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Tinha uma mudança no meio da corrida
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Redatora de Capa e Farol do O POVO. Quadrinista e jornalista entusiasta de temas relacionados à saúde e bem-estar. Uma ex-sedentária em busca de se manter em movimento

Tinha uma mudança no meio da corrida

A corrida ou mesmo a caminhada podem ser aliadas na mudança de hábitos. E de casa.
Tipo Crônica
A biomédica Sandriely Rocha, 24, corre para ajudar com a ansiedade (Foto: Arquivo Pessoal)
Foto: Arquivo Pessoal A biomédica Sandriely Rocha, 24, corre para ajudar com a ansiedade

Você já fez uma mudança de casa? Se não, eu desaconselho fortemente. Adie o quanto conseguir, fique aí na sua residência, conserte o que for preciso e permaneça. Eu me mudei. Faz uma semana que troquei amplos 210 metros quadrados pelo completo e absurdo caos de caixas amontoadas em uma casa quase apartamento. Começo falando da mudança, porque lá estava eu na missão de resumir 10 anos de vida em malas e sacolas, quando recebi o convite: “Dom, quer correr uma prova?”.

Talvez me restasse pouca sanidade ou já estou em um ponto da minha jornada antissedentarismo em que pouco importa um cansaço a mais ou a menos, o certo é que eu topei. Mudei de casa em um dia e corri 5 quilômetros no outro.

Falando assim, rapidamente, parece simples. Mas eu não corro. Como toda boa crossfiteira, eu faço cara feia quando o treino do dia tem escrito “run”. O passado recente me dá alguns elementos para tentar justificar: sedentária e com 36 quilos a mais do que carrego hoje, me faltava fôlego na mesma proporção que me castigavam os pés.

O educador físico Eduardo Parente, que é sócio fundador da Limiar Consultoria Esportiva, pontua que, como qualquer atividade física, o mais importante é você se permitir começar. “A primeira dica, sem dúvida, é você realmente levantar da cadeira e começar, porque os benefícios de qualquer atividade física só funcionam se você tiver regularidade na prática”, explica.

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E, sim, a corrida é “uma excelente atividade para tirar você do sedentarismo”. Mas há ressalvas. “Não é interessante que uma pessoa com sobrepeso, com obesidade, comece a correr. É muito agressivo, e isso pode ocasionar outros problemas. Você tem que passar antes por um processo de adaptação à prática, uma metodologia de você entrar com a caminhada, que tem muito menos impacto do que a corrida, e aos poucos intercalando até você colher os benefícios da corrida, que muitas vezes está ligado à melhora cardiovascular e à redução do peso corporal”, comenta.

Mais leve e com alguma resistência, fiz minha primeira prova de 5 km no início de maio. Para essa, me preparei um pouquinho: parei de pular as corridas no cross, fiz mais cardio na semana anterior, comi carboidrato na última refeição de sábado e me hidratei. Corri uns 2,5 km, andei e trotei no restante do percurso. Concluí em lágrimas, pensando que a Domitila de um ano antes nem imaginaria terminar tal façanha.

Para a corrida pós-mudança, a preparação foi um escalda-pés depois de 14h seguidas em pé e a hidratação foi engolir o choro depois que o Botafogo foi eliminado do Mundial de Clubes. Acordei 4 horas da manhã, passei pelas cinco fases do luto em 10 minutos, até me levantar. Era noite ainda, o bar na Domingos Olímpio ainda tocava um reggae gostosinho, uma moça de vestido de paetê azul ainda estava chegando em casa da festa, e lá estava eu: sem café (porque o fogão ainda não tinha sido instalado) e com minhas 3 horas de sono.

Corrida das Estações 2025 - Etapa Inverno
Corrida das Estações 2025 - Etapa Inverno Crédito: Bruno Moura/Fotto

Mas aí eu corri. Mantive meu ritmo, me concentrei na batida cadenciada da BaianaSystem nos fones de ouvido, olhei para orla com o sol nascendo de mansinho, e negociei comigo mesmo a cada quilômetro: “Pronto, completei mais um sem parar, no próximo eu paro um pouquinho”. Só parei na linha de chegada.

