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Maria Fernanda Cândido: "Eu senti que o Brasil todo estava em Cannes"
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Reportagem Seriada

Maria Fernanda Cândido: "Eu senti que o Brasil todo estava em Cannes"

Em conversa exclusiva para O POVO um dia após a estreia mundial de "O Agente Secreto" em Cannes, a atriz contou sobre os bastidores da sua participação especial e sua afeição pelo debate sobre poder e memória
Episódio 53

Maria Fernanda Cândido: "Eu senti que o Brasil todo estava em Cannes"

Em conversa exclusiva para O POVO um dia após a estreia mundial de "O Agente Secreto" em Cannes, a atriz contou sobre os bastidores da sua participação especial e sua afeição pelo debate sobre poder e memória
Episódio 53
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Apaixonada por Clarice Lispector, atriz, modelo e ícone da teledramaturgia brasileira, Maria Fernanda Cândido já marcou presença em produções internacionais e agora acompanha mais um passo do Brasil rumo ao Oscar, com o filme O Agente Secreto, dirigido pelo pernambucano Kleber Mendonça Filho.

Ela, que já encantou o estilista Giorgio Armani — e todo um país — com sua beleza e elegância, retorna às grandes telas brasileiras após seu último trabalho em Sulla Terra Leggera, longa italiano, para interpretar Elza ao lado de Wagner Moura.

A atriz Maria Fernanda Cândido, em Cannes para a estreia do longa-metragem brasileiro O Agente Secreto, de Kleber Mendonça Filho(Foto: SAMEER AL-DOUMY / AFP)
Foto: SAMEER AL-DOUMY / AFP A atriz Maria Fernanda Cândido, em Cannes para a estreia do longa-metragem brasileiro O Agente Secreto, de Kleber Mendonça Filho

Em Cannes, ela surgiu como de costume: discreta, mas impossível de ignorar. O olhar sereno e o gestual contido contrastaram com o burburinho do tapete vermelho. É a elegância sem esforço que a transformou em uma das figuras mais admiradas da televisão e do cinema.

Conheça a vida e a trajetória desse grande nome da arte nacional — uma mulher cuja presença e talento prometem ecoar por muito tempo, enquanto o cinema brasileiro segue sua trilha de pleno sucesso e reconhecimento internacional.

 

 

Origens

Descendente de italianos, nascida em Londrina, Paraná, em 21 de maio de 1974, Maria Fernanda mudou-se para Curitiba quando tinha apenas 4 anos e iniciou a carreira como modelo antes de se apaixonar pelos palcos.

Durante sua juventude, estudou no Colégio Medianeira e nos fins de semana lembra das comuns escapadas para a Ilha do Mel, Morretes e Paranaguá, locais onde criou lembranças que carrega consigo até hoje.

“Almoço de domingo em Santa Felicidade, passeio pela Rua XV e visitas ao Largo da Ordem, essa experiência é muito viva e nítida em minha memória”, declarou em entrevista à revista Daqui Piemonte.

A carreira nas passarelas começou cedo, quando, aos 14 anos, ela foi descoberta por uma produtora de moda.

Maria Fernanda Cândido interpreta Maria Calas no desfile do estilista Stephane Rolland na Paris Fashion Week (Foto: JULIEN DE ROSA / AFP)
Foto: JULIEN DE ROSA / AFP Maria Fernanda Cândido interpreta Maria Calas no desfile do estilista Stephane Rolland na Paris Fashion Week

Logo mudou-se para São Paulo e iniciou seus trabalhos em editoriais de moda, capas de revistas e campanhas de grifes famosas. Em 1989, aos 15 anos, deixou o Brasil e mudou-se para Paris, onde viveu uma reviravolta na carreira ao modelar para grandes maisons como Versace, Dior e Prada.

Ainda no ritmo acelerado da moda, mudou-se para Nova York, onde impressionava colegas de trabalho e de passarela por sua pontualidade. Ficou conhecida pelo rigor e pela responsabilidade com os horários.

Em 1993, decidiu colocar um fim na carreira de modelo internacional e retornar ao Brasil. Ingressou na faculdade de Terapia Ocupacional da Universidade de São Paulo (USP), mas não chegou a concluir o curso para dedicar mais de seu tempo aos estudos de voz e interpretação no Studio Fátima Toledo.

