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CPI serve para quê? De presidente afastado ao "circo" das Bets
Reportagem Especial

CPI serve para quê? De presidente afastado ao "circo" das Bets

Comissões Parlamentares de Inquérito têm atuação limitada e não possuem caráter judicial. No entanto, conseguiram movimentar grandes peças da história política brasileira, remover figurões dos cargos e dar foco a assuntos sensíveis. Em meio à velocidade atual, qual importância resta às CPIs?

CPI serve para quê? De presidente afastado ao "circo" das Bets

Comissões Parlamentares de Inquérito têm atuação limitada e não possuem caráter judicial. No entanto, conseguiram movimentar grandes peças da história política brasileira, remover figurões dos cargos e dar foco a assuntos sensíveis. Em meio à velocidade atual, qual importância resta às CPIs?
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O senador cearense Mauro Benevides, hoje com 95 anos, era presidente do Congresso Nacional em 1992. Saído de Fortaleza, chegou em Brasília naquele mês de maio após uma ligação do então ministro da Justiça, Célio Borja. “Naquela época não era fácil a comunicação”, informou Benevides "Em entrevista à Câmara dos Deputados, em 2012. O senador foi contatado para esta reportagem, mas não pôde responder" , indicando a urgência do contato.

Encaminhou-se ao Senado Federal e - qual foi a surpresa - esbarrou com lideranças políticas paradas bem na porta do seu gabinete. Os políticos reclamavam a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o então presidente Fernando Collor de Mello (PRN).

O motivo? Uma entrevista de 10 páginas do irmão do mandatário na revista Veja, acusando-o de crimes de corrupção, supostamente liderados pelo tesoureiro de campanha dele, Paulo César (PC) Farias.

ParaTodosVerem: presidente do Senado, Mauro Benevides, à direita, enquanto analisa o início da instalação da CPI que investigou o então presidente Fernando Collor(Foto: Herminio Oliveira/Agência Brasil)
Foto: Herminio Oliveira/Agência Brasil ParaTodosVerem: presidente do Senado, Mauro Benevides, à direita, enquanto analisa o início da instalação da CPI que investigou o então presidente Fernando Collor

Foi instalada uma Comissão Mista, ou seja, com Senado e Câmara dos Deputados. Os parlamentares ouviram Pedro, além de PC e figurões do governo, como a ministra da Fazenda, Zélia Cardoso de Mello, responsável pelo Plano Collor - o do confisco das poupanças.

Em agosto, a CPMI foi encerrada e o parecer foi comunicado a Mauro Benevides: “Está admitida a acusação contra o senhor presidente da República por crimes de responsabilidade”. Em menos de um mês o processo de impeachment foi aberto e, em dezembro, Collor renunciou. O procedimento seguiu mesmo assim e, no dia seguinte, o mandatário foi afastado pelo Parlamento

Inúmeros fatores levaram à queda do primeiro presidente eleito de forma direta após a Ditadura Militar. No entanto, especialistas ouvidos são unânimes em considerar a CPMI um ponto primordial do ocorrido.



As investigações no Parlamento continuam ganhando manchetes mais de três décadas após a saída de Collor. Em meados de 2025, por exemplo, influenciadores são questionados sobre os riscos de propaganda de apostas online, na chamada CPI das Bets, por meio de depoimentos disponibilizados em tempo real.

A comunicação não é mais dificultosa como foi na ligação do ministro Borja ao presidente do Congresso: ela centraliza os temas dos inquéritos e permite interação em tempo real dos brasileiros. Há mais acesso ao que ocorre nas reuniões, mas, em vez de potencializado, o real propósito das CPIs é questionado

Alguns especialistas, como a doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e colunista do O POVO+, Juliana Diniz, criticaram depoimentos como o da influenciadora Virgínia Fonseca, chamando uma sessão da CPI das Bets de “circo”.

Outros voltam um pouco no tempo, relembram comissões como a da Pandemia e questionam sobre os resultados pragmáticos dela, já que os principais citados no relatório seguiram intactos nos cargos até o fim da gestão.

Afinal, o que marca o sucesso ou fracasso de uma CPI? Qual o propósito dos vários depoimentos e sessões? Quais resultados podemos esperar delas?

 

 

O "espetáculo" na CPI das Bets

Um dia de CPI é “um dia normal”, aos olhos do correspondente do O POVO em Brasília, João Paulo Biage. Votações de requerimento, uma ou duas oitivas. “Mais uma para cobrir”, disse, com naturalidade, antes de acrescentar: “O negócio é que a CPI, dependendo do depoimento, atrai muita visibilidade”.

