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A origem do uso das redes sociais na busca pelo voto
Reportagem Seriada

A origem do uso das redes sociais na busca pelo voto

A GÊNESE | Nos Estados Unidos, o uso das redes de relacionamento na campanha presidencial de Barack Obama, em 2008, e de Donald Trump, em 2016, definiu as novas formas de se apresentar ao público e atrair eleitorado
Episódio 2

A origem do uso das redes sociais na busca pelo voto

A GÊNESE | Nos Estados Unidos, o uso das redes de relacionamento na campanha presidencial de Barack Obama, em 2008, e de Donald Trump, em 2016, definiu as novas formas de se apresentar ao público e atrair eleitorado
Episódio 2
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Neste ano, o Brasil terá com eleições municipais mais do que atípicas. Pandemia do novo coronavírus, crise econômica, instabilidade política são algumas das principais tensões vivenciadas desde março. As novas regras eleitorais também trazem ingredientes a mais de incerteza, já que as coligações proporcionais foram proibidas e ainda não há perspectiva de que forma isso impactará nas urnas.

Dentro desse contexto, candidatos que almejam os cargos de vereador e prefeito entram na corrida pelo respeito e reconhecimento da população, sendo, há anos, o corpo a corpo um instrumento chave para essa aproximação.

Contudo, o distanciamento social e a impossibilidade do contato físico impuseram à classe política a necessidade de buscar eleitores por meio da ressignificação da comunicação com o público. Dessa maneira, embora não seja um fenômeno novo, a forma, literalmente, mais palpável foi buscar maior espaço e visibilidade nas redes sociais.

A mestre em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Juliana Fratini, autora do livro “Campanhas Políticas nas Redes Sociais: Como Fazer Comunicação Digital”, afirma que esse fenômeno sobre as redes sociais não é novo, mas veio ganhando “protagonismo ao longo do tempo".


O histórico de uso das redes na política estadunidense e europeia, segundo Juliana, serviu de modelagem para campanhas em outros países, como foi o caso do Brasil. “Em 2016, as redes já estão numa fase de amplo uso no Brasil, porém, quem começa a fazer um maior uso são os candidatos outsiders, que não estão na imprensa e que estão mais longe do sistema político que os candidatos no poder”, afirma.

“Hoje, acontece que é indiscutível o digital. Não tem candidato que não perceba essa ferramenta como um importante meio de comunicação. As campanhas, sobretudo nessas circunstâncias de pandemia, passam a ocupar um espaço ainda maior, pois já que não se pode sair para a rua, a campanha será pelo digital”.

A pesquisadora atenta para uma mudança brusca de padrão nas campanhas. Páginas com mais tempo de existência e engajamento acabam por apresentar melhores desempenhos. “Não adianta o candidato construir algo. Isso teria que ter sido construído pelo menos um ano antes para ele ser minimamente conhecido. O que vai determinar o sucesso é o fato da pessoa ser conhecida e saber se relacionar. Do que adianta criar um canal agora? Mesmo com investimentos, não vai ser suficiente para alcançar todo o público” destaca.

Rede social é rede de relacionamento. Não é jornal, não é TV. Por isso que é importante falar, ouvir e responder as pessoas. Foi assim foi que o Obama e o Trump venceram as eleições, por exemplo. Juliana Fratini
” 

O publicitário e sociólogo Fernando Costa corrobora com a ideia de que não adianta uma pessoa que pretende se eleger entrar nas redes sociais pouco antes do pleito e achar que apenas isso será suficiente para o êxito. O trabalho no meio digital deve ser planejado para longo prazo.

“Quem está fora desse universo não existe. Se o cara for querer ter visibilidade como tinha há 20 anos quando saía na coluna do fulano de tal, no jornal, no blog do colunista que colocava seu casamento não terá sucesso. Isso é página virada. Se não estiver potencializado em rede social e com eficiência não sai do lugar. Todos já perceberam a importância das redes sociais”.

