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Eleições 2024: Entre os números e a verdade
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Colunista de política, Gualter George é editor-executivo do O POVO desde 2007 e comentarista da rádio O POVO/CBN. No O POVO, já foi editor-executivo de Economia e ombudsman. Também foi diretor de Redação do jornal O Dia (Teresina).

Eleições 2024: Entre os números e a verdade

Os cálculos de quem ganhou e quem perdeu nestas eleições no Ceará
Tipo Análise
1310gualter.jpg (Foto: carlus campos)
Foto: carlus campos 1310gualter.jpg

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Há um cálculo enfadonho que gostamos (nós, os jornalistas) de fazer sempre que as urnas se fecham: afinal, quem ganhou e quem perdeu? O primeiro impulso determina que o olhar seja numérico e simples, ou seja, identificar quantas vezes a legenda "x" aparece vinculada ao nome dos eleitos e, a partir daí, numa matemática que evite complexidades subjetivas, concluir se foi bem ou foi mal. Política exige um pouco mais de leitura, em geral, mas comecemos aqui por esta linha do cálculo no esforço de entender os recados do eleitor cearense na votação do dia 6 último.

Sabia-se que o topo do ranking seria disputado pelo PSB (Cid Gomes) e o PT (Camilo Santana). Portanto, não há surpresa no fato de o partido do senador e ex-governador aparecer em cima, com 65 vitórias contabilizadas, muito menos na perseguição a ele da legenda do ministro e ex-governador, que somou 46 campanhas vitoriosas. Os dois juntos, portanto, abraçam 111 prefeituras, ou, aproximadamente, 60% do total de 184 municípios que há no Ceará. Uma mostra de concentração política importante, embora exija alguns mergulhos de análise que determinam sua relativização.

Ainda no esforço de encontrar vitórias e legendas, a performance do PSD pareceu abaixo da expectativa do seu líder Domingos Filho, com 16 prefeituras; o Republicanos ficou na média esperada, com 14; o PP igualmente ao somar 13; os outrora poderosos MDB e PDT se mantiveram numa linha de definhamento com 9 e 5, respectivamente; União Brasil, 5; PSDB (também de um passado glorioso que é cada vez apenas passado) elegeu somente em 2 municípios.; e, fechando a lista, cada qual com um eleito, PRD e PL. Este último vale destacar, com chances boas de ganhar em Fortaleza, o que teria pouco efeito numérico, mas, em compensação, representaria um salto político difícil de calcular. Valendo ainda dizer, sobre isso, que há petistas concorrendo, com chances reais em ambos os casos, no segundo turno da própria Fortaleza e de Caucaia, o que também alteraria pouco a estrutura geral de ocupação partidária das prefeituras.

A quem interessa de verdade o mapa político montado é ao governo do Ceará e à sua articulação política, que precisará lidar com os resultados, e seus efeitos, no cotidiano que virá depois das urnas. Nesse sentido, o responsável diretamente pela tarefa, Artur Bruno, disse à coluna que o governador está muito satisfeito com o resultado ao olhar para os 182 municípios com disputa já concluída, pela constatação de que onde havia candidatos de relação mais complicada com o Abolição apenas em 11 os eleitos estão neste grupo. Ou seja, identificados como sendo da base de apoio chegam a 171. "É verdade que tivemos as derrotas em municípios grandes, como Sobral, Juazeiro do Norte, Iguatu, mas, o governador já deixou isso claro, apoiaremos a totalidade deles, não haverá diferença institucional de tratamento", adiantou, prevendo que a relação com a Assembleia siga sendo a mais tranquila possível.

Esses são os números e essa é a reação oficial. Na verdade real, tudo precisa de um olhar analítico para que se perceba o que há por trás e que nem sempre aparece à mostra, sem contar o esforço que muitas vezes se faz para garantir que a versão prevaleça sobre o fato. Os números mostram um Cid fortalecido, apontam Camilo reafirmado na condição de principal líder político atual do Ceará, mas, numa perspectiva do futuro, indicam uma oposição pela direita extrema assumindo um novo papel, em especial se sair vencedora da briga em Fortaleza. Mesmo que isso não aconteça, porém, há um campo novo delimitado e que tende a criar problemas para as forças de esquerda que exigem soluções novas que elas não têm sido capazes de oferecer. Terão dois anos para criá-las e, por enquanto, resta dizer (meio que torcendo) que o cenário é positivo.