Os celulares sempre apontados e uma maior concentração da imprensa seriam, segundo ele, consequências da própria natureza dessas Comissões. Por terem poder de polícia e tratarem de “fatos determinados” - ou seja, quentes - elas tendem a provocar mais atenção aos parlamentares envolvidos e aos desdobramentos do que comissões comuns.

“Os próprios relatórios finais são mais para externar a situação para a população do que para investigar aqui dentro”, disse o repórter. Assim, um “pequeno teatro” seria naturalmente esperado.

CPI das BETS (CPIBETS) realiza reunião para ouvir depoimento de testemunhas.  Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado(Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado)
Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado CPI das BETS (CPIBETS) realiza reunião para ouvir depoimento de testemunhas. Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senado

Há situações mais extremas. O dia do depoimento de Virgínia Fonseca, citado há pouco, teria sido particularmente “complicado de trabalhar”. Os corredores estavam lotados e um maior número de policiais circulava pelo espaço para “conter os fãs” da influenciadora.

O maior estranhamento, no entanto, veio na sessão. Biage narra um andamento “bom” até um pedido de selfie com a influenciadora pelo senador Cleitinho (Republicanos-MG). “Parece que foi a senha para que nada fosse levado a sério. Não estava normal, não parecia ser uma investigação”, narrou ele.

Segundo o jornalista, o tratamento com Virgínia foi diferente do direcionado a convidados anteriores. Havia palavras de conforto e tranquilidade, em uma postura tão particular que provocou profunda repercussão negativa.

“A repercussão fez os senadores mudarem no dia seguinte, quando ouviram o Rico Melquíades (outro influenciador, na mesma comissão). Foi completamente diferente - digo de postura dos senadores. Menos risadinhas, poucas palavras de apoio. Ele, inclusive, reclamou”, narrou o repórter.

De volta à Juliana Diniz, a colunista do O POVO+ considera que a “oitiva de Virgínia Fonseca na CPI das Bets rompeu com todas as regras de protocolo institucional esperadas para um ato do Congresso Nacional”.

“A informalidade no discurso, as fotografias, toda a expectativa de parlamentares e da própria testemunha em produzir conteúdo para as redes sociais esvaziaram a seriedade e a verdadeira função daquele momento, tornando-o mais um espetáculo do que propriamente um momento de apuração de informações”, afirmou.

Para ela, “as casas legislativas precisam ter um rigor redobrado sobre as regras quanto à captação e exploração de imagens em seus espaços, sob pena de ficarmos reféns de uma busca permanente de cortes úteis para engajamento nas redes sociais, com prejuízo da qualidade democrática”.

 


Juliana Diniz

Juliana Diniz é doutora em Direito pela Universidade de São Paulo (USP) e professora da Universidade Federal do Ceará (UFC)

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João Paulo Biage é repórter, comentarista do programa O POVO News e colunista do O POVO+


As críticas não são isoladas a essa investigação. Em 2023, por exemplo, a CPI sobre o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra foi palco de fortes embates envolvendo os parlamentares. A “baixaria” das discussões virou tema de colunas, tendo destaque a sessão na qual ofensas foram disparadas contra a aparência da deputada federal Sâmia Bomfim (Psol-SP).

Na lugar de oposição aos propositores, ela citou inúmeras dificuldades nas reuniões. Extremismo por parte do outro lado, machismo, e pouco destaque à pauta da reforma agrária no debate público seriam algumas delas.

Sâmia chegou a afirmar, na época, que a Comissão “se esvaziou politicamente”, o que seria uma tendência nas investigações legislativas. “Acabam servindo só de palanque para atuação de parlamentares, para fazerem cortes, e acabam não tendo o objeto elucidado”, disse a deputada em entrevista exclusiva ao O POVO+.

ParaTodosVerem: Sâmia Bomfim, mulher branca de cabelos pretos, na CPI do MST em 2023. Ela fala no microfone, enquanto uma folha com o título CPI está ao fundo (Foto: Myke Sena/Câmara dos Deputados)
Foto: Myke Sena/Câmara dos Deputados ParaTodosVerem: Sâmia Bomfim, mulher branca de cabelos pretos, na CPI do MST em 2023. Ela fala no microfone, enquanto uma folha com o título CPI está ao fundo

Curiosamente, hoje ela não considera a CPI do MST como um destes casos de puro “circo” ou promoção individual. Apesar de ainda a chamar de um “show de horrores”, a Comissão, para ela, promoveu resultados inesperados.