Para Juliana Fratini, a Internet mudou não só o olhar sobre a política, como definiu o conceito de “personalismo político”, permitindo a construção de um relacionamento direto entre o candidato e o eleitorado. “O relacionamento do político com o eleitor foi se tornando mais personalista e menos institucional. O foco fica na liderança, na figura da pessoa, não mais no partido. É a pessoa que é importante e o relacionamento entre as partes” avalia.

Combate a fake news e campanhas
de ódio nas redes sociais

Táticas como usar robôs para inflar números, perfis falsos e fake news em massa para destruir reputações marcaram campanhas recentes. O primeiro grande escândalo foi sobre a atuação da empresa inglesa Cambridge Analytica, influenciando resultados na eleição de Donald Trump e na saída do Reino Unido da União Europeia.

O ex-estrategista-chefe do presidente dos Estados Unidos Donald Trump, Stephen Bannon, sai do Tribunal Federal de Manhattan após sua acusação de fraude por alegações de que ele usou dinheiro de seu grupo "We Build The Wall" em despesas pessoais em 20 de agosto de 2020, em Nova York. (Foto de Bryan R. Smith / AFP) (Foto: Bryan R. Smith / AFP)
Foto: Bryan R. Smith / AFP O ex-estrategista-chefe do presidente dos Estados Unidos Donald Trump, Stephen Bannon, sai do Tribunal Federal de Manhattan após sua acusação de fraude por alegações de que ele usou dinheiro de seu grupo "We Build The Wall" em despesas pessoais em 20 de agosto de 2020, em Nova York. (Foto de Bryan R. Smith / AFP)

Um dos fundadores da empresa foi Steve Bannon, ex-estrategista-chefe de campanha e ex-conselheiro de Trump e apoiador de Jair Bolsonaro. A Cambridge foi acusada de fraudar dados sigilosos de várias plataformas. Mark Zuckerberg, criador do Facebook, foi sabatinado no Congresso americano e teve de explicar o vazamento de mais de 87 milhões de dados.

Para Juliana, neste ano, mesmo que não integralmente, a Justiça Eleitoral será capaz de lidar melhor com a disseminação das fake news e utilização de robôs.

“O próprio governo Bolsonaro teme pelas investigações em relação ao gabinete do ódio, então creio que deverá haver uma reduzida. A campanha de difamação vai ocorrer, mas em relação a arquiteturas de comunicação de disparo de mensagens acho que será menor”, acrescenta.

“Em relação à campanha de 2020, acredito que deve ocorrer em menor proporção os bots e fake news, porque a Justiça tem atuado muito forte em relação aos conteúdos que são disponibilizados na Internet. O Facebook e demais redes já vêm adotando medidas. Temos a lei geral de proteção de dados e depois políticas de proteção”, complementa.

Já para a pesquisadora de mídias digitais, a professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Pollyana Ferrari, apesar de serem eleições municipais, o padrão para esse tipo de prática ainda se manterá o mesmo.

Para ela, o pleito deste ano vai ser muito marcado pela desinformação, principalmente por ser curto o tempo de campanha. Além disso, Ferrari menciona que ficou mais barato usar bots pra disseminação de notícias fraudulentas e que esses algoritmos serão usados massivamente por não haver uma regulamentação rígida.

Segundo a professora, o fenômeno das fake news possui relação direta com existência de bolhas ideológicas nas redes sociais. Esses espaços, aponta Pollyana, são movidos apenas pelo compartilhamento das mesmas ideias e crenças, o que facilita a reprodução de conteúdos falsos.

“No seu feed tudo que você comenta e curte o algoritmo começa a oferecer mais daquele conteúdo e isso é viciante, você vai ficando preso dentro dessa bolha. Começa a só ver pares e coisa iguais a você. Se você é vegano e chega uma informação sobre mortes de animais que é fake você não vai checar, porque você tem horror a comer carne, então você vai disseminar sem checar”, finaliza.

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