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O rei a rede e eu: a memória do encontro com Pelé
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Colunista do O POVO, Alan Neto é o mais polêmico jornalista esportivo do Ceará. É comandante-mor do Trem Bala, na rádio O POVO/CBN e na TV Ceará. Aos domingos, sua coluna traz os bastidores da política e variedades.

Alan Neto esportes

O rei a rede e eu: a memória do encontro com Pelé

Tipo Opinião

.JÁ contei essa historia uma vez aqui, mais recentemente para o companheiro Lucas Mota, maior revelação do jornalismo esportivo dos últimos anos, que a transcreveu nas plataformas do nosso jornal. Porém, vem a calhar agora, que Pelé chegou aos 80 anos. Até porque marcou, para sempre, minha vida de jornalista de tantos caminhos e tantas jornadas.

.AFINAL, meu primeiro grande furo, minha primeira foto de capa no jornal O POVO, ao lado de Pelé, repercussão em toda imprensa brasileira na época, primeiro desafio imposto pelo saudoso José Raymundo Costa, meu pai no jornalismo. Enfim, a primeira vez, como no slogan que ficou na história, a gente nunca esquece. O ano era 1970.

.VALE reproduzi-la até onde a memória alcançar. Santos veio jogar aqui. À época era o Savannah, Praça do Ferreira, nosso melhor hotel. Delegação chegaria numa quinta, três dias antes. Pelé, que já era rei, claro, a maior atração. Seu Costa me chamou ao seu gabinete, decretou -"O Santos vem jogar aqui, quero dar manchete de primeira página, amanhã, com o Pelé. Arranque dele o que puder".

.LOGO, eu? Tremi da cabeça aos pés. Seu Costa não ficou aí. Tinha reservado um apartamento para mim e o fotógrafo no hotel. E para chegar ao Pelé? - "Peça ajuda ao mâitre Batista, ele saberá como proceder. Quero essa matéria seja como for". Resolvi levar meu irmão Sérgio Ponte, que já engatinhava na profissão, tanto que andava pra cima e pra baixo com seu gravador tipo miniatura de piano. Sérgio tem sido meu fiel parceiro até os dias de hoje, meu maior amigo também.

. FOSSE lá o que fosse, roguei a Deus para que tudo desse certo. Estava em jogo a minha profissão. Era tudo ou nada. Por sorte, pegamos um apartamento andar abaixo da delegação do Santos, chegamos muitas horas antes. Combinei com o Batista, sempre prestativo, que a entrevista seria feita depois do almoço. Pelé, costumava almoçar e jantar com seus companheiros.

.SEXTA-feira, hora do almoço, Pelé desceu por último, logo se juntando aos demais jogadores. Ficamos numa mesa distante, bem separada. Terminada a sobremesa o Batista daria o sinal para irmos. Já havia, antes, conversado com Pelé, que concordou sem botar a menor objeção. Tinha chegado nossa vez. Pedi ao Sérgio pra colocar o gravador no ponto e o fotógrafo ficaria ao lado.

.ANTES de me apresentar a Pelé, fui dizendo -"Minha carreira de jornalista só está dependendo de você. Se eu não sair daqui com uma entrevista exclusiva o jornal me dispensa no dia seguinte". Pelo sim, pelo não, Pelé abriu um sorriso, respondendo -"Então, senta aqui ao meu lado, pode ficar à vontade".

.SEM que fizesse a primeira pergunta, ele foi logo dizendo -"Pronto vou lhe dar a manchete do seu jornal. Pode gravar e escrever — A Copa do Mundo de 70 será minha última vestindo a camisa do Brasil. Tem mais — vamos ser tricampeões no México". Nem ousei perguntar o motivo daquela decisão dele até porque podia atrapalhar meus planos, quem sabe ele mudar de ideia ali mesmo mesmo. Fiz algumas perguntas triviais. Queria mesmo era sair dali levando a matéria. Sequer almocei com o Sérgio e o fotógrafo". Foi quando o Batista me alertou - "Vocês vão sair por uma porta secreta, pois a praça do Ferreira está entupida de gente".

.DETALHE. Logo terminei a entrevista Pelé me fez uma cobrança. "A manchete lhe foi dada. Em troca quero uma rede famosa do Ceará que a Rose (mulher dele à época, mãe do Edinho) exigiu, caso contrário ela me mata.

.NA redação do jornal reproduzi a gravação feita pelo Sérgio, sem alterar um trecho sequer. Redigi às pressas a matéria e a levei para Seu Costa. Naquele seu jeito sincero de ser disse — "Foi seu batismo de fogo, está aprovado com louvor". Dia seguinte, num sábado, estava lá na primeira página — Copa de 70 será a última de Pelé na seleção brasileira". Com direito a foto ao lado do rei e o Sérgio ali perto.

.FOI o maior furo da minha carreira ainda iniciante, produto que era do rádio como repórter-amador. Fiquei intrigado. Porque Seu Costa me escolheu, diante de tantos companheiros mais experientes na profissão?". Nunca ele me respondeu, porque nunca lhe perguntei. O que interessava mesmo, a mim e a ele, era que a missão havia sido cumprida.

.DOIS detalhes relevantes. A rede Philomeno, famosa em todo Brasil, fui pessoalmente pedir ao Seu Chico, contando-lhe o fato. E o Sérgio ali ao meu lado. Seu Chico, sempre gentil, me atendeu. Prometi levar a foto para provar a veracidade. A rede só foi entregue na segunda-feira antes do embarque da delegação com o Pelé a caminho do avião. O segurança tentou proibir, mas o driblei. Saí gritando na pista pelo nome do Pelé. Ele se virou eu lhe mostrei a rede. Ele abriu um largo sorriso — "Me livrei de apanhar da Rose".

.PARA concluir. Tempos depois, o Santos veio jogar de novo aqui, ficou no Marina Park. Por coincidência fui tomar café da manhã ali. Ao sair, a porta do elevador se abriu e na minha frente estava o Pelé. Ele então me inquiriu — "Você não é aquele da rede?". Respondi-lhe com outra pergunta — "E você não é aquele do furo do ano?".

.ANTES que esqueça. O fotógrafo era o grande e inesquecível Zé Rosa, sempre paciente, sobretudo me incentivou o tempo todo — "Não fique nervoso. Vai dar tudo certo". E deu.

 


Foto do Alan Neto

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