
Um mundo sem cores, sem formas, e às vezes, apenas com vultos ou escuro. Os sentidos se aguçam e é importante confiar no olfato, no equilíbrio, nas texturas, nos sons e na ajuda de terceiros.
No caso específico de Arthur Sendas, fundador da startup See U App, o que o acometeu de nascença foi uma
A deficiência visual severa, porém, o fez enxergar além. Mais no sentido de ver o mundo de outra maneira. A partir de si, a criatividade se aflorou e Arthur transformou a necessidade em auxílio.
Com o uso de tecnologias, como ecolocalização (pelo som), realidade virtual e Inteligência Artificial, o empresário tentou 'dar cor' ao entorno de quem tem o mesmo que ele ou é até cego.
Natural de Arapiraca, Alagoas, Arthur diz que tinha dificuldade em lidar com tarefas simples, como enviar um currículo ou ações semelhantes.
Do modelo vivido no dia a dia nasceu a See U App, aplicativo que possui muitas frentes de atuação, auxiliando em aspectos da saúde, educação, trabalho e diversão.
O foco é em acessibilidade para dar autonomia a esse público, quase “como a armadura do homem de ferro”, conforme ele mesmo descreve.
Na faculdade foi quando todo o processo engrenou e chegou a criar um jogo com pessoas cegas. O projeto foi iniciado em 2022 com dois amigos, depois que ele mexeu no vespeiro da inovação para esse nicho. Quando um de seus sócios faleceu em outubro de 2023, enquanto a startup estava sendo lançada, pensaram em desistir, mas foi por ele que decidiram continuar.
Mas o roteiro inesperado aconteceu. Arthur passou por outro chacoalhão da vida: o prognóstico de seis meses de vida e um coma. Ao acordar, a ideia era abrir mão de tudo.
Porém, o áudio de uma mãe que achava que o filho cego não ia ser nada, mas que pela See U estudou para o vestibular, foi outra virada de chave.
Hoje, aos 36 anos, ele busca solucionar um dos maiores desafios da recém criada startup, "monetizar sem machucar as pessoas". Atualmente, as startups ocupam uma grande parcela do mercado econômico brasileiro, com mais de 20 mil estão ativas no País, em vários segmentos.
Essas empresas continuam crescendo, segundo dados do Observatório Sebrae Startups, do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae): pelo menos 408 surgiram no último ano no Brasil.
Com o movimento dessas organizações, o Nordeste ocupa papel importante. A região conta com mais de 5 mil empresas do tipo ativas, representando quase um quarto do setor brasileiro. Dentro dos novos empreendimentos que surgiram neste ano, 112 foram nordestinas.
O Nordeste é a segunda região com mais empresas, seguido de Sul (4.301), Centro-Oeste (2.056) e Norte (1.889). Sudeste ocupa a primeira posição, com 7.481 startups.

OP - Como surgiu a ideia do See U, e qual problemática vocês queriam solucionar com o surgimento da startup?
Arthur Sendas - Eu sou deficiente visual severo, eu tenho acromatopsia, que é a ausência total de cores. Então eu não vejo nenhuma cor desde que nasci. E, devido a isso, ocasionou mais alguns problemas.
Como eu não vejo cores, eu não consigo enxergar a profundidade, então, por exemplo, eu não vejo um buraco. Eu tenho que chegar muito próximo de uma árvore para saber qual é a fruta que ela dá, porque se eu vir de alguns metros de distância, eu não vejo nada, eu só vejo um cinza.
Tudo que eu sei (de cores) é decorando, ou que as outras pessoas falaram. Devido a isso também, eu tive vários problemas como enxaqueca. Muitos anos da minha vida eu tive enxaquecas fortes por conta do meu problema.
Quando eu ficava com crise mesmo, eu passava três dias direto sem conseguir enxergar, porque a enxaqueca potencializa isso. Então, já tinha uma visão diminuída e, quando eu tinha essas crises, eu ficava sem enxergar completamente e, aí, eu ficava por um período completamente cego.
A ideia começou a surgir daí mesmo, porque eu ficava pensando, pensando, o que eu vou fazer? Como é que eu vou me ajudar? Nunca foi uma empresa, sempre foi o que eu ia fazer para resolver o problema que eu tinha.