Ela se graduou em Terapia Ocupacional somente em 2003, quando já possuía outra formação em um curso de cinema e televisão, concluído em 1996.

 

Os trabalhos de Maria Formada Cândido no teatro

 

Seu primeiro trabalho na televisão aconteceu na abertura da novela A Indomada (1997), na qual aparecia dançando envolta por chamas e tecidos esvoaçantes, em uma sequência simbólica e sensual que marcou a época.

A beleza e a presença de Maria Fernanda chamaram tanto a atenção do público quanto da própria emissora Globo, que a convidou, pouco tempo depois, para estudar interpretação — o que culminaria em sua estreia como atriz em Terra Nostra (1999), papel que a consagrou.

Antes disso, durante seu processo de preparação para as telinhas, estreou nos palcos de teatro com o espetáculo Anchieta, Nossa História e fez participações especiais nas novelas Pérola Negra (1998), do SBT, e Serras Azuis (1998), da Bandeirantes.

 

 

O início do sucesso nacional

A consagração de Maria Fernanda Cândido chegou na virada dos anos 2000, quando personagens marcados pela combinação entre força e delicadeza começaram a definir seu nome na teledramaturgia brasileira.

Foi nesse período que ela enviou um videobook ao diretor Jayme Monjardim, da TV Globo. Um gesto ousado que mudaria sua trajetória na arte. O material chamou a atenção e Fernanda foi convidada para um teste. Aprovada, conquistou o papel da italiana Paola em Terra Nostra (1999), sua grande estreia da televisão.

Maria Fernanda Cândido como a italiana Paola na nova de época que marcou sua entrada na televisão(Foto: Reprodução/ Novela Terra Nostra (1999) Rede Globo)
Foto: Reprodução/ Novela Terra Nostra (1999) Rede Globo Maria Fernanda Cândido como a italiana Paola na nova de época que marcou sua entrada na televisão

Em busca de autenticidade em sua atuação, a atriz procurou uma professora particular para aperfeiçoar o sotaque italiano e mergulhou no universo da imigração europeia. Assistiu a clássicos do cinema, como Ladrões de Bicicleta, Matrimônio à Italiana e O Ouro de Nápoles. Também viu Novecentos, de Bernardo Bertolucci, para compreender o contexto histórico da época.

O resultado foi uma interpretação que a consagrou como uma das grandes revelações da televisão brasileira. O desempenho encantou público e crítica, rendendo-lhe o Troféu Imprensa de Revelação do Ano e o título de “Mulher mais bonita do século”, em votação do programa Fantástico. À época, chegaram a compará-la à jovem Sophia Loren — pela beleza clássica e pela presença intensa em cena.

Sophia Loren é uma das maiores atrizes da história do cinema e um dos principais ícones da Era de Ouro de Hollywood(Foto: Reprodução/Pinterest)
Foto: Reprodução/Pinterest Sophia Loren é uma das maiores atrizes da história do cinema e um dos principais ícones da Era de Ouro de Hollywood

Após isso, sua carreira deslanchou. No mesmo ano, ganhou sua primeira protagonista, interpretando a cantora Isa Galvão na minissérie Aquarela do Brasil. Mantendo a versatilidade artística, continuou com as atuações no teatro e esteve em cartaz com O Evangelho Segundo Jesus Cristo (2001).

Até 2004, Maria Fernanda Cândido atuava apenas em novelas de época. A virada veio com Como uma Onda, em que interpretou sua primeira personagem contemporânea, Lavínia, ampliando seu portfólio para além das tramas históricas.

 

 

Uma vida entrelaçada com a arte

Quem pensa que Maria Fernanda Cândido se afastou da carreira para casar e ter filhos se engana completamente. A atriz manteve firme seu projeto profissional mesmo durante o casamento e as gestações, fazendo pausas estratégicas, mas sempre preservando sua presença no universo artístico.

Ela é mãe de dois meninos: Tomás, nascido em 23 de janeiro de 2006, e Nicolas, em 17 de outubro de 2008. "Sou como qualquer mãe. Preocupada, bem coruja. Sempre procuro acertar e acabo errando também, algumas vezes. Bom, sou uma mãe básica: amo muito eles e curto todos os momentos", resumiu a atriz em uma entrevista.

Casada há quase 20 anos com o empresário francês Petrit Spahija, Maria Fernanda fez uma breve pausa durante a gravidez de Tomás. Ainda assim, marcou presença na TV com uma participação em Paraíso Tropical, interpretando a advogada Fabiana.

