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Assinantes e cronistas se juntam para celebrar os 4 anos do OP+
Reportagem Seriada

Assinantes e cronistas se juntam para celebrar os 4 anos do OP+

Inspirados em imagens enviadas por assinantes, cronistas do OP+ criaram textos originais em ação para marcar os 4 anos da plataforma de streaming do O POVO
Episódio 2

Assinantes e cronistas se juntam para celebrar os 4 anos do OP+

Inspirados em imagens enviadas por assinantes, cronistas do OP+ criaram textos originais em ação para marcar os 4 anos da plataforma de streaming do O POVO
Episódio 2
Tipo Crônica

 

Um encontro entre assinantes e quem faz O POVO+. Aliás, mais que um encontro, um diálogo. Esta foi a proposta do time de Negócios Digitais e Marketing do OP+ para marcar os 4 anos da plataforma, neste 13 de maio de 2024. A estratégia para construir essa ponte, então, foi convidar leitores assinantes a enviarem imagens que pudessem inspirar texto dos nossos cronistas.

O percurso foi rápido. Em uma semana, chegaram 57 fotos de assinantes dos mais diversos perfis, seja em gênero, idade e origem geográfica. Após uma curadoria das equipes do OP+ e Negócios Digital e MKT, foram selecionadas 4 imagens. Nelas, o olhar e o sentimento de cada um ao registrar elementos da natureza, humanos e urbanos. Um universo particular, mas também coletivo.

Seleção concluída, temos o encontro-diálogo da Luisa Vaz, Abdiel Anselmo, Amália Facundo de Brito e Rosângela Mota respectivamente com os cronistas Demitri Tílio, Marília Lovatel, Henrique Araújo e Tânia Alves. O resultado: muita beleza e lirismo, em forma de missiva, descrição de memória e abstração.

Para a analista de planejamento do OP+, Dandara Batista, há sempre a disposição de se aproximar dos assinantes e buscar “enxergar o mundo pelos olhos de quem nos acompanha e nos consome. Queremos que nossos assinantes se sintam parte do nosso conteúdo, pois afinal, eles sempre nos inspiram, mas nesta ação em específico, isso é levado a um outro nível, bem mais direto”, diz.

Vale a pena conferir e celebrar com a gente. 

 

 

Cartografia das aves comuns

por Demitri Túlio* (texto) e Luísa Vaz (foto)

O olhar de Luisa: Corujas do Parque Rio Branco em seu quintal(Foto: LUISA VAZ)
Foto: LUISA VAZ O olhar de Luisa: Corujas do Parque Rio Branco em seu quintal

Cara Luísa Vaz,

Escrevo estas poucas linhas, talvez uma crônica em forma de missiva clássica, para tentar fazer um manifesto pela persistência da existência dos caurés e outras “aves comuns”. Em particular no Parque Rio Branco, habitat dessa e de outras espécies necessárias ao urbano. E, docemente desconfio, que a área verde também é vosso bioma-quintal e de outros ativistas que insistem na liça pelo sobrante de florestas em Fortaleza.

Caurés, você bem sabe, Luíza, e consultei os diários de campo dos passarinheiros, é um sinônimo para Caboré (Glaucidium brasilianum), caburezinho, caburé-do-sol e caburé-ferrugem.

É uma corujinha carnívora - a menor das espécies de "raptoras" de presas - que reúne em seu derredor inimigos em contra-ataque. Pudera! Ela é uma predadora acurada. Já vi nas passarinhadas por aí cenas fantásticas da peleja natural. Uma luta estrita pela sobrevivência.

Ao perceberem a presença da miúda – é uma ave que não passa dos 16,5 cm - os sanhaços, os bem-te-vis, os sibites, os beija-flores, os sibites-gatinha, os ferreirinhos, os verdelinos, os pitiguaris, os chorós-bois, as rolinhas, as lavadeiras-de-maria se alvoroçarem em pé de guerra numa trincheira avoante para afugentar a ameaça.

Ela pia em assobios de 10 a 60 alarmes, projeta a sombra em quem está abaixo e mira certeira em voos de pouca margem para erros. O caburezinho arranca filhotes aninhados de outros pássaros ou, mesmo, submete os adultos.