Depois de um tempo, chegou a Jaqueline (Ferreira de Araújo, mas hoje senhora Sendas), uma das minhas sócias. Os avós dela desenvolveram cegueira devido à diabete. Então eles ficaram cegos e ela, desde criança, foi a guia deles, literalmente para todos os lugares.
Eu a conheci posteriormente e eu me lembro de uma das reuniões das ONGs que a gente participava junto, que eu dizendo que eu tava com problema para enviar um currículo, que devido ao meu problema eu tinha vários outros fatores que acabavam atrapalhando minha vida.
E ela disse: "Ó, eu faço esse tipo de coisa para os meus avós. Eu posso fazer para você, se você tiver confiança." Então, um dia eu disse: "Tá certo, preciso de ajuda". Decorei o telefone dela, e ela entrou no computador e fez tudo que precisava para mim.
Naquele dia, realmente foi de onde surgiu a ideia da See U. A gente precisa de alguma coisa que faça exatamente o que você faz, só que seja um assistente virtual, que seja como a armadura do Homem de Ferro.
OP - Já se apaixonou pela Jaqueline assim que ela o ajudou?
Arthur Sendas - Na verdade, foi um processo, não foi logo. A gente se apaixonou depois de uns anos nesse processo dela me ajudando. Nem eu tinha interesse, nem ela também.
Aí depois foi surgindo interesse e o carinho que foi surgindo conforme ela ia me ajudando, e o cuidado que ela tinha por mim. A gente foi trabalhando junto e começou a desenvolver as coisas juntos, fazendo as coisas juntos.
A proximidade, também da startup, do trabalho, juntou tudo e a gente acabou se apaixonando e foi namorando, depois noivamos, depois casamos. Hoje nós temos um filho (Adam) e vamos ter o segundo (Dante) agora em dezembro. Então é uma parceria literalmente para a vida.
O POVO - Teve resistência em transformar em amor?
Arthur Sendas - No começo, não foi difícil pela amizade, mas eu sempre ligava para ela para pedir ajuda. Eu acho que ela ficava duas, três horas no telefone, porque eu tinha que explicar pra ela sem ver qual era o e-mail que precisava ser respondido, o que é que precisava fazer.
Então só nisso foram horas e horas ela literalmente me ajudando, sendo os meus olhos. Então a See U nasceu com essa vocação de autonomia. De eu olhar e dizer: "Cara, ela sempre dizia que não se importava de ajudar. Mas eu queria ter autonomia."
E uma das motivações da See U foi que, em 2019, minha mãe (Maria Felix da Silva) faleceu de Esclerose Lateral Amiotrófica, a ELA.
Eu fiquei refletindo muito na pandemia sobre isso, porque, uma das coisas, a minha mãe perdeu os movimentos, então não conseguia levantar da cama sozinha. Não conseguia pegar água.
Toda vez que eu ia buscar água para ela, eu buscava com muito amor, mas eu sempre pensava que ela queria levantar e buscar sozinha... Era um sonho dela para ela e era um sonho meu para ela.
Daí que veio muito essa questão da autonomia, dessa palavra autonomia ser tão forte... A See U veio dessa reflexão.
Quando eu disse que ia ajudar os outros, foi porque eu disse: "Cara, a minha mãe está só, eu sofro muita dor, eu tenho meus problemas por conta das minhas deficiências, mas o problema que a minha mãe está passando é muito maior que o meu."
Quando eu comecei a perceber isso, eu percebi que eu poderia ajudar os outros, que eu poderia esquecer um pouco de mim e fazer mais pelos outros.
Então, nasceu muito do relacionamento que tivemos com várias pessoas, que passaram pelas nossas vidas e acabaram formando a See U.
OP - Como é ter a esposa como sócia? A convivência em todos os locais?
Arthur Sendas - Ter esposa como sócia é relativamente fácil, pelo menos para mim.
A gente tem um relacionamento, acho que 15 anos de relacionamento... Amizade, depois de namoro e casamento, então, assim... Eu já conhecia ela como amiga e já conhecia ela como cuidadora, então, quando a gente escolheu namorar a gente já se conhecia muito.
Acho que foi depois de uns três anos de amizade, não, depois de mais até. É que a gente começou a namorar e depois escolheu casar e tudo. Tudo já estava encaminhado, literalmente, mesmo antes da gente escolher.
