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Multas podem ser confiscatórias?
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Hugo de Brito Machado Segundo é mestre e doutor em Direito. Membro do Instituto Cearense de Estudos Tributários (ICET) e do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT). Professor da Faculdade de Direito da UFC e do Centro Universitário Christus. Visiting Scholar da Wirtschaftsuniversität, Viena, Áustria.

Multas podem ser confiscatórias?

A justa proporção entre a gravidade do ilícito e a onerosidade da multa é a verdadeira limitação a ser observada na aplicação de penas pecuniárias
Tipo Opinião

A Constituição brasileira determina, de maneira expressa, que tributos não podem ter efeito confiscatório. Trata-se de decorrência do direito de propriedade, e à livre iniciativa.

Um tributo exageradamente elevado seria um instrumento para, por vias tortas, inviabilizar o exercício de tais direitos fundamentais.

Questiona-se, contudo, se tal limitação se aplica, por igual, às multas. Poderiam elas, diversamente dos tributos, ter efeito de confisco?

De um lado, há quem entenda que não. Realmente, por meio de multas também não seria permitido ao Poder Público vedar ao cidadão o direito de propriedade, ou ao exercício de uma atividade econômica, que são fundamentais.

Mas há quem entenda que sim, pois a Constituição, ao proibir o confisco, refere-se apenas a tributos, não a penalidades.

A questão, contudo, não comporta resposta assim tão simplista. Deve ser enfrentada a partir dos fundamentos que levam o Estado a nos cobrar tributos, de um lado, e multas, de outro, que são diferentes.

Em tese, é possível viver sem pagar multas, basta não cometer infrações. Mas não existe essa opção, legalmente, em relação aos tributos.

Tributos são cobrados em função da ocorrência de situações que, em tese, são lícitas. As pessoas têm direito de realizar tais situações, o que não deve ser inviabilizado pelo tributo.

Se há um imposto muito elevado sobre a propriedade de veículos, pode-se dizer que ele viola o direito do cidadão de ser proprietário de um veículo.

Se há um imposto muito elevado sobre a renda, viola-se o direito do cidadão à renda. Se o tributo exagerado é sobre a venda de um imóvel, se diz que ele embaraça o direito de vender imóveis.

No caso das multas, diversamente, a cobrança se dá porque se pratica uma infração. E, ao contrário do tributo, a finalidade da pena é exatamente desestimular, embaraçar, ou dificultar, a prática dessa infração.

Aquele que omite declarações, vende sem nota fiscal, estaciona em local proibido, dirige bêbado ou excede o limite de velocidade não pode reclamar, diante de multas muito altas, que está sendo violado seu direito fundamental de dirigir bêbado, de omitir declarações, de vender sem nota, ou de conduzir à 180 km/h, pois não existe o direito de praticar tais fatos.

Mas daí não se conclua que o Estado possa fixar o valor das multas de maneira arbitrária. Elas, as penalidades, também devem observar limites. Devem ser proporcionais à gravidade do ilícito que visam a punir.

A multa por quem excede a velocidade permitida em 10% não pode ser a mesma aplicável a quem a excede em 60%. A multa sobre o mero atraso em alguns dias no pagamento de um tributo não pode ser a mesma aplicável a quem falsifica documentos e faz uso de “laranjas” para sonegar na esperança de jamais ser apanhado.

A justa proporção entre a gravidade do ilícito e a onerosidade da multa é a verdadeira limitação a ser observada na aplicação de penas pecuniárias.

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