
Bilhões, com "b" de banalidade. Esse é o tamanho do rombo que deixa o Banco Master no sistema financeiro nacional. As revelações que vieram nos primeiros momentos após a liquidação da companhia mostram uma rede de relações, mentiras e o sinal de alerta para todo um sistema financeiro.
Desde a criação do
Ao todo, 21 decretaram falência e outras 13 tiveram liquidação extrajudicial confirmada. Nessa história, ainda houve casos em que o banco foi incorporado, além de minoria em que a liquidação foi cessada.
Na opinião pública, 94,1% responderam defender a manutenção da prisão do banqueiro Daniel Vorcaro, enquanto 83,3% avaliaram que a decretação de sigilo para o processo aumenta o risco de impunidade, segundo pesquisa realizada pela AtlasIntel.
Mesmo assim, há três semanas, Vorcaro e outros quatro executivos tiveram a prisão preventiva relaxada dias após serem detidos. Em diligências, a Polícia Federal (PF) detectou que no celular do banqueiro há uma lista de contatos que inclui ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
A acusação contra a alta cúpula do Banco Master é de fraude de R$ 12,2 bilhões contra o sistema financeiro, o maior da história do Brasil. A operação Compliance Zero investigou a emissão de títulos falsos em que o grande beneficiado era o Banco Master, que obteve lucros oferecendo investimentos em renda fixa, CDB a porcentagens muito mais vantajosas do que a média do mercado.
O Banco Central (BC) resolveu pela liquidação extrajudicial e encerrou as atividades da instituição financeira.
Em 19 de dezembro, mais uma reviravolta: um ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) viu indícios de precipitação na liquidação e pediu esclarecimento do BC, que já se prepara para uma batalha judicial para manter o fim do Master.
Esse escândalo é apenas mais um entre grandes fraudes envolvendo bancos no Brasil, pelo menos nos últimos 30 anos em que temos a atuação do FGC.
Nessa história, alguns casos emblemáticos, como o do Banco Nacional e o do Banco Econômico. O primeiro foi um das maiores fraudes bancárias do País, com rombo estimado em bilhões de reais, segundo valores atualizados, levando à intervenção do Banco Central. O segundo veio a reboque, numa queda que abalou o sistema financeiro.
Em 1999, houve o caso do Banco Marka, que envolveu acusações de peculato e fraude, gerando prejuízo estimado em R$ 1,5 bilhão, além da fuga do banqueiro Salvatore Cacciola.
Já em 2000, Cacciola chegou a ser preso preventivamente sob o argumento de risco de fuga do País, mas, após 37 dias encarcerado, foi solto por liminar do então ministro do STF, Marco Aurélio Mello, e fugiu para a Itália.
Outra ocasião de repercussão nacional foi a do Banco Panamericano, relembrado nas últimas semanas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), na inauguração do canal de notícias SBT News.
Em 2010, estourou investigação apontando fraude contábil, que inflava artificialmente o patrimônio da instituição, controlada pelo Grupo Silvio Santos. O que rendeu ligação e visita do apresentador de televisão a Lula.
O banco sofreu intervenção, com rombo inicial estimado em R$ 1,4 bilhão. O apresentador chegou a oferecer todo o seu patrimônio, incluindo o SBT, como garantia para aporte emergencial do FGC.
Após as investigações, a soma do rombo superou os R$ 4 bilhões, mas, antes da falência, o Panamericano foi vendido ao BTG Pactual.

Uma série de investidores que nunca aplicaram recursos diretamente no Banco Master foi atingida com a liquidação extrajudicial da instituição após suspeita de fraude multibilionária.
Isso porque fundos de investimento, ativos derivados e previdência complementar sofreram um efeito indireto que incidiu sobre o mercado como uma "segunda onda" de impactos.
Um dos exemplos foram papéis de ações como da Oncoclínicas S.A. (Onco3), que declarou exposição às aplicações em CDBs emitidos pelo Banco Master. Uma soma de R$ 433 milhões, o que gerou impacto no valor de mercado da companhia — ainda que quem aporte recursos em Onco3 nunca imaginaria essa relação em primeiro prisma.
Eduardo Silva, presidente do Instituto Empresa, associação que desde 2017 promove a governança corporativa e defende investidores, destaca que o caso da Oncoclínicas é só mais um neste processo de exposição indireta ao Master por meio de fundos, planos de previdência, carteiras administradas ou fundos de investimento em participações (FIPs).
“Ou seja: mesmo quem nunca investiu nos CDBs mágicos do Banco Master sofrerá efeitos por decisões dos Gestores de Companhias, Fundos de Investimentos e Fundos de Pensão, entre outros", alerta.
Por isso, Eduardo pontua que o caso do Master deve promover uma revisão geral de processos no mercado, como no papel do gestor de fundos. Para ele, essa figura não deve ser apenas como um dono de recursos, mas agir em nome e em benefício dos titulares dos recursos, os cotistas.
Também conhecido como caso grave, decorrente da fraude do Master, está o dos fundos de pensão, como o RioPrevidência, de servidores públicos cariocas, que aportou cerca de R$ 2 bilhões no banco entre maio e julho de 2025 — já no auge da crise do Master que sofreu a intervenção.
"O Instituto Empresa reforça que não basta acompanhar o extrato — é necessário questionar. Investir via fundo ou plano não significa eliminar o risco de crédito, ou de contraparte."