Tão implacável que não se intimida com tamanhos maiores de bichos além das aves. As cobras, as iguanas, as rãs, os preás, os soins, os teiús crianças e as ratazanas da Cidade podem entrar no cardápio do café da manhã, do almoço e da merenda desse ser alado rapinante.

O cauré, Luiza, é um considerado um “pássaro comum” que se adaptou para sobreviver ao avassalamento urbano. Não sei se isso foi uma “evolução” da espécie para seguir existindo em florestas cada vez mais extintas e Cidades insustentáveis.

Ela insiste na sobrevida numa Capital de gente e de um poder público que executam árvores, que asfaltam e poluem um Pajeú, que concretam dunas e que entopem o mar de lixo e penicos humano.

O caburé vive, também, na floresta. É a natureza dele. E o chamam de “comum”, talvez, porque mesmo com tanto destroço ambiental ainda faz o favor de existir e controlar pragas e as populações de outros seres no traçado urbano.

Você sabe, Luíza, o quanto é importante persistir um Parque Rio Branco. Essa ilha no meio da quentura da Cidade e desprovida de corredores de sombra. O Parque é seu bioma-quintal e, no compartilho, a morada dos caurés e outros “pássaros comuns” e resistentes ao desequilíbrio ambiental.

O dizer “pássaros comuns” é um equívoco no senso comum de vários ornitólogos e passarinheiros de álbum e figurinha. Imaginem nós sem os caurés, os gaviões-carijós, as casacas-de-couro-da-lama, as jaçanãs, os corujas-de-igreja, os sebinhos-do-mangue, os maçaricos, as garças, as sericoias-três-potes, os carões, os socozinhos?

Imaginem o vão de cantos, de cores, de manifestação de seres vivos (diferentes dos humanos) se faltarem os caurés? Se desviverem as árvores e as criaturas que nela habitam em “condomínios” fabulosos de outros existires?

São superimportantes, para mim, o viver dos caurés e outros seres selvagens na Cidade. Penso que importam para você, também, que se permitiu fotografá-los no imprescindível Parque Rio Branco. Tomara que ele seja reaberto logo. Há saudades e existências a cuidarmos no Parque. Para que não desapareçamos todos...

Faço reverência a seu olhar sempre florestado e passarinhado no urbano.

Abraços

"Demitri Túlio é cronista do O POVO+ e editor-adjunto do núcleo de Audiovisual do O POVO. É também autor de teatro e de literatura infantil, com mais de dez publicações."

 

 

Estação

por Marília Lovatel* (texto) e Abdiel Anselmo (foto)

O olhar de Abdiel: Estação da Parangaba(Foto: ABDIEL ANSELMO)
Foto: ABDIEL ANSELMO O olhar de Abdiel: Estação da Parangaba

Em 1936, nos trilhos da Estação da Parangaba, correu o trem em que minha mãe, então com quatro anos, realizou um sonho. A viagem da menina, acompanhada de um responsável, era a concretização do desejo infantil de ser parte da estrutura de ferro para de dentro apreciar a paisagem retrocedendo à janela.

“A invenção dos trilhos reconfigurou a história do mundo. Desde o início do século XIX, locomotivas e trens possibilitaram que pessoas, objetos e ideias se tocassem, se chocassem e se (des)encontrassem em tempos cada vez mais acelerados.”, escreveu Kênia Sousa Rios na apresentação do livro “O Espaço a Serviço do Tempo”, de Ana Isabel Ribeiro Parente Cortez Reis, publicado pela Editora Imprensa Universitária da UFC, em 2023.

A história de minha mãe no trem é a do espaço a serviço do tempo. Um lugar, um ambiente que é uma época, um momento, promovendo a união da infância aos seus 91 atuais, quando conversamos sobre uma fotografia intitulada “Estação da Parangaba”.

A essa altura da vida, não posso exigir da sua memória os detalhes do que ela viu, se na paisagem brotavam garças brancas, se na distância as aves eram flores no balanço do vento ou se as flores eram, na verdade, aves em leve agitação nas copas das árvores.

