animais atuais. Por exemplo, as onças-pintadas. Enquanto as que vivem no Pantanal são grandes, as que ocupam a Caatinga tendem a ter um porte menor, justamente pelas diferentes condições ambientais. Afinal, se o animal é menor, ele precisa de menos comida e gasta menos energia.
Diferente dos estudiosos de bichos vivos, os paleontólogos precisam juntar quebra-cabeças um pouco mais complexos para inferir como os animais viviam.
Já existem várias evidências indicando um hábito dos saurópodes de andar em grupos, sejam eles com muitos indivíduos, sejam apenas familiares e portanto menores. Também já foram encontrados grandes ninhos de saurópodes, como as colônias de ovos de titanossauro em Uberaba (MG).
No caso de Bilbo e relativos, três indivíduos foram encontrados na mesma formação. Isso não significa que eles viveram ao mesmo tempo, ou que especificamente formavam um grupo. No entanto, diz o paleontólogo Bruno, é uma possibilidade que a espécie em geral também andasse em manadas, já que o hábito parecia estar presente entre outros do mesmo grupo.
Além disso, o pesquisador levanta a hipótese de Bilbo se alimentar de plantas rasteiras. Daí vem a ideia o nome científico.
Ibirania é uma junção de duas palavras: Ibirá, o nome do município onde os espécimes foram encontrados, oriundo do tupi Ybyrá, significando árvore ou madeira; e ania, uma adaptação da palavra grega plania, que significa perambular. Portanto, Bilbo e amigos são os andarilhos das árvores, em procura de alimento. Já parva é um substantivo feminino derivado do latim parvus: pequeno.
E aí, como é saber que o Brasil já foi habitado por pequenos andarilhos das árvores?
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