Na verdade, o primeiro edital que a gente passou foi ela que achou. A gente nem queria ser uma startup, nem queria nada, era só para desenvolver, para ajudar a gente mesmo. E por essa e outras é que a gente está junto tanto em startup, quanto na vida, quanto em tudo.
OP - Você teve um sócio que faleceu e a empresa quase faliu...
Arthur Sendas - Era o Sérgio Gomes Júnior. Tinha uma doença degenerativa e faleceu dela: distrofia muscular de Becker. Ele era cego e éramos amigos de faculdade.
Foi em outubro de 2023 que ele partiu, o mesmo mês de lançamento da See U. Foi literalmente a gente lançando o aplicativo e ele faleceu. Quando aconteceu isso, a gente pensou em desistir.
Mas a gente pensou que talvez esse era o principal motivo para lançar. Ele lutou ali para conseguir lançar e para a gente conseguir continuar. Aquele tempo... Ele estava só esperando acontecer isso na vida e terminar isso (para partir).
OP - Quando vocês iniciaram a ideia como empresa, e como foi o processo de adentrar nesse universo das Startups, já com a See U?
Arthur Sendas - Teve dois anos, o ano de 2009, que foi quando começou, mas o ano que se tornou empresa, que se tornou a See U, como é hoje, foi 2022.
Em 2022, surgiu a Startup Nordeste e aí a gente viu uma chance de fazer a startup acontecer, era só uma solução que a gente usava. E aí a gente conseguiu passar. Com a premiação a gente disse: "Cara, dá para viver da premiação e ir tocando a empresa."
A gente não sabia nada sobre negócio, modelo de negócio ou qualquer outra coisa. A gente só sabia sobre tecnologia. “Vamos tocar que vai dar certo, contando com apoio de mentorias”.
Logo depois, a gente conseguiu passar na seleção da Casa Azul, no programa Delta V. A gente ainda estava muito no começo, na verdade, muito perdido. A ideia do programa era oferecer mentorias para que as startups começassem a crescer mais. Era literalmente acompanhar de perto para tentar fazer as startups crescerem.
Nesse processo, foi entendendo mais como funcionava o mercado, como vendia, como fazia acordos de negócio, sobre qual era a intenção das pessoas, enfim, entender literalmente o que era a empresa. E aí a gente acabou ganhando o Delta V.
Depois foi só sucesso, porque aí foi uma confirmação do trabalho que a gente já vinha fazendo e daí para frente só alegria.
OP - Como ocorreu o desenvolvimento do programa, vocês tiveram ajuda com o projeto?
Arthur Sendas - A gente começou a desenvolver sozinho. Na verdade, a gente fez a maioria das coisas tecnológicas sozinha. A gente registrou as patentes, fez tudo mesmo.
Só a partir desse ano (2025) foi que a gente começou a contratar programadores para ajudar no desenvolvimento, porque aí foi ficando muito grande o projeto.
E aí foi entrando mais gente e a gente viu que a parceria com as Instituições de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICTs) para a continuidade do desenvolvimento faria todo o sentido. Mas isso depois que a gente já tinha tudo desenvolvido. Foi para ir trazendo novas funcionalidades.
OP - Quando vocês viram que o aplicativo estava pronto? Foram feitos testes com algum público específico?
Arthur Sendas - Em dezembro de 2022, a gente terminou o aplicativo e disse: 'Ó, a gente precisa testar'. Só que era teste mesmo. Então, assim, a gente não tinha os usuários para testar. Não era para comprar, porque a gente não tinha testado e não sabia se tava pronto ou não.
Procuramos pessoas cegas e a gente disse: "Ó, a gente tem esse aplicativo aqui, é de graça, vai continuar sendo de graça para vocês, mas vocês têm que ajudar a gente a testar."
Falamos com 50 pessoas, as 50 aceitaram e aí a gente foi testando mês a mês, só que cada mês entrava mais gente. De dezembro de 2022 até outubro entraram 1.300 pessoas, todas testando de graça. A gente já tinha apoio do Google, da Microsoft, da AWS, então conseguia se sustentar literalmente com apoio das empresas.
OP - Qual foi a maior dificuldade no processo de criação e desenvolvimento do negócio?
Arthur Sendas - Eu acho que a maior dificuldade foi achar literalmente o modelo de negócio. Na verdade, foram algumas dificuldades, todas elas tiveram a ver com o modelo de negócio, porque a gente tinha um modelo de negócio que cobrava dos usuários.