Na espera para receber a medalha, quando uma garoa fina resfriou a pele, encontrei a biomédica Sandriely Rocha, 24. Ela corre há 1 ano e completou os mesmos 5km que eu, mas em bem menos tempo. Sandry conta que foi a primeira prova dela depois de três meses sem correr. “Não conseguia sair da cama direito por conta da ansiedade. E aí, voltei pro que me tirou da cama uma vez, que foi a corrida. Eu disse pra mim mesma que meu coração só ia acelerar se fosse de cansaço depois de uma corrida”, me confidenciou.

Não fui mordida (ainda) pelo bichinho da corrida, mas entendi o que a Sandry me contou, porque correr (ou mesmo andar, como foi para mim muitas vezes) faz fluir. É um respiro que enche o peito de ar e esvazia a cabeça. A corrida tem esse poder de te dar perspectiva, mostrar saídas. Corri 5 km depois de uma mudança e voltei para a casa achando que vencer a maratona de caixas estava muito mais ao meu alcance.

Leia trechos da entrevista com o educador físico Eduardo Parente

Eduardo Parente é educador físico e sócio fundador da Limiar Consultoria Esportiva
Eduardo Parente é educador físico e sócio fundador da Limiar Consultoria Esportiva Crédito: Arquivo Pessoal

O POVO - Quais as principais dificuldades que quem está iniciando nas corridas enfrenta?

Eduardo Parente - Uma situação muito comum é as pessoas acharem que não conseguem correr, elas não se permitirem fazer. Então, a gente sempre encontra muito, depois que as pessoas iniciam, falando isso: "Eu nunca tentei correr porque eu achava que era impossível". Na verdade, achar que não consegue já é uma grande barreira. O segundo momento é que as pessoas também acham que a corrida só é corrida se ela for flutuando, se ela for rápida, se ela for parecida com o que as pessoas postam. E, na verdade, a corrida é muito mais que isso. A corrida não existe só para as pessoas que são rápidas. A gente precisa quebrar muito esse tabu. Um outro problema é a localização. Muita gente acha que não tem lugar perto para correr ou não é seguro para correr. E está muito enganado porque a corrida pode ser feita em qualquer local que tenha o mínimo: uma praça, uma esteira, uma orla. Então, dá pra ser feita em qualquer local. E, por último, mas não menos importante, uma grande dificuldade que as pessoas não enfrentam ao começar a correr é exatamente a falta da orientação, porque, muitas vezes elas começam de um jeito muito abrupto ou muito empírico e aquilo ali vai ocasionar algumas lesões, fazendo com que ela não consiga manter a regularidade e, por sua vez, colher os benefícios que o exercício promove.

OP - Quais as dicas para superar essas dificuldades?

Eduardo - Em relação à localização, que é uma das dificuldades, as pessoas devem se permitir iniciar a atividade. Então, no momento que ela sai da casa dela e ela se propõe a fazer algum tipo de exercício, principalmente falando da corrida, já é muito interessante. E a dica que a gente dá sempre é convidar alguém para fazer a caminhada, a corrida, com você. Então, sempre em grupo é melhor do que sozinha.

Outra dica é sobre orientação. Para você começar a fazer a corrida, não é obrigatório 100% você ter uma orientação no profissional. Até porque, antropologicamente, a corrida está inserida no ser humano. Só que ele não sabe a metodologia que o educador físico sabe prescrever da forma mais correta, mais assertiva e que vai gerar menos lesões. Então, a gente precisa muito de uma orientação. Se a pessoa puder ter essa orientação desde o início, seria o ideal. Se ela não puder ter desde o início, ela pode começar a fazer caminhadas na praça e depois intercalar com momentos de corrida. Mas não existe uma fórmula para todo mundo que a pessoa fale que tem que fazer tantos minutos correndo, tantos minutos andando. É legal que ela comece sempre fazendo muito caminhada, depois ela intercale com pequenos momentos de 30 segundos, de um minuto de corrida, e, realmente, se ela se sentir bem ir evoluindo, que ela procure a orientação de um profissional, porque aí a gente vai guiar essa pessoa.

