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‘Carta de Hiroshima’ contra agrotóxicos quer sensibilizar Elmano
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Editora-adjunta do O POVO+ especializada em ciência, meio ambiente e clima. Formada em Comunicação Social - Jornalismo pela Universidade Federal do Ceará (UFC), é premiada a nível regional e nacional com reportagens sobre ciência e meio ambiente. Também já foi finalista do Prêmio Einstein +Admirados da Imprensa de Saúde, Ciência e Bem-Estar na região Nordeste

Catalina Leite meio ambiente

‘Carta de Hiroshima’ contra agrotóxicos quer sensibilizar Elmano

Organizações comunitárias do Vale do Jaguaribe e do Nordeste exigem revogação do uso de drones para pulverização de agrotóxicos. Elas denunciam contaminação por veneno
Tipo Notícia
Campanha Revoga Já está em frente ao Palácio da Abolição e tenta entregar carta ao governador Elmano de Freitas (Foto: Dávilla Morais / TdH Brasil)
Foto: Dávilla Morais / TdH Brasil Campanha Revoga Já está em frente ao Palácio da Abolição e tenta entregar carta ao governador Elmano de Freitas

O governador Elmano de Freitas (PT) ainda tem muito o que explicar para as famílias afetadas pela pulverização de agrotóxicos no Ceará: hoje, elas foram diretamente ao Palácio da Abolição para entregar a ele a Carta de Hiroshima. O clima até o momento é de tensão com a polícia.

Em alusão à bomba que dizimou famílias japonesas no fim da Segunda Guerra Mundial, a carta traz uma imagem dura do efeito dos agrotóxicos nas pessoas. Por mais que o mercado tente suavizar com o termo “defensivos agrícolas”, a verdade é que estamos falando de veneno.

“Hiroshima foi destruída por uma bomba em segundos, mas no Ceará é uma explosão silenciosa, aos poucos”, narra Pedro Levy Ramos, 22, integrante da Rede Reaver. “A gente queria mostrar que também é muito perverso o que acontece aqui”, complementa Aline Maia, integrante da Cáritas de Limoeiro do Norte.

A ação tem motivo para ocorrer em outubro, mês de conscientização sobre o câncer de mama: o uso de agrotóxicos está relacionado ao aumento de casos de câncer, e há evidências de veneno no leite materno. Além dos seres humanos, o uso de pesticidas contamina água, solo, ar e outros seres vivos.

Nesse ínterim, a Comissão de Mulheres e Crianças Envenenadas por Agrotóxicos encara o governador, com histórico de luta ao lado do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) contra a pulverização aérea de agrotóxicos do Brasil, e pede ao menos a escuta. Diz a Carta de Hiroshima:

"Estamos aqui, governador, para dizer que o mesmo sangue que se transforma em leite pelo milagre da biologia, e com o qual amamentamos nossas crianças, nessas mesmas veias, através de nossos peitos, circula também o veneno dos agrotóxicos."

Campanha Revoga Já está em frente ao Palácio da Abolição e tenta entregar carta ao governador Elmano de Freitas(Foto: Dávilla Morais / TdH)
Foto: Dávilla Morais / TdH Campanha Revoga Já está em frente ao Palácio da Abolição e tenta entregar carta ao governador Elmano de Freitas

“Nós que estamos aqui sabemos o quanto é duro enfrentar a chuva de veneno”, comenta Aline, rememorando os casos de despejo de agrotóxicos em uma casa no Vale do Jaguaribe. Em 19 de agosto, o composto químico Terbufós — usado para controle de vermes, besouros e outras pragas agrícolas — foi jogado em áreas comuns e em uma residência do município de Quixeré (CE).

Além do medo geral provocado pela concretização de uma denúncia — as comunidades e políticos, como o deputado estadual Renato Roseno (Psol), alertavam que a liberação de pulverização de agrotóxicos por drones possibilitaria o uso dos pesticidas como armas químicas —, o episódio reforçou a “indignação e revolta” da aprovação da lei.

“Nós vamos lutar até o fim para que essa lei caia, para as comunidades voltarem a ser protegidas pela Lei Zé Maria do Tomé”, determina Aline.

O pedido de revogação da lei, impulsionado também pela Rede Reaver e pelo Instituto Terre des Hommes Brasil, vem dos perigos dos agrotóxicos para a saúde das comunidades rurais e urbanas. Os grupos denunciam que rastros de veneno já foram encontrados na urina e no sangue das crianças.

Também há impacto na renda das comunidades, em decorrência da morte das abelhas na região. Nelas, foram encontrados seis princípios ativos de venenos, prejudicando o trabalho de apicultores e o equilíbrio ambiental de toda a região.

“O que a juventude espera são medidas concretas: controle e proibição de agrotóxicos por vias aéreas”, diz Pedro Levy, da Rede Reaver. “A juventude quer atitudes firmes, não só promessas. Fiscalização e estímulo à agroecologia. Somos a geração que vai herdar as consequências!”

Elmano deveria retornar às raízes

Não duvido que o jogo político é duro e exige dos bons uma dose de transigência. Infelizmente, sempre é preciso ceder para viabilizar planos e projetos. No entanto, acho que o governador Elmano de Freitas (PT) tem traído a própria história durante a sua gestão, pelo menos no que tange o meio ambiente.

Governador Elmano de Freitas, do PT(Foto: DANIEL GALBER/ESPECIAL PARA O POVO)
Foto: DANIEL GALBER/ESPECIAL PARA O POVO Governador Elmano de Freitas, do PT

Ele estava lá na criação da Lei Estadual Nº 16.820/19, conhecida como Lei Zé Maria do Tomé. A autoria era do deputado estadual Renato Roseno (Psol), subscrita pelos então deputados Elmano de Freitas (PT) e Joaquim Noronha (PRP).

Com isso, o Ceará virou o primeiro estado do País a adotar uma legislação do tipo pensando justamente na saúde pública e na proteção ambiental. Eu me pergunto se Elmano coloca a cabeça no travesseiro e pensa nisso.

Como o advogado que lutou pelas comunidades rurais, e por consequência pela natureza, hoje defende a obra da Aerotrópolis, que desmatou 46 hectares da Floresta do Aeroporto? Os valores de bem-estar social e equilíbrio ecológico são tão fáceis assim de ser vendidos?

As comunidades do Vale do Jaguaribe perguntam-se o mesmo. O que elas querem é encontrar, por detrás da figura do governador, o advogado de 23 anos atrás. Talvez ele saiba dar a atenção concreta e compreensiva ao problema.

Foto do Catalina Leite

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