Só que a maioria dos nossos usuários não tinham condições de pagar. Estava insatisfeito por essa questão. A gente cobrava dos usuários e os usuários, às vezes, ligavam para a gente dizendo: "Ó, eu quero continuar usando, mas eu não tenho como pagar". E era algo recorrente.
Por mais que sempre estivesse no azul, isso incomodava demais. Era algo que realmente incomodava, de dizer, cara, a gente não tem um modelo de negócio que se sustenta, um modelo de negócio para todo mundo. E o nosso negócio é para todo mundo. Então, a gente conseguiu essa barreira, essa liberdade desse modelo e dizer agora a gente é B2B (empresa que trabalha para empresa).
OP - Como foi pensado a forma de monetização da empresa?
Arthur Sendas - Até esse ano a gente ainda cobrava das pessoas cegas. Hoje, para as pessoas cegas que têm parcerias com ONGs, por exemplo, ela consegue usar completamente de graça.
A ideia é que a partir desse ano, na verdade, estimamos até dia 15 de novembro, já seja completamente de graça. As pessoas só precisam participar das ONGs normalmente, como já participam, e serão beneficiadas. Então, as parcerias com governos continuam com ONGs e com tudo.
A gente vai conseguir dar para quem mais precisa. Acho que para a gente é a maior felicidade do mundo. Então, todo mundo vai poder usar de graça. E aí a gente ganha dinheiro com as empresas e com eventos. Acho que o nosso maior objetivo desde o começo da See U era como monetizar sem machucar as pessoas.
OP - Por que ocorreu essa mudança de começar cobrando e mudar a forma do negócio com o trem já andando?
Arthur Sendas - Foram duas questões. A primeira, eu fui diagnosticado no final de 2023 com câncer de garganta, e no começo de 2024, os médicos me deram seis meses de vida e comecei a perder a voz.
No começo de 2024 eu fui dormir e acordei quase um mês após um coma, eu não sabia o que tinha acontecido. E eu me lembro quando eu acordei que me contaram, que me explicaram coisas.
No começo, logo quando eu acordei, eu me lembro que eu disse: "Cara, eu não quero mais empresa, eu não quero mais, não quero mais pensar nisso, eu não quero mais pensar em nada".
E eu me lembro que uns dias depois eu recebi uma carta de uma mãe em um áudio: 'Quando eu descobri que o meu filho não enxergava, eu achava que ele não nunca ia ser nada. Eu achava que o futuro dele estava comprometido'.
E ela contando que viu o filho dela estudando para o vestibular, que viu um futuro que ela nunca tinha visto. E aí eu disse: "Velho, se tiver algum sentido, é sobre fazer as coisas, é sobre mudar a vida das pessoas. Não tem como não". Eu acho que há um propósito para as coisas.
A gente tem uma startup, a gente cria soluções teoricamente incríveis, então, no mínimo, a gente teria que criar modelos de negócios também incríveis e que consigam romper essa barreira, de cobrar de quem mais precisa, porque a pessoa precisa literalmente.
Quando eu consegui voltar, consegui ficar curado, que os médicos olharam e falaram: "Cara, é um milagre. A gente não sabe como você sobreviveu."
Então, foi algo que eu me lembro quando eu voltei, eu disse: "A gente tem que mudar alguma coisa, a gente tem que fazer ver um certo senso de urgência do que é o amanhã, do que de que a gente não tem tempo e que precisa fazer".
Eu tô completamente curado, graças a Deus. Aconteceu, foi algo bastante difícil, porque eu perdi a voz, eu perdi tudo, estava perdendo a saúde, estava com vários problemas e eu achava que eu não ia sobreviver.
Acho que quando a gente ouve assim um depoimento, esse tipo de coisa, você olha, você diz: "Eu acho que eu estou fazendo a diferença para algumas pessoas, vale a pena fazer."
OP - Você citou parcerias com grandes empresas de tecnologia, como surgiu essa possibilidade de se conectar com essas marcas, e como elas contribuíram?
Arthur Sendas - Na verdade, surgiu a partir do Delta V, da Casa Azul. A gente soube que poderia acessar outras empresas, acessar o Google. Nenhuma das mentorias falaram, explicaram como a gente acessava.
