
Redatora de Capa e Farol do O POVO. Quadrinista e jornalista entusiasta de temas relacionados à saúde e bem-estar. Uma ex-sedentária em busca de se manter em movimento
Redatora de Capa e Farol do O POVO. Quadrinista e jornalista entusiasta de temas relacionados à saúde e bem-estar. Uma ex-sedentária em busca de se manter em movimento
Talvez esta seja minha mais antiga lembrança: não tinha mais que 4 anos, trazia joelhos sujos, vestia um short amarelo, e olhava para trás por cima do ombro, para o sorriso meio preocupado do meu pai, enquanto ele soltava o selim da bicicleta e me deixava pedalar sozinha. Lembro especificamente da euforia de deslizar sobre o calçamento irregular e de querer tirar os pés dos pedais quando a bicicleta, ainda com rodinhas de suporte, ganhou alguma velocidade. Estive longe dessa memória por muito tempo, até reviver a mesma sensação, na semana passada. Não à toa, foi, novamente, sobre duas rodas.
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Sou de Limoeiro do Norte, uma cidade no Vale do Jaguaribe conhecida por ser a terra das bicicletas. Acho que hoje tem mais moto que bike, mas, na minha adolescência, andar de bicicleta ainda era predominante. Era, pra mim, meio de transporte até a escola, principalmente, numa cidade de interior com um trânsito razoavelmente tranquilo. Mas era também um barato. Levava quedas, andava no meio da quadra de vôlei do colégio, carregava as amigas no varão. Lembro de pegar a bicicleta no início da noite e ir andar a esmo, sem rumo pelas ruas largas. Voltava suada e mais leve.
Aí, perdi o costume. Mudei de cidade e a Fortaleza que a Domitila conheceu em 2005 parecia muito hostil para manter o hábito de pedalar. Cobri, como repórter, um sem fim de ampliações das ciclofaixas e ciclovias da Cidade. Flertei muitas vezes com a ideia de comprar uma bicicleta. Ensaio, há anos, pegar uma magrela no Bicicletar e descer até a praia. Nunca fiz. Acho que prezava muito pela recordação feliz e não queria manchá-la com buzina e xingamento. Ou então era só medo de cair e me ralar, não sei.
Mas aí, nestes movimentos que a vida tem me sacudido, surgiu um desafio. O Challenge Fortaleza, o maior circuito de triatlo de longa distância da Europa, aportou na Capital e junto com ele veio a ideia de testar os treinos da modalidade. Nadar e correr já foram experiências vivenciadas e abordadas por aqui. A minha expectativa era, então, de estar, 20 anos depois, de volta para uma paixão antiga.
O reencontro veio em um alvorecer na Sabiaguaba. A Stark Assessoria Esportiva disponibilizou o treinador Heraldo Viana e o apoio de Chaga Júnior, além do equipamento. Por cuidado, na primeira volta que fiz na bicicleta levinha e estreita, o Chaga segurou no selim, enquanto eu testava pedalar. Ele me dizia para olhar para frente e, bem ali, parecia Limoeiro e eu tinha de novo 15 anos. Competi por 2 km com a minha amiga e também colunista do Esportes O POVO, Ana Rute Ramires. Foi o único desafio dos três que venci. Foi uma questão de honra, mas foi também a prova de que tem coisas que são como andar de bicicleta, a gente não esquece.
Chaga Júnior, Domitila Andrade, Ana Rute Ramires e Heraldo Viana
Heraldo, que é triatleta de longa de distância e foi meu guia na bicicleta, me conta sobre os benefícios da prática. “Melhora o condicionamento, fortalece a musculatura (pernas e glúteos, principalmente), e aumenta a resistência. Além de ajudar a reduzir o estresse, melhorar o humor e proporcionar mais disposição na rotina do ciclista”, enumera.
Dedicando 20 horas aos treinos em que percorre até 600 km por semana, o professor de Física e atleta de ciclismo do Bicicletando Team, Felipe Costa, 34, sente esses benefícios na sua rotina, mas conta que vai além.
“No aspecto mental, ele tem um papel ainda mais especial na minha vida. Vivo uma rotina intensa como professor, que exige muito da mente. Na bicicleta eu consigo desopilar 100%. Minha rotina de treinos é bastante intensa e exige disciplina, mas o esporte me ensinou que com foco e prazer naquilo que se faz, o resultado sempre aparece. Cruzar a linha de chegada com a sensação de ter dado o máximo é, sem dúvida, uma das melhores experiências que o esporte pode proporcionar e essa lição vale para qualquer área da vida”, relata.