“Ela tinha o objetivo de criminalizar o MST, mas não tenho dúvida de que serviu para popularizar mais o movimento, torná-lo mais conhecido e retomar, para a ordem do dia, a pauta da reforma agrária”, afirma, exaltando o poder de visibilidade das CPIs.

 

 

CPI serve para quê?

Questionado das críticas sobre supostos resultados “inexistentes" das investigações legistivas, mesmo após meses de reuniões midiáticas, o professor Pablo Holmes considerou que há uma concepção errada da população quanto ao papel das Comissões.

“Eu acho que a gente costuma não dar valor às CPIs porque, de fato, elas têm um poder limitado e muitas vezes não funcionam. Mas, podem funcionar”, resumiu o docente associado no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). Ele indicou as CPIs como, em suma, órgãos políticos.

ParaTodosVerem: Pablo Holmes, professor associado no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). É um homem branco de cabelos com fios brancos. Está em frente a uma parede de livros. Usa blazer azul com camisa rosa(Foto: Arquivo Pessoal/Pablo Holmes)
Foto: Arquivo Pessoal/Pablo Holmes ParaTodosVerem: Pablo Holmes, professor associado no Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB). É um homem branco de cabelos com fios brancos. Está em frente a uma parede de livros. Usa blazer azul com camisa rosa

Conforme a Constituição de 1988, as Comissões Parlamentares de Inquérito focam em uma das funções do Parlamento: a de fiscalizar os demais poderes. Elas são temporárias e podem ser criadas por meio de requerimento assinado por membros do Senado, da Câmara, ou das duas casas em conjunto.

O documento é apresentado e aprovado pelo presidente da respectiva Casa. Nele, deve conter: número de membros, o prazo de duração da comissão e o limite das despesas. Os integrantes são escolhidos pelos líderes dos partidos, respeitando as proporções e a diretoria é eleita logo em seguida.

 

Como funciona a instalação de uma CPI 

 

Não é todo assunto que pode virar tema de investigação. O regimento do Senado, por exemplo, proíbe CPIs “sobre matérias pertinentes à Câmara dos Deputados, às atribuições do Poder Judiciário e aos Estado”. Já a Câmara informa que as Comissões da Casa “se destinam a investigar fato relevante para a vida pública e para a ordem constitucional, legal, econômica ou social do País”.

Em suma, as CPIs brasileiras miram questões “quentes” do debate público. Geralmente envolvem temas como crimes de corrupção, ataque aos direitos humanos e ao meio ambiente, crimes de responsabilidade e acusações de irregularidades em órgãos ou projetos públicos.

A CPI tem o prazo de até seis meses para entregar o relatório final. Na Câmara, é permitido o funcionamento de no máximo cinco investigações simultâneas desta natureza e, ainda que não haja limite no Senado, cada senador pode participar de no máximo duas ao mesmo tempo.

Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPI Pandemia) tentou esclarecer sobre o suposto "ministério paralelo da saúde", incluindo a sugestão de utilização de medicamentos sem eficácia comprovada e o apoio à imunidade de rebanho(Foto: Pedro França)
Foto: Pedro França Comissão Parlamentar de Inquérito da Pandemia (CPI Pandemia) tentou esclarecer sobre o suposto "ministério paralelo da saúde", incluindo a sugestão de utilização de medicamentos sem eficácia comprovada e o apoio à imunidade de rebanho

Ao fim, é produzido um inquérito, conforme explica o professor Pablo. Esse seria o ponto inicial de um processo, apresentado em relatório e encaminhado ao Ministério Público. O órgão dará seguimento aos trâmites visando “responsabilidade civil ou criminal dos infratores”, segundo a Constituição de 88. 

Esse é o poder da CPI. Ela não pode prender (exceto em flagrante delito), realizar escutas telefônicas, apesar de manter algumas vantagens que até mesmo os órgãos judiciários não possuem com facilidade, como a quebra de sigilos bancários.

 

O que a CPI pode ou não fazer?


O forte, para o professor de Brasília, não é o fim, mas o processo até ele. As oitivas, a exposição de pessoas e de fatos inéditos têm o poder de instabilizar governos e provocar a opinião pública - algo comprovado ao longo dos anos de República brasileira.

 

 

O histórico das CPIs no Brasil

Da sala de reunião da CPI das Bets, o consultor legislativo do Senado, Tiago Odon, escreveu para O POVO+. Falou do surgimento das Comissões investigativas nas pausas do trabalho que chamou de “dinâmico”: “Oferecer assessoria precisa a parlamentares, analisar documentos sigilosos, medidas judiciais e de averiguação de indícios para eventual responsabilização criminal”.