Maria Fernanda Cândido ao lado do marido, Petrit Spahija, e dos dois filhos, Tomás (19 anos) e Nicolas (17 anos)(Foto: Reprodução/ Instagram)
Foto: Reprodução/ Instagram Maria Fernanda Cândido ao lado do marido, Petrit Spahija, e dos dois filhos, Tomás (19 anos) e Nicolas (17 anos)

Em 2008, já grávida de Nicolas, voltou a trabalhar com o diretor Luiz Fernando Carvalho na minissérie Capitu, vivendo pela segunda vez a icônica personagem de "olhos de cigana oblíqua e dissimulada”, criada por Machado de Assis — papel que já havia interpretado no filme Dom, em uma releitura contemporânea da obra.

Ainda durante a gestação, tornou-se o rosto da nova campanha da Orient Relógios, estrelando duas ações publicitárias exibidas entre abril e junho daquele ano.

Seu grande retorno às telinhas veio em 2010, com duas minisséries: Dalva e Herivelto — Uma Canção de Amor, no papel de Lourdes, uma das amantes do compositor; e Afinal, o Que Querem as Mulheres?, novamente sob a direção de Luiz Fernando Carvalho, como a intelectual Monique.

Convidada por Walter Negrão para integrar o elenco de Araguaia, acabou recusando o convite, alegando envolvimento com outros projetos — entre eles, o longa Fronteiras de Sangue, ao lado de Luciano Szafir.

Em 2012, protagonizou o episódio “A Perseguida de Curitiba”, do seriado As Brasileiras. Dois anos depois, foi escalada para Felizes Para Sempre?, remake da clássica Quem Ama Não Mata, reforçando mais uma vez sua versatilidade.

Atualmente, a atriz mora na França, para onde se mudou em 2017 a pedido do marido. Em entrevistas, ela contou que a mudança ocorreu porque ele desejava retornar para perto da família e dos negócios após anos vivendo no Brasil ao seu lado.

Com a mudança para outro país, Maria Fernanda acreditou que precisaria pausar a carreira, mas em 2022 lá estava ela, aplaudida no palco do espaço L'Accord Parfait, na capital francesa, após encerrar o espetáculo Balada Acima do Abismo, criado a partir de textos da escritora Clarice Lispector, grande paixão da atriz brasileira.

"O meu olhar para a existência, para a vida, para as pessoas, tem a lente da arte. Não só as artes dramáticas, mas a arte como um todo. Tudo que é mais pequeno, mas sensível, me atrai."

Em entrevistas à revista Versatille, ela revelou que a admiração por Clarice nasceu na escola com A hora da Estrela e após a leitura de A Paixão Segundo G.H.: "Foi um abalo sísmico", comentou.

Tão sensível como a arte permite que seja, Cândido tem uma visão leve e inspiradora sobre a vida. Para ela, a vida foi sua preparação para todas as experiências que teve a oportunidade de viver. Tudo o que ela leu, viu e assistiu a preparou para estar onde está.

Maria Fernanda Cândido como fazendeira Cândida no remake da novela "Renascer", exibido originalmente em 2024 pela TV Globo(Foto: ESTEVAM AVELLAR/TV GLOBO)
Foto: ESTEVAM AVELLAR/TV GLOBO Maria Fernanda Cândido como fazendeira Cândida no remake da novela "Renascer", exibido originalmente em 2024 pela TV Globo

Sempre muito reservada quanto à sua vida pessoal, a atriz fez poucas declarações sobre o casamento e a maternidade ao longo da carreira, o que torna seus momentos descontraídos em entrevistas ainda mais valiosos e profundos.

Em uma das entrevistas recentes, concedida em 2024, quando a atriz completou seus 50 anos, ela comentou sobre não ter medo de envelhecer.

Para Maria Fernanda, os 50 são uma idade muito simbólica. "Fisicamente, envelhecer não é prazeroso, mas a experiência acumulada ao longo dos anos é algo poderoso. Ela serve como bússola nessa jornada da vida."

 

O retorno aos palcos e a carreira no cinema até O Agente Secreto

O ano de 2016 marcou um duplo regresso para Maria Fernanda: aos palcos e à televisão. No teatro, protagonizou Tróilo e Créssida — montagem de William Shakespeare dirigida por Jô Soares —, na qual interpreta Créssida, figura complexa e multifacetada da tragédia ambientada na Guerra de Troia.