Hoje, enquanto você lê esse texto, devo estar assistindo à transição da natação para o ciclismo, no Challenge, e querendo, no próximo ano, fazer 90 km de bicicleta em um revezamento. Parece impensável. Mas, há um ano atrás, eu nem poderia imaginar correr 1 km que fosse. E horas antes de escrever esta coluna, completei minha primeira prova de 7 km. Então, acho que não custa nada começar a sonhar.
O POVO - Você acha que o ciclismo pode ser essa prática que leve alguém a aderir a uma atividade física?
Heraldo Viana - Sim, o ciclismo é uma atividade que - além de ter baixo impacto (fisicamente falando), pode ser praticado individualmente ou em grupo (existem vários grupos que organizam passeios, inclusive noturnos). Além de movimentar-se, a pessoa pode fazer novas amizades e conhecer muitos lugares.
OP - Quais as principais dicas para quem está pensando em começar ou está iniciando na bicicleta?
Heraldo - A maioria de nós pôde aprender a andar de bicicleta ainda criança, mas para quem ainda não sabe: adquira um equipamento simples, mas de boa qualidade (exemplo: nesse momento, não precisa de grandes investimentos, mas de segurança), procure uma assessoria, lá, você encontrará profissionais capacitados para te ensinarem em qualquer fase da sua vida.
OP - Quais as dificuldades que você vê nessa prática?
Heraldo - Fora os desafios inerentes ao esporte (desenvolver condicionamento físico e a dirigibilidade do equipamento), como é um esporte que divide o espaço com carros, motos e pedestres no trânsito, é preciso ter muito cuidado nas ruas, com obstáculos, buracos, lombadas, etc.,, mas também com pessoas que ainda não reconhecem o ciclista como parte desse contexto.
OP - Que benefícios físicos e mentais você enxerga na prática?
Heraldo - Melhora do condicionamento, fortalecimento muscular (pernas e glúteos, principalmente), e aumento da resistência. Além de ajudar a reduzir o estresse, melhorar o humor e proporcionar mais disposição na rotina do ciclista.
OP - A Cidade está preparada para quem quer se locomover e praticar a atividade como esporte? Você vê evolução nos últimos anos?
Heraldo - Melhorou muito com a construção de novas ciclovias e ciclofaixas, no entanto, a principal mudança ainda é a mudança de comportamento das pessoas, que precisam respeitar os ciclistas e saber que essas pessoas são pais, mães, filhos e filhas, amigos de alguém, que também têm o direito de circular no trânsito e retornar para suas casas em segurança.
Felipe Costa, atleta do Bicicletando Team
OP - Quais as dificuldades que você vê nessa prática?
Felipe Costa - As principais dificuldades do ciclismo começam pelo fator segurança. É um esporte que envolve riscos, tanto pela convivência no trânsito, com motoristas impacientes, ausência de ciclovias adequadas, estradas mal sinalizadas e com buracos, quanto pelo próprio risco da prática, já que uma queda pode resultar em lesões graves.
Outro ponto importante é a questão financeira. O ciclismo é um esporte de alto custo, que exige manutenção constante da bicicleta, substituição de peças que se desgastam rapidamente, além do investimento em roupas e equipamentos específicos, que também são caros.
Por fim, destaco o desafio de manter constância nos treinos. É uma rotina que exige muitas horas semanais, somadas à preparação prévia de alimentação e hidratação para cada sessão, além da necessidade de sono de qualidade e de uma boa organização alimentar. Ou seja, não se trata apenas de pedalar, mas de alinhar diferentes aspectos do dia a dia em prol de um único objetivo.
OP - A Cidade está preparada para quem quer se locomover e praticar a atividade como esporte? Você vê evolução nos últimos anos?
Felipe - Fortaleza já conta com algumas ciclovias e, de modo geral, o asfalto apresenta boa qualidade. No entanto, ainda precisamos avançar bastante na conscientização dos motoristas em relação aos ciclistas. Infelizmente, são frequentes os relatos de condutores que fecham, perseguem, buzinam de forma excessiva ou até agridem verbalmente quem está pedalando. Muitos ainda enxergam o ciclista como um obstáculo no trânsito, quando, na verdade, queremos apenas praticar com segurança um esporte que amamos.
Por outro lado, é importante reconhecer que houve avanços nos últimos anos. A cidade tem ampliado a malha cicloviária e investido em sinalização, o que demonstra evolução e maior atenção ao tema. Mas para que o ciclismo seja de fato seguro e inclusivo, precisamos seguir expandindo essa infraestrutura e, principalmente, promover campanhas educativas que favoreçam o respeito e a convivência saudável entre motoristas e ciclistas.
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