ParaTodosVerem: consultor Legislativo e professor, Tiago Odon. É um homem branco de barba, bigode e cabelos pretos. Usa um terno preto com camisa e gravatas azuis. Está sentado, de frente para a Câmera, em um escritório(Foto: Arquivo Pessoal/Tiago Odon)
Foto: Arquivo Pessoal/Tiago Odon ParaTodosVerem: consultor Legislativo e professor, Tiago Odon. É um homem branco de barba, bigode e cabelos pretos. Usa um terno preto com camisa e gravatas azuis. Está sentado, de frente para a Câmera, em um escritório

Nas respostas à reportagem, voltou no tempo - mais especificamente à Inglaterra do século XIV. A Alta Corte do Parlamento, no reinado de Eduardo II, exercia poder de investigação. “As primeiras CPIs surgiram no direito anglo-saxão”, explica o consultor.

Há, na verdade, registros "Fonte: Artigo 'A comissão parlamentar de inquérito no ordenamento jurídico: origem, histórico, atribuições e limites'" da participação do Senado em processos administrativos na Roma Antiga, mas de fato a Inglaterra é vista como pioneira na legislação. Outras comissões semelhantes surgiram na França, Alemanha, Itália e Estados Unidos - cujo parlamento investiga desde o princípio, apesar da Constituição federal não prever CPIs.

No Brasil, há registros de “Comissões Auxiliares” no Império, ainda que sem asseguramento constitucional. As investigações jamais diziam direito ao Executivo, mas a questões ligadas a “comércio, indústria, agricultura, finanças, dentre outros”.

Mesmo com a Proclamação da República, não houve aparato legal ou proibições para as CPIs. Nessa época, chegaram a ser criadas 19 comissões com foco em investigar seguros de vida, finanças, alfândega e outros.

Somente em 1934, as comissões investigativas foram citadas em documento constitucional - limitadas à Câmara dos Deputados. A Casa Baixa chegou a fiscalizar questões sobre condições de vida do trabalhador urbano e rural, condições dos serviços industriais do Estado até que investigações foram removidas do texto constitucional em 1937, na Ditadura do Estado Novo.

A Câmara retornou os poderes investigativos em 1946 e, desta vez, o Senado foi incluído. As CPIs foram proibidas na Ditadura Militar e retornaram com a configuração atual - própria de autoridades judiciais - na Constituição de 1988, texto atual.

 

As CPIs nas Constituições brasileiras

 

O POVO+ listou todas as CPIs ou CPMIs de 1946 até hoje. Foram 95 do Senado, 40 na Câmara e 49 mistas. A década com mais Comissões Mistas foi a de 1990, enquanto os anos 2010 foram os de maior número de CPIs na Câmara e no Senado.

Os assuntos, muitas vezes, abarcam casos específicos, como a tragédia do Césio 137 de Goiânia, o rompimento da barragem de Brumadinho ou o acidente da Chapecoense

Alguns são ainda repetitivos. Existiram, por exemplo, pelo menos seis CPIs ou CPMIs com a temática "Amazônia" - de 1970 a 2020. Outras cinco miraram a Petrobrás. 

 

Todas as CPIs ou CPMIs brasileiras

 

 

Impressiona, no entanto, a constância de determinados temas. Algumas comissões investigavam questões mais amplas como o assassinato de jovens negros no País, violência urbana e até o aumento populacional brasileiro.

Problemas como corrupção, violência, desigualdade e crimes ambientais se mostram quase onipresentes na história brasileira, desde as primeiras CPIs. Vêm e voltam. Qual poderia ser, então, o papel de uma investigação legislativa, com poderes limitados, em dilemas tão enraizados?

 

 

“Nem sempre acaba em pizza”: o que determina o sucesso de uma CPI?

A CPMI de Collor/PC Farias, citada no início do material, foi considerada uma investigação com um dos desdobramentos mais marcantes da República. Outras comissões de destaque foram elencadas pelos especialistas ouvidos, como a CPI dos Correios - pontapé do Mensalão - a CPI do Judiciário - levou à cassação de um senador - e a CPI do Banestado - considerada embrião da Operação Lava Jato.

 

Investigações de destaque na história brasileira

 

Porém, nem todo resultado "satisfatório" de CPI consistiria em grandes mudanças no meio político, como os casos acima - de afastamento e grandes esquemas revelados. O poder de impacto e a capacidade de criar fatos políticos por uma Comissão varia, segundo o professor Pablo, da UNB.

