Se hoje as aves dominam os céus é graças aos sacos aéreos, estruturas em formato de bolsa que ajudam os pássaros a reduzir a densidade dos ossos e a respirar melhor. Esses sacos aéreos são uma herança evolutiva dos dinossauros, os ancestrais dos animais alados modernos. Ocorre que não eram apenas os dinossauros avianos que possuíam a estrutura, como não-avianos também, além dos pterossauros, primos alados que não têm nada a ver com aves.
Por muito tempo, os paleontólogos questionaram como essas estruturas surgiram em saurópodes (os dinossauros pescoçudos), em terópodes (carnívoros bípedes) e em pterossauros, um mistério evolutivo difícil de se desvendar por falta de material e de tecnologia.
Agora, pesquisadores brasileiros descobriram parte da explicação analisando os fósseis mais antigos do mundo, encontrados no Rio Grande do Sul. Em artigo científico inédito, publicado nesta sexta-feira, 9 de dezembro, na revista científica Scientific Reports, a resposta que poderia estar em um “simples” ancestral comum se provou bem mais complexa e interessante.
Para responder a origem dos sacos aéreos, a pesquisa liderada pelo paleontólogo
Ao O POVO+, ele explicou que a equipe escolheu três fósseis para análise: os sauropodomorfos Buriolestes e Pampadromaeus, e o
Após estudos anatômicos, morfológicos e uma microtomografia, veio a resposta: nenhum deles tinha saco aéreo. Ou seja, o surgimento dessa estrutura não vem de um ancestral comum, mas de processos diferentes e independentes.
Significa que cada uma dessas famílias de dinossauros e pterossauros tinham alguma informação no código genético, uma “receita dormente”, com potencial para criar um saco aéreo. E por diversas pressões ambientais ― como extremos climáticos ― as bolsas evoluíram nos bichos, cada qual com uma função específica.
No caso dos saurópodes, foi o que os permitiu ficarem gigantescos, capturarem mais oxigênio e perderem mais calor. Para os terópodes, as estruturas também eram úteis para crescerem, mas definitivamente foi o que garantiu que eles, na modernidade, conquistassem os céus.
Já os pterossauros também aproveitaram os sacos aéreos para voar e crescer. Alguns deles tinham ossos tão leves quanto folhas de papel, comparam os paleontólogos Tito Aureliano e Aline Ghilardi, co-autora da pesquisa e professora na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
"É como se fosse um sucateiro", brinca Aline, ao explicar como a evolução é capaz de usar o mesmo design para demandas diferentes. “(Os sacos) podem até ter surgido com a mesma função entre esses animais, mas foram reaproveitados depois." Afinal, se algo funciona bem da maneira como está, para quê desenvolver um produto novo?
"Oie, eu sou a Catalina, repórter do OP+! Te convido a comentar o que achou sobre essa descoberta no fim da matéria. Vamos conversar! :D"
A compreensão das espécies e de como elas habitaram o mundo perpassa muito pela evolução. Enquanto para o universo científico a descoberta de Tito e equipe é uma comemoração paleontológica, para os curiosos e amantes da ciência ela é mais uma demonstração de como a natureza é interessante.
A mesma estrutura surgiu em bichos diferentes, permitindo-os sobreviver às adversidades de diferentes maneiras. Mesmo entendendo isso, ainda existem muitas perguntas a serem respondidas. Quem sabe, a novidade seja a chave para entender como alguns dinossauros dominaram o mundo.
Por exemplo, há milhões de anos o Brasil continuava bem quente. Os sacos aéreos ajudavam os dinossauros a se refrescarem, como se fossem ar-condicionados ambulantes. Mas dinossauros como os Tricerátops não tinham essa estrutura, e nem existiam em terras brasileiras. Será que as bolsas são uma resposta para o aparente insucesso de dinos como eles por aqui?
A pesquisa também serve para mostrar a força do Brasil no campo científico. Não apenas por guardar os fósseis mais antigos do mundo, mas também por demonstrar como a colaboração equitativa entre todas as regiões e pesquisadores brasileiros e a simetria de poder na ciência é a melhor estratégia para inovar. “Com a parceria tivemos trocas muito boas, uma diversidade de cabeças e pensamentos. As grandes ideias saem disso”, comemoram os pesquisadores.
"O que você acha? Que outros enigmas o solo brasileiro ainda nos ajudará a desvendar?"
Reportagens do O POVO exploram o universo dos fósseis do Brasil e do mundo