O que importa é que, na vertigem de uma velocidade inaugural aos olhos, a mão pequena soltou a mão protetora – ela me conta enquanto olha a imagem. E após segundos de contemplação no silêncio em que se perde, retoma o raciocínio, diz que a segurança da palma adulta logo foi buscada, mas os dedos rejeitaram o contato.

Ela, em novas tentativas, sentiu o escorregadio gesto de desvencilhar que a fez erguer a cabeça para descobrir a razão da reiterada escusa. Do alto olhava para baixo o rosto constrangido de um estranho. Um instante de distração e ela estava sozinha.

Solidão breve, nunca esquecida, embora o desfecho do episódio seja um mistério. Permanece imerso na bruma que afoga as lembranças mais longínquas. Talvez, naquele dia, além dos trilhos, das árvores e das flores esgarçadas que ela pode ter visto do trem, houvesse uma proteção divina, a presença do Espírito Santo. Talvez para salvá-la uma pomba celestial tenha entrado em cena – como na foto – com esvoaçantes asas luminosas.

"Marília Lovatel é cronista do O POVO+ e escritora. É professora de pós-graduação em escrita literária e redatora publicitária."


 

A origem do mundo

por Henrique Araújo* (texto) e Amália Facundo de Brito (foto)

O olhar de Amália: Jeri(Foto: AMALIA CLAUDIA FACUNDO DE BRITO)
Foto: AMALIA CLAUDIA FACUNDO DE BRITO O olhar de Amália: Jeri

Talvez fosse Jeri, não lembro, sei que foi depois da pandemia porque estávamos todos sem máscara e os meninos pareciam pequenos ainda, como rascunhos de si.

Duas figuras recortadas ao fundo, esguias e flutuantes sobre uma pedra, navegadores de uma embarcação que havia pouco tinha aportado trazendo novidades do além-mundo: tecidos, pedras preciosas, histórias de criaturas mágicas e amores curtidos na carne.

Todos pensam que mirava o sol naquele momento, o sol de fim de tarde e sua luz baça que não me comovia em nada, uma luminosidade como se coada ou borrada por um apagador manuseado com displicência.

Mas era pra eles que olhava, era neles que tinha a atenção fixa depois de tudo, como se buscasse emoldurá-los pra sempre por receio de que fossem tragados por duna ou engolfados por onda prestes a se agigantar.

Não queria me virar de costas. Fazia tempo que evitava olhar pra trás. Me punha sempre adiante, à frente de mim mesma, obrigando-me a um exercício de futuro, de modo que pudesse tê-los em meu horizonte.

Eram como uma rosa dos ventos quando tinha precisão de estar presente, fincada no chão para que não me perdesse, espiralada feito fumaça e carregada por essa brisa mais impetuosa que percorre o Ceará de ponta a ponta, força com a qual tive de me acostumar quando cheguei de longe.

Quem sabe fosse quarta ou domingo, e isso também é uma lacuna agora que tento recuperar cada pormenor enquanto espero mais uma visita sua neste apartamento. Estávamos de férias no meio do ano? Éramos felizes?

Por perto tenho certeza de que a natureza silenciara, à exceção do vento que arrasa tudo em volta, açoita e embaralha cartas à mesa, entorta copas de árvores e enovela os vestidos pendurados para secar no varal das casas.

Saídas de banho salgadas, cabelos desgrenhados no meio da tarde, restos de sono esquecidos como mudas de roupa muito gastas pelo uso através dos anos, arquivos de uma memória potencial cujo acesso procuro nessa tarefa de recontar minha própria vida.

Quem eu era então e quem sou agora, mais de 30 anos depois. Quem olhava e quem era olhada, quem se afastava de quem, quem se aproximava de quem. Todas essas referências terrestres se dissolviam em contato com a maresia, e acho que por isso escolhi um barco como cenário para a foto registrada por um estranho, um homem a quem fiz somente dois pedidos.

A jangada de proa para o mar, mas ainda estável na areia; sem vela, disposta ao movimento de fuga, pronta a qualquer cheia das marés numa dessas noites de lua marcadas com caneta nas folhas do calendário, parte de um plano há muito traçado.

Que fosse arrebatada e levada de volta às águas, cruzando sozinha essa massa tempestuosa e desembarcando com outro nome numa geografia estranha, essa era uma possibilidade que me alegrava ao passar pela cabeça, produzindo uma agitação incomum.