Em relação à ocupação de espaços, a gente fala muito sobre você ocupar os espaços para que outras pessoas também comecem a ocupar, fazendo a prática regular de exercício naquela praça que, muitas vezes, não era tão segura, mas, quanto mais gente praticar corrida, caminhada, quanto mais gente participar disso, e ocupar esses espaços, e a própria prefeitura tende a utilizar aquele espaço e melhorar aquele espaço.

OP - A corrida pode ser o primeiro passo para quem está sedentário e quer começar a fazer alguma atividade?

Eduardo - Sim, a corrida é uma excelente atividade para tirar você do sedentarismo. A grande ressalva está na metodologia que vai ser aplicada para você começar a correr. Não é interessante que uma pessoa com sobrepeso, com obesidade, comece a correr, é muito agressivo, e isso pode ocasionar outros problemas. Quando a gente fala que sim, a corrida é interessante para tirar você do sedentarismo, é, mas você tem que passar antes por um processo de adaptação à prática, que aí seria exatamente uma metodologia de entrar com a caminhada, que tem muito menos impacto do que a corrida, e, aos poucos, intercalando até você colher os benefícios da corrida, que muitas vezes está ligado à melhora cardiovascular e redução do peso corporal.

Então, é interessante que a pessoa que queira começar a fazer exercício físico, queira começar a fazer a corrida, que ela siga uma orientação para também não arranjar mais um problema. Ee você está em busca de sair do sedentarismo, faça a caminhada com a corrida intercalada, principalmente sob a orientação de um profissional. Se puder também adequar a orientação de um nutricionista, sempre é muito bem-vinda, porque você consegue otimizar mais rapidamente esse resultado.

OP - O que é necessário para começar?

Eduardo - O mais importante é você se permitir começar. Primeira dica, sem dúvida, é você realmente levantar da cadeira e começar, porque os benefícios de qualquer atividade física só funcionam se você tiver regularidade na prática. Então, existe muito uma divisão de responsabilidades do treinador com o aluno. Não adianta o treinador prescrever se o aluno não participa. Não adianta você querer emagrecer se você não vai fazer a prática. Então, de fato, antes de qualquer coisa é você se permitir.

Pegue o tênis que você tem em casa, pegue a roupa que você tem, o horário que você tem, o local que você tem e comece a fazer uma caminhada. 30 minutos de caminhada, por exemplo, já vai fazer um excelente benefício naquele momento naquele dia. Depois, você vai aumentando semanalmente dia sim, dia não, dia sim, dia não, você pode estar realizando essas caminhadas de 30 a 40 minutos. Depois, para você se sentir melhor, é importante que você utilize um tênis mais adequado. Mas o tênis que você tem, acredite, ele já funciona. Basta você aos poucos ir investindo nisso, que é muito importante. Eu estou falando para pessoas sedentárias que normalmente já tem essa dificuldade. Se a gente coloca para a pessoa comprar logo um tênis, é mais um bloqueio. A gente sempre fala "Comece, se permita fazer o exercício". É a primeira dica.

A segunda dica, tente fazer o exercício físico em grupo para você começar bem, para você ter uma outra pessoa para lhe chamar. Terceiro, tente fazer exercício físico se possível de manhã porque você já realiza a atividade e já se vê livre daquela atividade. Ou seja, você priorizou sua saúde. E às vezes quando a gente deixa para a noite fica muito cansado e tem outras coisas que vão aparecer daqui para a noite. De manhãzinha muito cedo, se você puder, é o melhor horário.

E a outra dica é que você não faça atividade física em jejum, o seu corpo não está preparado, então é interessante que você se alimente com a fruta, que se hidrate com um copo d'água, com algum suco, para que você tenha uma performance melhor e não passe mal, não tenha nenhum tipo de intercorrência durante a atividade.

Foto do Domitila Andrade

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