Uma das mentorias de tecnologias falaram para gente: "Vocês podem acessar esses recursos e para ter a ajuda". Então aí a gente acessou o primeiro, que foi a AWS com a Startup Nordeste, e a Microsoft e o Google já com apoio do Delta V.
Eles apoiam com nuvem. Então a gente não tem gasto com site, aplicativo, enfim, nenhum gasto. Na nuvem, é cobrado, e eles também nos ajudam com os especialistas deles, explicando estrutura e como fazer da melhor forma ou se a gente tem alguma dúvida técnica. Então, eles ajudam de várias formas, na verdade.

OP - Ao longo do andamento da iniciativa, foram surgindo novas possibilidades de parceria? Como surgiam?
Arthur Sendas - Teve um aluno de Alagoas que ele estava participando do HTEC, que é um curso fornecido pelo Governo de Alagoas, e pessoas cegas precisavam participar.
Aí o governo entrou em contato com a gente para ter uma parceria com eles para que pessoas cegas conseguissem acessar o curso de informática e usar. E a gente disse fazer totalmente sentido. Então a maioria das parcerias, a maioria das coisas que a gente faz literalmente foi alguém que disse.
Por exemplo, a gente faz muitos eventos hoje, então, as pessoas disseram: "Ó, tá precisando de acessibilidade, não tem acessibilidade para pessoas cegas, como a gente faz?"
Aí a gente começou a implementar e assim foi crescendo e foi fazendo de acordo com literalmente a demanda que ia surgindo.
A gente tem toda a estrutura lá [no Governo de Alagoas], os computadores, a pesquisa, a divulgação, a linha. Então, eles não apoiam diretamente financeiramente, mas apoiam com toda a nossa estrutura que a gente precisa.
OP - O aplicativo tem muitas frentes de atuação, como ecolocalização, auxílio em leituras e estudo entre outros, qual foi o foco principal no início, e como as funções foram surgindo?
Arthur Sendas - No início, na verdade, sempre foi tanto para a questão de trabalhos, de estudo e a questão de ecolocalização, em que hoje um dos recursos é que ensinamos a caminhar estralando a língua. Acreditamos na autonomia e, foi vindo com os testes, os feedbacks...
Por exemplo, quando foi vindo os primeiros testes, a gente viu que as pessoas estavam usando para estudar para vestibular, aí outras estavam estudando para concurso. Então, vamos usar para estudo, vamos usar para trabalho, vamos usar para outras coisas, foi vindo das próprias pessoas que elas começaram simplesmente a usar para esses fins.
Então, a gente começou a ver que as pessoas estavam usando e estavam dando certo. Aí a gente dizia: "Cara, isso aqui, eu acho que tá dando certo".
Aí, a gente analisando os dados que vinham das pessoas, íamos melhorando e incrementando conforme as pessoas iam fazendo mesmo, usando no dia a dia. Foi fazendo de acordo literalmente com a demanda que ia surgindo.
São tantas frentes que você tem que aprender de fato a mexer. Basicamente, dependendo da funcionalidade do aplicativo, a pessoa precisa levar um tempo para aprender.
Por exemplo, o da ecolocalização a gente consegue ensinar as pessoas a se movimentarem pelo som. Então, elas conseguem aprender a ver uma parede na frente, a ver outras coisas. Várias escolas de cego já ensinam isso. A gente só conseguiu melhorar o ensino com a tecnologia.
É uma habilidade biológica que a gente desenvolve, mas é comprovado, tem todo estudo científico. Outras pessoas cegas já utilizam. Essa habilidade demora uns 3 meses para começar a aprender a usar, mas outras questões de locomoção são mais práticas.

OP - Vocês têm dimensão de quantos usuários possuem hoje? E quais regiões do País mais atuam?
Arthur Sendas - Hoje, no total a gente tem uns 120 mil. Por incrível que pareça, hoje estamos mais em Alagoas e no Norte do País. A gente está em 22 países. A ideia é aumentar nisso também.
Próximo ano, se tudo der certo, 50 países. A ideia do próximo ano é que a gente conseguisse atingir 2 milhões de usuários, 200 empresas e ONGs juntas.
Porque quando a gente consegue atingir ONGs, a gente consegue também atingir usuários e aí a gente consegue ir escalando, usando em sistema educacional, usando em outras coisas. Então hoje, o nosso sistema já tá crescendo e ajudando outros sistemas.