Na terra dos factoides

Houvesse uma disputa para escolher o município que mais acumulou fatos inusitados na campanha de 2024, Iguatu certamente sairia ganhador com alguma folga. Além do folclórico Augusto Correia Lima (Mobiliza) que disputava a prefeitura e fez a festa das redes sociais durante o período, houve aquela situação do candidato a vereador Eliomar Cardoso (PT) que simulou o próprio sequestro para se dizer alvo das facções criminosas e assim ganhar a massa. Deu tudo errado. No dia da eleição, como espécie de cereja no bolo, uma batida da Polícia Federal nos cemitérios locais recuperou R$ 200 mil que um postulante à Câmara havia guardado num túmulo estratégico para, em dado momento, distribuir com os eleitores, comprar votos no português mais claro. Ele segue vivo, mas o dinheiro "morreu" na mão das autoridades, que o recolheram para a investigação necessária sobre sua origem. Não deve ser boa.

Para que exista futuro

Na aparência é simples o cálculo que se fez no PDT para levar seus principais nomes a gravitarem entre a neutralidade e o apoio a André Fernandes (PL) no segundo turno da eleição de Fortaleza: concluiu-se que o pior dos mundos seria fortalecer o PT e Camilo Santana. Ou seja, já foi uma decisão tomada com base no futuro, mesmo sabendo-se que haverá um desgaste a administrar com a opção por um candidato bolsonarista, identificado como de extrema-direita e que em toda sua trajetória política, até hoje, não conseguiu produzir um só elogio à gestão do partido que tenta substituir. Como são pessoas experientes, valendo citar Ciro Gomes, Roberto Cláudio, José Sarto e André Figueiredo, imagina-se que saibam o que estão fazendo.

Lá é lá, cá é cá

Enquanto isso, em Porto Alegre, a pedetista Juliana Brizola, que teve 19,6% dos votos como candidata a prefeitura, numa disputa direta e dura pela vaga no segundo turno contra Maria do Rosário, anunciou apoio à petista. E olha que no caso o adversário Sebastião Melo (MDB) nem é um bolsonarista raiz, apenas pegou carona na onda e conseguiu o apoio do ex-presidente diante da falta de opção local para ter um palanque próprio. Interessante, ainda, é que a direção municipal havia decidido pela neutralidade, mas uma intervenção da nacional levou à mudança de postura na capital gaúcha. O presidente da executiva nacional, lembre-se, é hoje o cearense André Figueiredo, que abraçou a neutralidade no cenário fortalezense.

Depois das urnas, briga

Há muito "segundo turno" projetado pelo interior do Ceará diante da disposição de candidatos derrotados de levarem a disputa, agora, para o campo da justiça. É o que já anuncia Tomaz Figueiredo (MDB), adiantando que sua equipe coletou um conjunto de provas contundentes de irregularidades praticadas pela campanha do vencedor em Santa Quitéria, José Braga Barroso, o Braguinha (PSB), e que vai apresentá-las às autoridades para exigir providências. Ou seja, instabilidade política à vista, o que não chega a ser uma novidade no caso.

Uma lacuna preenchida

Combinemos que soa esquisito uma campanha do PT em Fortaleza anunciar com tanto estardalhaço a entrada em cena, como apoiadora de Evandro Leitão, da ex-prefeita e atualmente deputada federal Luizianne Lins. Mesmo que faça muito sentido, diante das circunstâncias criadas. É um "reforço" importante porque poucas pessoas têm mais cara do partido do que ela, especialmente no âmbito da capital, mas é certo que se cria uma certa confusão na cabeça de quem não sabia exatamente o que estava acontecendo. Assim sendo, explico: Luizianne queria ser a candidata, brigou por isso até o limite e, vencida internamente, calou por completo. Volta a tempo de dar uma ajuda boa e é isso que a articulação petista espera dela.

A opinião segue de pé

Leitor, no seu direito legítimo, cobra do colunista um "erramos" em relação à análise de uma semana atrás que apontava Camilo Santana como um dos vencedores do processo eleitoral de 2024, mesmo não sendo candidato e independente dos resultados. Não parece ser o caso, especialmente porque se trata de uma opinião (que mantenho) cujos fundamentos básicos o quadro final resultante do domingo não contraria, objetivamente falando. O ministro chegou ao dia da eleição fortalecido pelo que aconteceu ao longo do processo e a possibilidade que havia era de sair ainda mais forte, apenas isso. Na forma como vejo as coisas.

Estado (tenso) de espera

Depois dos acontecimentos em Sobral, que teve uma das campanhas mais tensas da história, teme-se na Assembleia a volta aos trabalhos parlamentares de Oscar Rodrigues (União Brasil), que acabou eleito, e de Lia Ferreira Gomes (PDT), expoente do grupo derrotado, para cumprirem o restante do ano legislativo. Os dois protagonizaram uma cena dura, no dia da votação, inclusive com ela acusando-o de agressão física. É quase que impossível que as confusões de lá não se transportem, com os dois presentes, ao ambiente da Casa e não existe muito o que fazer dada a condição de deputado e deputada que ostentam. No caso dele, pelo menos até o final do ano.

 

Foto do Guálter George

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