Revisitando essa imagem entre tantas espalhadas sobre a cama, apenas hoje entendo que aquele foi o começo de tudo.

"Henrique Araújo é cronista do O POVO+ e jornalista. É doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), com mestrado em Sociologia (UFC) e em Literatura Comparada (UFC)."

 

  

O que vi na foto de 55 anos de casamento de Luzia e Luciano

por Tânia Alves* (texto) e Rosângela Mota (foto)

O olhar de Rosângela: 55 anos de casamento de Luzia e Luciano(Foto: ROSÂNGELA DE MEDEIROS MOTA)
Foto: ROSÂNGELA DE MEDEIROS MOTA O olhar de Rosângela: 55 anos de casamento de Luzia e Luciano

Não conheço Luzia e Luciano, mas senti que na casa deles tem amor, aconchego e perdão. Na foto enviada por Rosângela de Medeiros Mota na comemoração de 55 anos de casados, os dois, com um sorriso nos lábios, olho no olho, mãos entrelaçadas, mantêm a cumplicidade que carregam desde a época que se encontraram lá pelo fim da década de 1960.

Não sei como os dois se encontraram, mas imaginei que a paixão veio de forma serena e certeira. Senti que já escreveram muitas cartas de amor e andaram de mãos dadas com a segurança de seguir na vida com a pessoa certa. Refleti que, na juventude, dançaram de rosto colados nas tertúlias, se esconderam no escurinho do cinema ou aproveitaram os muitos banhos de mar e mergulhos em rios durante o inverno no Ceará. Nunca esqueceram como se deu o primeiro beijo e são capazes de contar essa história nos mínimos detalhes, um completando a palavra do outro. Sei que enfrentaram perrengues, mas acredito que nunca cogitaram deixar de viver juntos.

Luzia aparece na imagem com a alegria que só as mulheres de bom coração são capazes de irradiar. Aos 55 anos de casada com Luciano, ainda se enfeita, arruma o cabelo, coloca maquiagem para sentir a emoção de estar ali pertinho do marido. Também quer estar bonita para si.

Luciano, na foto, tem o olhar de admiração pela mulher que considera sua alma gêmea. É capaz de fazer pequenos gestos ou brincadeiras para deixar a mulher mais feliz. É generoso e, a cada dia que passa, se encanta pelo sorriso da esposa, sabe que o tempo a deixou com marchas, mas a vê cada dia mais bonita.

Intui que os dois juntos agregam familiares e amigos numa casa capaz de ser abrigo. Espero que onde o casal mora tenha mesa farta de café da manhã, com bolo e tapioca; almoços com muitas visitas aos domingos; festas com churrasco compartilhado à beira da piscina ou no quintal da casa e algazarras de crianças correndo pela sala, deixando os brinquedos soltos pelo chão. Lá onde escolheram morar deve ter histórias enfeitando as paredes.

Entendo que a vivência dos dois não é perfeita (pois contos de fadas não existem), sei que carregam saudades de pessoas próximas, enfrentaram momentos de mágoas, mas nada foi capaz de tirar deles a certeza de que escolheram a pessoa certa para compartilhar o mundo. É assim que, distribuindo alegria, celebraram as Bodas de “Prata”, de “Ouro” e, agora, a de “Ametista”. Que a eles seja permitido festejar o amor por muito tempo.

"Tânia Alves é cronista do O POVO+ e editora-chefe de Cidades. Foi ombudsman do O POVO por três mandatos (2015, 2016 e 2017)."

 

 

Um passeio de encher os olhos


A concepção visual das reportagens especiais do OP+ é uma narrativa complementar aos textos, imagens, recursos digitais e toda a gama de linguagens colocados à disposição do leitor. Confira uma seleção de capas (a imagem que inicia o conteúdo) do acervo produzido ao longo desses quatro anos pelos designers Camila Pontes, Cristiane Frota, Isaac Bernardo e Jansen Lucas.

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O POVO+ 4 anos

No aniversário de 4 anos do O POVO+, reportagem traz análise de de quem faz e pesquisa a plataforma e crônicas inspiradas em imagens enviadas por assinantes