Paralelamente, ela assumiu a função de apresentadora no programa TerraDois, da TV Cultura, ao lado do psicanalista Jorge Forbes, debatendo temas da pós-modernidade e ampliando sua atuação para além dos papéis ficcionais.

Em seguida, foi confirmada no elenco da novela A Força do Querer, de Glória Pérez, na qual interpretou a mãe de um homem trans — papel elogiado por sua sensibilidade e discrição na abordagem de questões de identidade.

 

Uma carreira na teledramaturgia 

 

No cinema, Maria Fernanda Cândido iniciou uma carreira sólida em 2003, com o filme Dom e conquistou o Kikito de Melhor Atriz no Festival de Gramado. Na época, o reconhecimento consolidou sua transição de modelo internacional para uma das intérpretes mais respeitadas do audiovisual brasileiro.

Ao todo, foram 18 filmes, entre nacionais e estrangeiros, longas e curta metragens. Seus trabalhos no cinema e na televisão lhe renderam dez prêmios e dez indicações, entre elas o Prêmio Kineo de Cinema Italiano como melhor atriz coadjuvante.

 

Uma carreira no cinema 

 

Agora, em 2025, chega aos cinemas com o filme O Agente Secreto, do diretor pernambucano Kleber Mendonça Filho. No longa, a grande aposta do Brasil para o Oscar, a atriz interpreta Elza, uma mulher que vive à sombra do poder e da violência — um papel que, segundo a atriz, “exige silêncio e escuta, mais do que fala”, contou em entrevistas.

Em entrevista exclusiva ao O POVO+ realizada em Cannes logo após a estreia mundial do filme brasileiro, a atriz compartilhou sua empolgação por participar do filme e pela estreia no maior festival de cinema do mundo.

 

 

No texto do jornalista e cineasta Arthur Gadelha, Maria Fernanda fala ainda sobre como foi confirmada sua participação no filme, como conheceu o diretor e amigo Kleber Mendonça, suas expectativas e experiência durante a estreia e expressou sua felicidade com o reconhecimento do cinema brasileiro.

Para a atriz, a estreia do filme nordestino em Cannes funciona como a cerimônia de inauguração de uma parte importante do fortalecimento entre todas as regiões do País, celebrando o avanço e promovendo a união ao fazer com que o Brasil todo se sinta representado.

 

 

Entrevista 

Maria Fernanda Cândido: “Eu senti que o Brasil todo estava em Cannes”

Por Arthur Gadelha*

“Eu acho que avançamos muito”, ela diz enfática, respondendo sobre a distância entre nordeste e sudeste ter se estreitado no imaginário popular brasileiro dos anos 1970 para cá. Estamos no quarto andar do Palácio dos Festivais, em Cannes, um dia após a estreia efusiva de O Agente Secreto, de Kleber Mendonça Filho, na penúltima semana de maio.

Àquela altura, embora ainda não soubéssemos que o filme seria consagrado com a histórica premiação de Melhor Direção e Melhor Ator, uma energia muito positiva que pairava no ar parecia adiantar que o filme não seria ignorado.

Wagner Moura e Maria Fernanda Cândido chegam para a exibição do filme "O Agente Secreto" na 78ª edição do Festival de Cannes(Foto: VALERY HACHE / AFP)
Foto: VALERY HACHE / AFP Wagner Moura e Maria Fernanda Cândido chegam para a exibição do filme "O Agente Secreto" na 78ª edição do Festival de Cannes

Em conversa com O POVO, Maria Fernanda Cândido não escondeu sua empolgação por estar vivendo a estreia de um filme brasileiro, e nordestino, no maior festival de cinema do mundo. No filme ela interpreta Elza, uma mulher que tem acesso a poderes secretos em plena ditadura militar brasileira e que usa seu privilégio para ajudar refugiados como Marcelo, protagonista vivido por Wagner Moura.

Aos 50 anos, com um currículo cada vez mais internacional e ampla experiência em TV, teatro e cinema, a atriz contou sobre a preparação para a personagem, as expectativas para a estreia nacional e como o próprio Festival de Cannes é responsável pelo seu papel no filme pernambucano.

OP - Como você recebeu o convite para participar do filme?