A multiplicação de casos de fraudes financeiras que se avizinham entre os anos tem revelado um problema maior, estrutural. A avaliação é do economista, professor de especialização em Mercado Financeiro na Universidade de Brasília (UnB) e membro do Conselho Regional de Economia do Distrito Federal (Corecon-DF), César Augusto Bergo.
Na avaliação dele, os escândalos financeiros recentes apontam falhas na regulação, que precisa ser mais dura e vigilante, já que se percebe a sofisticação das fraudes. No caso do Master, evidenciam conflitos de interesses políticos.
O professor enfatiza que o "principal ativo dos bancos é a confiança" e fraudes desse tamanho minam a credibilidade de todo o sistema, principalmente de instituições de menor evidência.
A morosidade da fiscalização também é destacada como fator determinante para a perpetuação de irregularidades. Embora o Brasil tenha um sistema financeiro moderno e lidere internacionalmente em inovações, a regulação, muitas vezes, opera "um passo atrás", criando um descompasso tecnológico e temporal no combate aos crimes, avalia César.
"Não é que o Banco Central não faça o que tem de fazer, ele faz e é competente e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) também. Mas eles demoram muito a enxergar o problema. Enquanto isso, existe outra vertente que é a questão política. O banqueiro do Master procurou apoio de senadores, deputados, prefeitos etc. Aí cria uma corrente nociva ao sistema financeiro", acrescenta.
Ele frisa que o problema estrutural se forma ao envolver questões políticas que vão de encontro aos interesses dos investidores, depositantes, clientes e acionistas. "E isso é alimentado pela vaidade muitas vezes."
"Temos aí o caso do oferecimento de camarote, viagens, estadias em hotéis paradisíacos, e acaba tendo lobby para se obter alguma vantagem na legislação que dê cobertura a esse tipo de fraude", pontua.
Para o economista Ricardo Coimbra, da Academia Cearense de Economia (ACE), já há alguns meses o Banco Master chamava atenção por conta dos resultados, principalmente por conta da relação com o Banco de Brasília (BRB), que é um banco estatal, de economia mista.
Questionado se a liquidação veio tardia, Ricardo diz que não. "Houve um processo de negociação entre o Banco Master e o BRB que não foi aprovado pelo Banco Central. Foi uma alternativa que o Master buscou, através de articulação com outro banco, mas que está começando a se revelar com vinculações políticas".
"O Banco Central é chamado a intervir no momento em que as informações se mostram críticas. Então, existem procedimentos que devem ser cumpridos tecnicamente e o regulador cumpriu e vem cumprindo esses mecanismos", aponta.

O tema governança corporativa deixou de ser visto como um paradigma no empresário brasileiro ou um "luxo" de grandes corporações para se tornar uma necessidade estratégica. A avaliação é da coordenadora-geral do Capítulo Ceará do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), Renata Paula Santiago.
Mas se há evolução na gestão, por que grandes fraudes permanecem comuns no dia a dia do mercado? A operação Compliance Zero, da Polícia Federal, investigou a emissão de títulos falsos em que o grande beneficiado era o Banco Master, que obteve lucros oferecendo investimentos em renda fixa, CDB a porcentagens muito mais vantajosas do que a média do mercado.
Sem abordar casos específicos, como o do Master, Renata avalia que casos recentes de empresas investigadas não chegam a contaminar todo o mercado e julga serem "casos pontuais".
A executiva explica que o primordial para as organizações, além do investimento, é permitir que mudanças não sejam limitadas, mas que levem à mudança de cultura organizacional.
Para ela, práticas de transparência, equidade e responsabilização para todos os que se relacionam com a empresa, desde funcionários até instituições de crédito, devem ser ponto basilar para a mudança de rumo de uma organização.
Neste sentido, não há padrão de governança em "tamanho único", mas uma jornada personalizada para cada empresa. Na avaliação da coordenadora do IBGC no Ceará, o mercado passa por um processo de "seleção natural" que deve ser intensificado e empresas com processos pouco transparentes devem sofrer.
"Na medida em que as empresas vão avançando rumo a uma melhor política de governança, elas tendem a rejeitar fazer negócios com empresas que não são bem colocadas porque envolve reputação".

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