OP - Quais são os planos da See U para o futuro? Estão sendo pensadas novas funcionalidades e novas formas de atender o público de vocês?
Arthur Sendas - O grande plano realmente é torná-lo gratuito. E aí, fazer parceria com todas as ONGs do Brasil. A ideia é que no máximo, no próximo trimestre, a gente feche todas as parcerias com todas as ONGs para pessoas cegas do Brasil.
Então esse é um dos nossos grandes planos, já vindo o nosso modelo de negócio cada dia crescendo mais, tá estabelecido, tá ganhando espaço, tá ganhando visibilidade.
Esse ano a gente fez 12 eventos grandes. Ano que vem a gente vai chegar a uns 200 eventos. Então, é um crescimento bastante grande, porque esse ano foi para a gente literalmente aprender como fazer e ano que vem vai ser só fazendo. A gente tá vendo que está dando certo.
Prêmios e reconhecimentos da See U App
A gente fez o evento da Festa Literária de Paraty (RJ). E aí estamos conversando com a Prefeitura de Paraty para implementar passeios turísticos para pessoas cegas, implementar mais acessibilidade.
A nossa equipe cresce a cada ano. Agora a gente está com 30 pessoas, mas a ideia é que ano que vem a gente chegue a 50 pessoas até o meio do ano.
Inclusive começamos a desenvolver um hardware, que é um sistema neural para fazer as pessoas enxergarem vultos, talvez esse seja o maior ganho da See U nesses próximos anos conseguir fazer isso.
Está bem avançado. Então, se a gente conseguir fazer as pessoas cegas enxergarem vultos, vai ser algo. Tem algumas pesquisas, já tem muita coisa, a nossa estimativa é que daqui a uns dois anos a gente consegue fazer pessoas cegas enxergarem através do som e a gente vai conseguir dar um passo além nisso aí. Tem muita coisa vindo.
O POVO - Que novidades?
Arthur Sendas - Duas informações adicionais que eu, provavelmente, não falei... A gente está desenvolvendo um óculos também para ajudar as pessoas, para quem quiser, auxiliar ao aplicativo, então, não é obrigatório ter os óculos. É só se a pessoa se sentir à vontade usando.
É um acessório que facilita a vida, porque você conecta no celular e não precisa estar com o celular na mão, facilita e tem muitos momentos de estudo, de leitura e outras coisas para você não ficar com o celular na mão.
Outra questão é que a gente está desenvolvendo o nosso implante neural e daqui a dois anos a gente vai estar com ele pronto.
As pessoas completamente cegas vão enxergar vultos. Não só vultos, mas sombras, então, elas vão conseguir enxergar um sofá, vão conseguir enxergar um brinquedo pelo caminho, vão conseguir procurar chaves, vão conseguir desviar de obstáculos e andar por aí com muito mais autonomia.
Então, assim, é outro sonho a ser realizado... Eu só tenho a agradecer mesmo pelo que acontece na vida.
Enfim, eu acho que tem muita coisa muito legal vindo. E a ideia do implante neural veio do começo, quando eu pensava isso para ser uma cura para a minha mãe.
Esse pensamento acabou se tornando uma cura para quem não enxerga. Então, assim, vem muita coisa legal... Esse ano está sendo muito legal e ano que vem vai ser um ano incrível.

Tentativa
No TCC da faculdade, Arthur fez um jogo para pessoas cegas. Em 2013, investiu no óculos de realidade virtual, em que o headset detectaria obstáculos. Construiu um protótipo do equipamento junto com os ainda então amigos de faculdade, Sérgio Gomes Júnior, e Jaqueline Sendas, engenheira. O projeto foi parar em competição de startups de Portugal e foi aprovado.
Evolução
A bateria dos óculos, porém, era pesada e o aparelho não era nada funcional. Pensaram em colares, pulseiras, até chegar ao crachá que se conectava a um aplicativo, conectando três tecnologias, como a ecolocalização, que traduz obstáculos e caminhos a partir dos sons espaciais para guiar o usuário.
Usos do See U
Atualmente, além da ecolocalização, a parte da inteligência artificial lê placas, livros, descreve objetos e responde a comandos de voz, sugerindo rotas mais seguras e personalizadas. A realidade virtual é usada em treinamentos e simulações, treinando pessoas cegas ou equipes de apoio em novas rotas e experiências, antes de o usuário ir para o mundo real.
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