ParaTodosVerem: ataque do 8 de janeiro, quando manifestantes golpistas invadiram o Congresso Nacional, STF e Palácio do Planalto(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil ParaTodosVerem: ataque do 8 de janeiro, quando manifestantes golpistas invadiram o Congresso Nacional, STF e Palácio do Planalto

Ele citou aspectos como a “conjuntura política do país, o talento dos deputados envolvidos em abstrairem para si os ganhos” e até as modalidades tecnológicas disponíveis, que podem expandir ou minimizar o acesso ao conteúdo da CPI.

Assim, o impacto de uma CPI torna-se variável de caso a caso, ou, como afirmou a deputada Sâmia Bomfim: "Sempre sabemos como começa, mas nunca como terminam".

Nestas reviravoltas, comissões propostas visando o desgaste de algo podem acabar prejudicando os próprios propositores, como ocorreu na investigação do MST - citada mais acima. Outro exemplo é o do deputado cearense André Fernandes (PL)autor do pedido da CPMI do 8 de janeiro, investigação que acabou por pedir o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro, aliado de Fernandes.

Apesar da sinalização de culpa, Bolsonaro seguiu intacto no cargo, como ocorreu após a Comissão da Pandemia, realizada no Senado. Alvo de críticas, ela é um exemplo claro das diferentes visões sobre o sucesso ou não de uma investigação. Foi elencada como "satisfatória" pelos especialistas ouvidos.

Segundo eles, a investigação trouxe, justamente, uma boa visibilidade. Não a celebridades ouvidas ou a caos nas sessões, mas aos fatos absurdos e os rostos dos possíveis culpados.

Tiago Odon, consultor do Senado, considerou que a CPI “mudou a forma de gestão das vacinas pelo Poder Executivo e a forma de lidar com a crise sanitária”.

Já o professor Pablo, da UNB, destacou a atenção midiática conseguida pela Comissão, que deu rostos e nomes aos possíveis agravadores da crise sanitária no Brasil

“O fato mais importante da CPI da pandemia, que teve resultados imensos, foi colocar na pauta do dia de durante 6 meses os erros absurdos do governo. Estava todo mundo em casa com raiva. Foi um desgaste político tremendo que o Bolsonaro sofreu", relembra ele.

ParaTodosVerem: então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, depõe na CPI da Pandemia. É um homem branco, com cabelos grisalhos. Usa a máscara de maneira incorreta, apenas sobre o nariz(Foto: Sérgio Lima/AFP.)
Foto: Sérgio Lima/AFP. ParaTodosVerem: então ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, depõe na CPI da Pandemia. É um homem branco, com cabelos grisalhos. Usa a máscara de maneira incorreta, apenas sobre o nariz

Afastamentos de figurões, ganho político aos parlamentares e/ou simplesmente “circo”. Cada comissão tem história e desdobramentos próprios.

“Muitas ganham interesse e atenção, influenciando a opinião pública e contribuindo para disparar mecanismos de controle importante. Outras parecem mais destinadas a produzir ruído e confusão. Cabe ao parlamento contribuir para que o instrumento permaneça fiel ao seu propósito institucional”, considerou Juliana Diniz.

Para a colunista, apesar dos “circos” constantes, a saída não seria eliminar as CPIs, justamente pelo potencial de alcance que possuem. “É evitar que elas sejam capturadas para uso oportunístico nas redes sociais e junto à opinião pública. Uma tarefa difícil, mas não impossível”, disse.

O professor Pablo, por outro lado, defende uma maior abordagem técnica e com atenção jurídica, por meio de produção de provas para um eventual processo. Seria o caminho, defende, em meio a um ambiente de intensa polarização informacional e “descuido com os fatos”.

No fim, o povo quer resultados do que está à vista: reuniões e oitivas, que revoltam, chocam e revelam problemas históricos e crimes. As CPIs, o tribunal do legislativo, explicitam tudo e, mesmo sem poder punitivo, têm peso e importância reconhecidas.

A transformação delas em “show”, como citado, pode desgastar a visão popular quanto à seriedade do Legislativo e nos carrega de volta a uma promessa feita por Mauro Benevides, ao fim da CPMI de PC Farias e pouco antes de acatar o pedido de impeachment de Collor, em 1992.

Em frente a manifestantes, ele jurou: “Essa massa compacta que aqui está, pode ficar convicta de que o Senado não decepcionará o povo brasileiro". 

 

 

"Olá! Aqui é Ludmyla Barros, repórter do O POVO+. O que achou da matéria? Te convido a comentar abaixo!"

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