Maria Fernanda Cândido -  Eu conheci Kleber e Emilie no Festival de Cannes, em 2019. Eles estavam com “Bacurau” e eu estava com “O Traidor”, do Marco Bellocchio, ambos na competição. Kleber foi na exibição e depois na festa. A gente dançou, nos conhecemos, conversamos. Corta para 2024, começo do ano. Kleber me liga e me diz “Maria, tem uma personagem que eu já havia pensado em você desde quando eu te conheci em Cannes”. Ele me mandou o roteiro e me encantei pelo filme, adorei a personagem. Agora a gente faz a estreia mundial do filme aqui… Então Cannes nos ligou.

Kleber Mendonça Filho em entrevista coletiva após a estreia de "O Agente Secreto". Ao fundo, a atriz Maria Fernanda Cândido(Foto: XAVIER GALIANA / AFP)
Foto: XAVIER GALIANA / AFP Kleber Mendonça Filho em entrevista coletiva após a estreia de "O Agente Secreto". Ao fundo, a atriz Maria Fernanda Cândido

OP - A sua personagem tem uma quietude que contrasta com a gravidade do que ela representa, uma espécie de “liderança” desse grupo de refugiados. Como foi para você construir essa personagem que está sempre em estado de urgência, mas que nunca explode?

MFC - Ela vem de outro estado, que representa naquela época quase que outro mundo, o eixo Rio-São Paulo. Uma mulher que tem acesso à cúpula do poder, à informação, ao poder econômico e político. Como contraponto ao outro grande empresário do filme, ela usa esse poder e esse conhecimento de outra maneira. A Elza usa no sentido de ajudar os perseguidos políticos na época da ditadura militar. O filme se passa em 1977 e traz essa diferença entre sudeste e nordeste. Será que isso é uma questão ultrapassada? Eu te pergunto. Ou ainda está em processo?

OP - Acredito que está em processo. Muito diferente dos anos 1970, claro, mas ainda em processo.

MFC - Então. Eu acho que avançamos muito. Na minha visão, milhas e milhas e milhas. Mas na opinião dos meus colegas, a equipe do filme, esse ainda é um processo que está se desenrolando.

OP - Você acha que o filme, e essa estreia emocionante em Cannes, faz parte de quebrar essa divisão?

Arthur Gadelha é colunista do O POVO+, crítico de cinema do O POVO(Foto: FERNANDA BARROS)
Foto: FERNANDA BARROS Arthur Gadelha é colunista do O POVO+, crítico de cinema do O POVO

MFC - É isso que eu acho. A minha opinião vai junto com a deles. Ainda é um processo e não uma questão que se encerrou. “O Agente Secreto” também colabora e é por isso que a gente está aqui falando disso.

OP - Imagino que tenha sido uma estreia muito emocionante. Você já tinha visto o filme?

MFC - Eu tive essa sorte de ter sido convidada para uma cabine com Kleber, Emilie, o tradutor que fez as legendas, e o Walter. Foi importante ter assistido antes porque o filme tem muitas camadas e uma riqueza de detalhes. A cinematografia do Kleber é tão minuciosa e tão rica que eu precisei assistir a primeira vez para entender a dimensão. Na sessão em Cannes, eu pude curtir. Um deleite assistir naquela tela, com aquele som, e eu quero parabenizar o festival. Estar ali cercada pela turma, equipe, amigos e todo o Recife. Eu senti como se o Brasil todo estivesse em Cannes. No meu caso que moro fora, já há 7 anos em Paris, imagina o tamanho da minha alegria, do meu reconforto de estar ali. Foi muito especial.

OP - O filme não é sobre a ditadura, mas acontece no contexto histórico. No atual contexto do Brasil, você acha que o filme vai ser bem recebido?

MFC - Vai. Tenho certeza que os brasileiros vão amar esse filme. É um filme sobre as relações de poder e, para mim, é também um documento histórico. Um registro que deixa para nós uma pergunta: o que nós fazemos com nossa memória e nosso passado? A pergunta se estende para o país: Brasil, o que você faz com sua história?

*Arthur Gadelha é colunista do O POVO+, crítico de cinema do O POVO, ex-presidente da Aceccine e membro da Abraccine. Acompanha as estreias nacionais e os passos do cinema cearense, cobrindo eventos internacionais como Cannes, Gramado, Globo de Ouro e Oscar

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